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O que foi feito nesses seis meses?

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Uma avaliação desapaixonada do governo é necessária para fechar o balanço parcial do primeiro semestre da gestão Bolsonaro, mesmo sob risco de grande insatisfação dos leitores, uns por não admitirem comentários críticos de qualquer espécie e, a maioria dos demais, por torcerem o nariz para qualquer iniciativa que parta do presidente ou de sua equipe. Mas vamos lá.

O presidente foi eleito para contraditar as administrações do PT, banir a corrupção, combater a insegurança geral e instalar um governo sob o signo da eficiência e da liberdade de iniciativas. Esse seria o resumo da missão a ele confiada. A realização desse desiderato não é tarefa para seis meses. Qualquer avaliação será sempre parcial, preliminar e quase especulativa. Contudo, algo emerge com força do caminho já percorrido: o tamanho da surpresa do presidente e do seu principal ministro com a grandeza da tarefa recebida. O elemento de surpresa me parece importante porque explica, em boa medida, a magnitude dos erros cometidos. Por outro lado, ameniza o julgamento da equipe, pois surpresas podem ser superadas pela experiência, que se vai acumulando no tempo. Fato é que a surpresa tem sido grande em vários campos e isso dá uma dimensão do tamanho dos equívocos cometidos.

A maior de todas as surpresas é compartilhada por economistas e financistas de todas as tendências: a economia estancou, quando quase todos esperavam uma forte retomada, plausível e provável após a vitória eleitoral de Bolsonaro, sem precisar estar presente nem a debates de candidatos. A frustração do PIB e do ritmo dos investimentos não foi logo percebida por Paulo Guedes. Ao se dar conta disso, o semestre já estava findando, com repercussão grave no desempenho das arrecadações federal e estaduais, agravando, simultaneamente as contas de execução orçamentária em Brasília e nos Estados. Com isso, a liderança natural que o ministro poderia exercer no equacionamento de déficits estaduais, trazendo assim os governadores mais para junto do presidente, deixou de acontecer e gerou um ambiente quiçá negativo (embora mudo) entre os governos locais e o federal. Isso afetará, negativamente, o ritmo da futura reforma tributária.

A outra bola para fora se deu também por consequência da explosão do déficit primário federal: a insistência do ministério da Economia em sacar verbas dos bolsos das pessoas para bancar a conta de despesas de custeio em escalada permanente. O ataque imediato às fontes de despesa – todas elas, sem exceção – seria a grande batalha a ser travada, com o capital politico inicial de Bolsonaro, desde a noite da posse, em 1 o . de janeiro. Não aconteceu e, mais grave, continua não acontecendo. O governo demorou a contingenciar certos gastos. Desagradou a setores relevantes, por exemplo, ao cortar investimentos nas áreas de Defesa, no custeio da Educação superior, que está à matroca, e frustrou iniciativas em todos os ministérios. Resultado prático? Quase nenhum. A explicação é simples: são as despesas obrigatórias que precisam ser enfrentadas. Mas como fazê-lo?

Embora difícil, sob ponto de vista legal, haveria como decretar, sim, um controle emergencial de despesas, - repito, de todas as despesas – de modo a zerar o déficit primário ainda em 2019. O País não entraria em espiral recessiva, pelo menos não mais do que já está. E o panorama das expectativas, hoje, seria outro.

A decisão foi no polo inverso. Assustado e surpreendido pelas contas em colapso do governo, Guedes pediu socorro de modo ameaçador, jogando uma fatura extra de R$248 bilhões no colo do Congresso Nacional, supostamente para arcar com o rombo das rubricas da assistência social. Erro fatal. Ao expandir gastos, sem prioridade nem critério, o novo governo se igualou ao que houve de mais polêmico (para ser gentil) nas administrações passadas que tanto criticava.

O presidente ainda vive uma lua de mel, sem beijos ardentes, com a base eleitoral que o colocou no Palácio do Planalto. Mais postura presidencial é algo que lhe vem sendo crescentemente cobrado. Os episódios de, digamos, excesso de informalidade no cargo se multiplicam. Os apoiadores já se desesperam. O episódio mais recente, e ainda inconcluso, da nomeação do filho, para estar à frente da politica externa de relacionamento com os Estados Unidos, é uma entre outras manifestações de desinteresse explícito do governante com o perfil dos cargos e das instituições nacionais. Nisso o presidente se nivela com a crítica que fazia, em campanha e antes dela, na Câmara dos Deputados, dos seus piores desafetos. A boa conduta, no sentido de ser, no mínimo, a conduta oficialmente esperada, é o que mais faz falta ao País neste delicado momento. Mas, nesse sentido, arriscaria afirmar que não existe um outro Jair. O presidente pode ser criticado por tudo, menos por falta de espontaneidade.

E o segundo semestre será, então, bem diferente? Concluo com outra pergunta, didática e curiosa: e seria diferente por quê? Os personagens, afinal, são os mesmos e, além disso, as surpresas ainda não acabaram. O lento aprendizado, nosso e deles, apenas prossegue, com a morosidade irritante de todas as duras lições a serem assimiladas.

* Paulo Rabello é economista e tem colaborado com sugestões de planos de governo para diversas administrações nas últimas décadas