A alta trepidação eleitoral da semana passada terminou com a divulgação da primeira pesquisa que registrou empate técnico entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT): levantamento telefônico do Datapoder360, divulgado na sexta-feira, trouxe o ex-capitão com 26% e o petista com 22%. E também pela primeira vez, na simulação de segundo turno, Haddad o derrota, por 43% a 40%. Se este quadro for confirmado por novas pesquisas, estamos num ponto crucial da disputa, que até pode estimular a corrida ao voto útil no primeiro turno, comum nas disputas entre extremos.
Neste ponto cego que o momento sugere, Haddad ganhou terreno, mas a batalha será renhida nestes 15 dias finais. A vantagem do petista no Nordeste (que garantiu as duas vitórias de Dilma) não parece ainda suficiente para suprir sua desvantagem em relação a Bolsonaro nas outras regiões e no chamado triângulo das bermudas, composto pelos estados de Minas, Rio e São Paulo. Haddad encerrou a semana visitando Minas.
Bolsonaro, ainda que não tenha caído ou se estagnado nas próximas pesquisas, encerrou a semana com saldo negativo, tanto na percepção geral como do capital, o mercado e os donos do PIB. Isso decorreu da profusão de trapalhadas que funcionaram como nudes de campanha, revelando o que realmente pensa seu núcleo duro, e como age.
O apoio do capital a Bolsonaro, ditado mais por antipetismo que por convicção, teria sido abalado principalmente pela barbeiragem do coordenador econômico Paulo Guedes, ao revelar a investidores planos tributários que o candidato jamais apresentou ao distinto eleitorado, tais como a recriação da CPMF e a criação de uma alíquota única para o imposto de renda da pessoa física. Bolsonaro desmentiu o guru pelas redes sociais e depois o defendeu, cometendo até uma distorção, em sua primeira entrevista telefônica (à Folha de S. Paulo): “A alíquota única do IR para quem ganha mais é uma boa ideia”. O que Guedes defendeu foi alíquota única para todos. Vale dizer, quem ganha pouco e quem ganha muito pagariam o mesmo. Ficou a impressão de que nem a sintonia é tão fi na entre eles, nem existe plano elaborado.
O candidato a vice, general Mourão, contribuiu com sua coleção de pérolas autoritárias, admitindo autogolpe militar e Constituição sem constituintes eleitos e chamando as famílias chefiadas por mulheres de “fábricas de desajustados”. O vice também foi enquadrado.
Um bom arranhão na imagem do candidato foi aplicado pela revista liberal The Economist, com sua matéria de capa em que o aponta como ameaça ao Brasil e ao continente. Houve ainda os ataques de Alckmin e a carta aberta de Fernando Henrique sobre o perigo dos extremos.
E para completar, soube-se que na mesma reunião em que falou da esconjurada CPMF, Guedes vendeu suas soluções autoritárias e inconstitucionais para o problema da falta de maioria parlamentar na hora de aprovar reformas.
Uma delas seria o “voto partidário programático”: se 50% de uma bancada decidir a favor de uma matéria, todos os votos do partido serão contados a favor, ainda que haja dissidências. Uma aberração, pois estaria suprimida a individualidade do parlamentar e anulada a própria representação dos eleitores que nele votaram. Guedes disse ainda aos investidores já ter discutido com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, um aumento dos porcentuais de votos exigidos pela cláusula de barreira, o que permitiria a imediata redução dos partidos com assento na Câmara, de 28 para 5. Outra aberração, que Maia até negou ter discutido. A cláusula já vigora este ano, e se for mudada, só produzirá efeitos em 2023.
Com suas sinceridades, Guedes e Mourão podem ter feito muita ficha cair. Mas, neste pleito insólito, até as pesquisas correm grande risco. O bolsonarista envergonhado, que não revela seu voto nem ao pesquisador, existe, e pode surpreender.