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Temores desnecessários

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Não apenas a Confederação Nacional da Indústria atribui ao processo eleitoral, que já vem próximo, certa tendência da política produtiva em se recolher, hibernar-se como os grandes ursos, para aguardar um possível  inverno nos rumos da economia, ante o novo governo que vai se organizar. Não se trata de um cuidado exclusivo daquela entidade, porque as lideranças, sobretudo as que cuidam de investimentos, de modo geral, recolhem-se. No Brasil tornou-se costume associar meras expectativas a mudanças profundas, o que não parece plenamente justificável. Mudam-se os governos para que o país se reanime, altere a leitura de cartas de navegação, sem que isso signifique, intencionalmente, sair por mares desconhecidos em busca de tempestades. 

Se as águas no Brasil não sugerem olhar o horizonte com óculos do Doutor Pangloss, nem por isso os responsáveis pela produção devam preferir o porto do Velho do Restelo. Sem exageros otimistas ou pessimistas. 

O que pode mudar, salvo melhor juízo, são métodos de condução da política econômica, alterações quanto às relações com o mercado, mas nada que leve a algo revolucionário, estrutural, capaz de mudar o curso da história. Expectativas seriam permitidas, sim, quanto à aplicação dos modelos, sabendo-se que, na essência, eles continuarão sendo os mesmos. O Brasil não deixará de ser capitalista mercantilista, e as eleições não estão sendo convocadas para nos dizer que seria melhor adotar qualquer tipo de  socialismo estatizante. 

Para uma prudente remoção de pessimismos em excesso, melhor fariam as entidades representativas se considerassem o perfil desses numerosos candidatos a tomar o leme das mãos do presidente Temer. Podem facilmente sentir que nenhum deles tem jeito de alterar substancialmente o que já se construiu; no máximo de boa vontade e talento, poderão melhorar o que está feito e coragem para enfrentar o que está por fazer. Nem se justificariam as reservas pessoais quanto a alguns, por serem radicais; mas nem por esses se justifica cruzar os braços e esperar para ver as urnas.  Nossos radicais são malucos apenas quando discursam. 

Na pauta dos temores revelados, além dos rumos que o futuro governo poderia imprimir à indústria, citam-se as mudanças no cenário internacional, sem embargo de que, quanto  a nós,  o que tem entrado em cena é-nos mais favorável que prejudicial. Se americanos e chineses se arranham, o que tem sido sinalizado, na contramão de possíveis retrações, é a abertura de oportunidades. Ora, guerra comercial, desde as velas dos fenícios até a metralhadora verbal do doutor Trump, tem sido o que nunca deixou de ser: à ação dos que perdem contrapõe-se a reação dos que ganham. Diria o califa de Bagdá: claro como leite de camela. 

Cuidem os produtores brasileiros de ocupar espaços no rastro da guerra dos protecionismos, que se trava entre americanos, europeus e asiáticos; e  com recomendável urgência, pois tudo indica que os litigantes são suficientemente racionalistas para chegarem a um conveniente armistício. 

De volta às ansiedades provocadas pelo que nos poderão falar as urnas de outubro, cabe lembrar à confederação temerosa que o futuro governo pode fazer de verdadeiramente revolucionário é algo que, sendo de interesse de todo o Brasil, é, antes de tudo e por primeiro, importante para quem produz:  derrubar a ditadura dos bancos, que entre nós tornou-se a mais cruel e violenta do mundo. Não espere nem deseje algo mais corajoso e útil que essa destruição desse fabuloso império.