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Entrevista: Ana Estela Haddad

José Peres -
Ana Estela com a assessora, Bia Abramo, João Francisco e eu
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Ana Estela Haddad é uma mulher preparada, daquelas que agregam valor ao marido, e isso pode significar muito para o país, caso ele se eleja Presidente da República. Professora livre-docente da Faculdade de Odontologia da USP, é mestra doutora em Ciências Odontológicas e membro permanente e orientadora de pós em Ciências Odontológicas da faculdade. Coordenou o programa, voltado para a primeira infância, São Paulo Carinhosa, no município. Trabalhou no Ministério da Educação, onde ajudou a criar o ProUni, na gestão de Cristóvão Buarque, primeiro governo de Lula. Quando o marido foi para o Ministério da Educação, ela se transferiu para o da Saúde. Quem trabalha com ela a chama de Ana. Os íntimos, de Estela. Ficamos confusos. É daquele tipo de pessoa accessível e suave a quem você tem a impressão de conhecer a vida toda, praticamente íntima. Conheceu o marido no Clube Sírio, em São Paulo, aos 14 anos, ele com 17. Entre os pontos de identificação, o mesmo sobrenome Haddad.

Nossa conversa, também com participação do repórter da coluna, João Francisco Werneck, foi diante do Pão de Açúcar, num abraço carioca a Ana Estela, que acompanha Fernando Haddad em todos os eventos de campanha.

Você mantém suas atividades profissionais regulares...

Sim, mas não em ritmo normal, porque estou me dividindo entre a campanha e as atividades. Tirei oficialmente uma licença, o que me deixa em situação regularizada. Ontem à noite, por exemplo. Eu dou aula na graduação e na pós, e tínhamos Clínica para atender as crianças. É importante que eu esteja lá para orientar, não deixar descoberto. Então, tenho me dividido.

E como você vê a função da primeira-dama?

Esse espaço tem uma história construída por muitas mulheres, algumas admiráveis. Costumo dizer que a mulher moderna não cabe muito neste figurino. Fazemos tantas coisas ao mesmo tempo, e tudo o que os homens fazem. Então o estereotipo que vem junto com a palavra, a gente não se sente muito confortável dentro dele.

Como primeira-dama, você pretende fazer o quê? Já conversou sobre isso com Haddad?

Isso não é um tema entre nós. O Fernando aceita aquilo que eu escolher, a forma como eu vou me posicionar. Ele respeita, inclusive, se for uma opção de ficar mais afastada. Na verdade, eu entrei no espaço público antes do Fernando ser Ministro. Nós fomos para Brasília como assessores. Ele como assessor de planejamento, e fui para educação. Então eu tive a experiencia de trabalhar e ajudar a formular políticas públicas. Eu sou encantada, apaixonada pelas possibilidades que a política pública traz. Por isso, por esta trajetória minha, eu pretendo ocupar esse espaço atuando em políticas publicas como eu tenho atuado. Na verdade, mesmo em caso de derrota nas eleições, já faço isso no meu espaço acadêmico. Eu levei isso para as universidades.

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Ana Estela com a assessora, Bia Abramo, João Francisco e eu (Foto: José Peres)

Uma pesquisa da Vox Populi mostrou uma perspectiva de virada. Como você encara pesquisas tão diferenciadas?

Tem até umas brincadeiras na internet. Outro dia vi uma assim: ‘’Estamos em outubro, mas, considerando o desvio padrão das pesquisas, eu já vou dando feliz natal’’. Meu filho tem ido a todas as pesquisas qualitativas e monitora diariamente como estão sendo as reações. Embora seja importante, é apenas uma estimativa. Recentemente, no Estado de São Paulo, as pesquisas davam Dória e Skaf no segundo turno, e não davam Márcio França. E no fim o que se mostrou foi que Márcio foi para segundo turno. Em 2012, nas eleições que o Fernando ganhou para prefeito do Serra, nem no primeiro turno, e nem no segundo, nenhuma pesquisa deu ganho para ele. E claro que as pesquisas têm o poder de influenciar os indecisos e o ânimo da turma da campanha. A minha experiencia é que a bola está rolando. Às vezes, parece que estamos estacionados, mas pode vir uma onda. Fatos podem acontecer, que influenciam para um lado ou para o outro. É um momento de muita ebulição, de trabalhar duro até o último minuto. Nós vamos trabalhar até o fim do jogo. Vamos dar tudo da gente, expor o projeto, conversar, fazer tudo aquilo que a gente acredita, sem usar métodos e estratégias que a gente não aprova.

Falando em métodos. O que voce acha do escândalo que a Folha de São Paulo revelou?

É extremamente preocupante. Nós já esperávamos, pelo que estávamos vendo acontecer, que havia ali uma enxurrada de mensagens de whatsapp, uma coisa que não parecia ser normal e natural. A jornalista que fez a matéria foi uma corajosa e competente. Ela fez uma pesquisa detalhada, foi às empresas, levantou custos. Um trabalho de investigação, como o bom jornalismo pede. Preocupa muito tomar conhecimento de que ela está sendo ameçada de morte. Falam tanto de liberdade de imprensa, mas parece que a gente não está tendo.

Você acha que o TSE está atuando de maneira correta e no tempo justo?

