O escritor é premiado, admirado por todos, mas na vida cotidiana é de uma terrível fragilidade, um autista, como pensa a personagem que o confronta. Nem é capaz de chegar à janela para admirar a vista lá de cima. -->A pretexto de discutir literatura, o que vem à tona é a necessidade de espantar os fantasmas do passado representados pela ex-mulher e pelo filho que o ignora. Para tirar a diferença, há Beatriz, a nova mulher, com quem ele tem esperança de recomeçar. -->Ela também tem seus problemas, mas parece saber lidar melhor com a solidão. -->Cristovão Tezza apresenta também como questão neste livro a precariedade do homem que se encontra sob a capa da fama, alguém cujos leitores costumam ver como uma espécie de super-homem. Um artista, uma vez que cria personagens tão fascinantes, não seria possível em pessoa ser tão medíocre. -->Mas é isso que acontece. À medida que a noite se esvai, à medida que a garrafa de vinho se esvazia, intensifica-se o temor pela chegada da hora da despedida. Cria-se sempre um pretexto para se ficar mais um pouco: uma xícara de chá, um café bem forte, uma nova garrafa de vinho. E tenta-se de novo, recomeça-se o embate, como se o anterior estivesse sendo passado a limpo, como se existisse um meio de se escapar da solidão, do desamparo – enfim, da morte. -->A narrativa em terceira pessoa, tendo como contraponto os dois personagens remoendo suas memórias e, sobretudo, Beatriz a conversar com uma amiga imaginária a respeito da noite vivida com Paulo Donetti, o escritor, proporciona boa proximidade temporal, e faz desse narrador mais um espectador das angústias alheias do que alguém capaz de determinar-lhe os passos. Um erro emocional , novo livro do mesmo autor de O filho eterno , obra anterior com que ele abocanhou praticamente todos os prêmios literários e que lhe permitiu dedicar-se integralmente à literatura, não deixa a desejar. É importante que, no atual momento da literatura brasileira, escritores como Cristovão Tezza saibam sair-se bem da síndrome do seu livro mais famoso, mostrando que o risco e a fragilidade de todo autor podem servir de assunto para uma nova obra. -->O escritor, nascido em Santa Catarina mas criado em Curitiba, trata com maestria esse tema, na verdade inquietações de todos aqueles que sabem que o tamanho da vaidade é sempre maior do que o do talento, de quem após colher os louros da vitória começa a beirar a repetição, a colecionar críticas desfavoráveis, acabando por se tornar um fantasma para si próprio. Seria melhor acreditar que somos eternamente geniais. -->Professor e doutor em literatura brasileira pela UFRJ.