Editorial, Jornal do Brasil
RIO - É interessante observar, à medida que a catástrofe haitiana cai no senso comum do cotidiano sem novidade, não há notícia como a participação brasileira no pós-desastre tem sido muito dinâmica e bem planejada. Ao contrário de outros eventos dessa magnitude, no qual a solidariedade internacional muitas vezes se limitou a um período emergencial, agora o Brasil se estabelece junto à nação mais miserável do continente como um parceiro disposto a ajudá-lo sem exigir nada em troca além do sorriso das crianças e da progressiva reconstrução, espera-se, definitiva. O terremoto devastador foi o ápice de uma série de tragédias impostas aos haitianos como se estes fizessem parte de uma sociedade condenada a sobreviver, não a construir uma história. Quando se pensa apenas em ficar vivo até o dia seguinte, a simbologia da consolidação não é capaz de gerar solidez suficiente para que se estabeleça a sensação de perenidade. Hoje, as gerações mais novas no Haiti, que já sofriam com fome, doenças, miséria e corrupção, descobriram que seu passado se foi nas ruínas. Podem escolher entre uma sobrevida apagada e um novo caminho. O Brasil, desde o início das operações da Minustah, sempre ajudou a que todos enxergassem essa outra possibilidade.
Passados os tremores do sismo, as dores lancinantes de 230 mil mortos enterrados, muitos em valas comuns, a vida precisa continuar. E o que o governo brasileiro escolheu para mostrar aos haitianos como se pode construir um país? A educação. Um dos convênios assinados na sexta-feira pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva dá ao colega René Preval o suporte do Estado na reordenação e reconstrução de todo o sistema educacional haitiano. Dadas as condições, será uma tarefa hercúlea, mas vale lembrar que temos expertise relativa no assunto; afinal, depois da independência, foram os professores que partiram das cidades brasileiras que transformaram a realidade dos habitantes de Timor Leste e reduziram a influência que anos de ditadura da Indonésia haviam deixado. No caso haitiano, este segundo elemento não existe, e a população não só está interessada como apoia qualquer medida nesse sentido. Educação, como sempre é bom frisar, é a base de tudo. Quanto mais democratizada e disseminada, mais firme será esse novo futuro para os haitianos.
A segunda medida da cooperação exporta um programa que tem sido responsável por reverter a histórica tendência de migração a partir do Nordeste brasileiro. A construção de cacimbas em regime de mutirão está efetivamente servindo em muitos locais para que a população rural permaneça em suas áreas de origem, e com qualidade de vida. O sistema é barato, eficiente, e pode resolver a maior carência na ilha caribenha que é a de água potável. Sem falar no fato de que a chuva na região não é um problema, e sim a inexistência de reservatórios adequados para recolher a água. Sem recorrer a fontes contaminadas pela insalubridade, a qualidade da saúde média da população igualmente será melhorada.
Completando o conjunto, Lula e Preval serão parceiros também no desenvolvimento de programas de agricultura familiar. Pequenas produções podem, além de ajudar a minorar a questão da fome, gerar uma quantidade de excedentes capaz de ir sustentando um novo mercado interno.