O Fernando, nesta sexta-feira, em uma coletiva depois do evento com o pessoal da ciência e tecnologia, disse que estamos frente a crimes digitais com uma Justiça analógica. Quer dizer, o tempo da Justiça talvez não esteja alcançando o tempo e os efeitos que os crimes digitais estão provocando. Se falou tanto de moralidade, transparência, e no entanto a campanha do Bolsonaro está trabalhando com dinheiro de caixa dois, não declarado, e usando esses recursos para fazer calúnias, difamar, espalhar fake news. É muito triste viver essa situação.

O PT tem enfrentado lutas sucessivas. As lutas das campanhas da Dilma, contra o impeachment, a prisão do Lula e para Lula ser solto. Agora, essa campanha virulenta. Como resistir?

Desde jovem, desde o meu primeiro voto, e eu venho de família religiosa, a questão da justiça social, para mim, é muito grande. Sempre nos preocupamos com o coletivo, com situações de igualdade. E sempre me identifiquei com o PT. Sempre votei no PT, e nem sempre fui militante. Só fui conhecer o partido de perto quando fui trabalhar na gestão do presidente Lula. Desde então, minha admiração pelo partido só cresceu. Já faz muitos anos que o partido está nessa luta. Já em 2005 pediam o impeachment do presidente Lula, e ele virou o jogo, se reelegeu e terminou o segundo mandato com 86% de aprovação. Hoje, na campanha do primeiro turno, a gente rodou o Brasil todo. Sempre encontramos, em todos os lugares, uma militância aguerrida, articulada e pronta para luta. E sempre com esperança e emoção por este processo. Não existe no Brasil outro partido assim.

A luta é o próprio estilo do PT?

Não estou dizendo que não tenhamos problemas, erros, dificuldades. Mas qual dos partidos não tem? Somos cobrados de fazer uma autocrítica. Mas os outros vão fazer também, ou só nós que temos que fazer?

O seu marido me parece cansado...

Discordo. Ele está angustiado, preocupado com o rumo que a campanha do outro candidato está levando para o processo eleitoral. Existe uma preocupação com o país, também. Desde a redemocratização do país, nós não tivemos uma eleição em que tanto estivesse em jogo. São projetos muito diferentes de país. Um deles aponta para o futuro, o outro para um passado obscuro. Eu acho que é essa a grande preocupação do Fernando.

Sobre as Fake News, você se sente cerceada com relação a sua liberdade e ao que você faz?

Eu faço um exercício para jamais me descolar da minha autenticidade, de quem eu sou. Gosto de me mostrar como sou, para ser criticada ou não. Eu não me importo, e seguro bem as críticas quando estou fazendo o que acredito. Agora, do jeito que as coisas estão, quando você sabe que a Fake News está ali, e qualquer coisa pode ser transformada em um meme, é claro que você se retrai. Principalmente quando você tem um espaço social e profissional construído ao longo da sua vida. Notícias como essas que viralizam, principalmente no whatsapp, claro que a gente se sente retraído, querendo se proteger.

Você acredita que é possível vencer essa eleição?

Tenho esperança. A bola ainda está rolando. Precisamos ser persistentes, perspicazes, entender os movimentos e a estratégia que precisa ser adotada. Nós temos também muita gente conosco, muita força. Não estamos sozinhos. Há muito em jogo, muitos indecisos. Quem sabe nesta última semana os indecisos não vêm para o nosso lado.

Você não sente nesta última semana uma mobilização maior e um sentido de urgência em agir agora?

Sinto isso, sim. Sinto do nosso lado. Sinto que mais pessoas que estavam alheias à política nacional têm se interessado e se posicionado. Mais posicionamentos do nosso lado, e contrários ao Bolsonaro, também têm vindo de espaços que a gente não esperava. Então também o movimento do nosso lado tem crescido, por isso tudo que está em jogo.

E como você encarou a recusa do Ciro Gomes em apoiar o Haddad com a sua presença?

Eu não esperava isso. Sempre tive uma admiração pelo Ciro como político. E o Fernando, muitas vezes nesse período, fez movimentos no sentido de uma aproximação entre os dois, e que foiram correspondidos. Agora, é difícil julgar o Ciro. O que moveu ele a não se posicionar, ou se posicionar sem querer apoiar...

Pensando nos próximos pleitos presidenciais, como você avalia esse cenário. A próxima eleição fará de nós o país das Fake News?

É uma questão que também está em jogo. A forma como as instituições tratarem essa questão será decisiva também para o nosso futuro. Isso vai ser aceito? Então, nos próximos anos, será este o tipo de eleição que teremos? O TSE e STF precisam tratar desta questão de maneira justa, porque ela será decisiva. Precisamos fortalecer a nossa democracia.

Há o risco de, caso o Bolsonaro perca, as Forças Armadas impedirem uma posse?

Acho que não. Acho que nós chegamos até aqui apesar de muitos processos complicados. Se nós chegamos até aqui, é porque as instituições funcionaram.

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SOBRE AS EMOÇÕES da campanha do marido, Ana Estela Haddad destaca um evento em São Paulo, com estudantes do Prouni, um programa que ela e Haddad formularam juntos: “Foi muito emocionante para mim, e eu chorei demais nesse evento. Esse programa tem muita história. Em 2010, foi muito emocionante ver a sua primeira turma de medicina.”