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Conversa de virar mesa

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Atravessando um pedregal desde o esfaqueamento, a candidatura de Jair Bolsonaro parou de crescer e começou a ser apedrejada por forças que ainda sonham com sua troca por Geraldo Alckmin num segundo turno contra o PT. Agora espocam denúncias sobre seus malfeitos nunca antes descobertos, por exemplo, pela revista Veja, com sua expertise. Ontem ele reagiu com sua mais clara ameaça de virar a mesa se não ganhar: “Não posso falar pelos comandantes. Pelo que vejo nas ruas, não aceito resultado diferente da minha eleição”, disse em entrevista ao programa de TV Brasil Urgente.
Mais uma vez ele se afirma como ameaça real à democracia. Com a introdução inicial, “não posso falar pelos comandantes”, insinua que pode contar com apoio militar para insurgir-se contra um resultado adverso, denunciando a ocorrência de fraude. Supostamente ele fala do segundo turno, pois sabe que não tem votos para ganhar no primeiro. Ontem ele voltou a falar em fraude, a criticar a urna eletrônica e ainda levantou suspeitas contra os técnicos do TSE. Que diz a ministra Rosa Weber?
O que pode fazer um candidato que não aceita o resultado das urnas? Uma coisa, como ele já insinuou, seria dar um golpe militar com apoio dos “comandantes”. Quando diz obsequiosamente que não pode falar por eles, sugere que a possibilidade de ser apoiado por eles existe. Do contrário, nem os estaria mencionando. Outra forma de “não aceitar” o resultado seria liderando uma insurgência civil, abrindo as portas da convulsão social. Bolsonaro nunca foi tão longe mas as instituições não reagem ameaças. Os candidatos, sim, poderiam firmar um pacto sobre o essencial: Vão concorrer confiando no sistema. Quem ganhar vai tomar posse, prometendo respeitar as regras do jogo.
É inacreditável que estejamos novamente discutindo a posse do eleito, como em 1955, diante das ameaças da UDN de não permitir a posse de JK se ele ganhasse. Onde foi que nos perdemos?

Os tucanos e o perigo
É preciso reconhecer o papel do candidato tucano Geraldo Alckmin na denúncia do que Bolsonaro representa, não importa que buscando tomar-lhe o papel de anti-PT. Boa parte dos tucanos, entretanto, prepara a adesão, no segundo turno, ao “candidato da bala”, como diz Alckmin. “Os ataques ao Bolsonaro têm que parar”, cobrou anteontem o senador Cunha Lima (PSDB-PB). Em Minas, o vice do candidato tucano ao governo (Anastasia), deputado Marcos Montes, avisou que se Alckmin ficar fora do segundo turno, “vamos ter que dar a mão a Bolsonaro”, para evitar a volta do PT. Adocicando Bolsonaro, até o chanceler Nunes Ferreira declarou, em Nova York, que seu governo em nada comprometeria a política externa do Brasil.
Há alguns dias o ex-presidente FHC disse que seu partido não teria problema em apoiar o petista Haddad para evitar o perigo Bolsonaro. Mudou de idéia. Na carta aberta da semana passada falou no “perigo dos extremos”, em inaceitável equiparação do PT a Bolsonaro. O PT governou 13 anos sem ferir as regras do jogo. Se quisesse, Lula teria mudado a Constituição (como fez FHC) para disputar o terceiro mandato. Com Dilma, o PT mal chiou e entregou o poder, submeteu-se ao impeachment que considerou golpe, por ter forçado o enquadramento dela num crime de responsabilidade de araque. Lula, mito de verdade, não se deixou prender banalmente. Não fugiu, não se asilou, mas montou seu ritual de resistência antes de entregar-se à Justiça. Está preso.
O PSDB, que ajudou a construir a democracia que temos, não pode ter dúvidas sobre quem ameaça sua sobrevivência. Esta última declaração de Bolsonaro é tão eloquente quando a postagem de seu filho, de desenho representando um torturado encapuzado. Se confirmado o segundo turno Haddad-Bolsonaro, para ser contra o PT, para resgatar o eleitor antipetista que perdeu, o PDSB não tem que se atirar nos braços do perigo. Pode optar, como defende outra ala, mais próxima de Alckmin, pela neutralidade, evitando desonrar seu nome de batismo: social-democrata.