Os Bancos Centrais têm três instrumentos clássicos de política monetária para ampliar ou reduzir a oferta de moeda ao sistema financeiro, e por via de consequência, à economia. Os recolhimentos compulsórios (que representam o encaixe sobre depósitos à vista ou à prazo que os bancos mantém na autoridade monetária); o redesconto (que é uma linha de crédito de emergência, espécie de cheque especial dos bancos em dificuldades de caixa, com juros punitivos em relação às taxas diárias no mercado). Esses dois instrumentos têm enormes defeitos. Causam uma espécie de stop and go na oferta de crédito, no caso dos compulsórios (à vista e à prazo), e operam a posteriori, no caso do redesconto.
Pelas dificuldades de ajustes dos dois instrumentos a momentos de crise econômica generalizada (a trava no compulsório e no redesconto teria sido uma das grandes causas do crash de 1929, que começou como uma crise de liquidez bancária), o Federal Reserve desenvolveu no pós guerra as intervenções diárias no mercado de títulos públicos mediante as operações de mercado aberto (open market).
No Brasil, o sistema foi adotado na virada dos anos 1969 para 1970, quando o forte ingresso de recursos externos pedia controles monetários mais efetivos e que não causassem solavancos na economia.
Mais recentemente, na crise financeira mundial de setembro de 2008, os três instrumentos ficaram obsoletos diante da magnitude do problema e os bancos centrais aditaram um novo instrumento, o quantitative easy, com ampla liberalização de recursos na economia.
Mas é através das operações diárias no open market que o Federal Open Market Committee (FOMC) exerce a política monetária nos Estados Unidos, manobrando as taxas de juros para manter a inflação sob controle (conforme as metas), e a economia e o emprego em crescimento.
Crescimento e emprego
No Brasil, o regime de meta de inflação e o mandato do Banco Central do Brasil se limitam a “assegurar a estabilidade do poder de compra da moeda e um sistema financeiro sólido e eficiente”, sem qualquer referência à questão do crescimento e do emprego.
Pois bem, a urgência da retomada do crescimento é tal, com a economia estagnada no 2º trimestre, depois da queda de 0,2% no 1º trimestre, que o Banco Central, diante da limitação de só poder baixar os juros na próxima reunião do Copom (30 e 31 de julho), mas que esbarra na incerteza dos avanços no campo fiscal, dependentes da aprovação de uma reforma da Previdência robusta, que a única arma disponível é estimular a baixa dos juros via crédito bancário.
Que é o que efetivamente funciona para movimentar a roda da economia.
É uma prova da angústia, quase desespero da equipe econômica com uma economia estagnada.
E também um recibo de covardia do Banco Central, que está lento em baixar os juros.
A inflação caiu da faixa dos 4,94% para 3% e a Selic segue parada em 6,50% ao ano.
Selic e compulsório baixam, mas juros não cedem
A questão é que a Selic despencou desde o governo Temer, quando estava em 14,25%, até os atuais 6,50% (mantidos desde março de 2018). Foi uma queda de 54,38%.
Os recolhimentos compulsórios tanto sobre depósitos à vista e à prazo caíram fortemente nos últimos dois anos (eram uma das reivindicações da Febraban para baixar os juros).
O Banco Central liberou em julho do ano passado mais de R$ 27 bilhões. Em outubro liberou alguns bilhões e agora libera mais R$ 16 bilhões (a partir de 15 de julho, com a redução de 33% para 32%, a partir de 1º de julho dos encaixes compulsórios dos bancos sobre depósitos a prazo.
Mas a montanha de liquidez não resultou em baixa dos juros. Ao contrário, os juros subiram em 12 meses!
No release em que divulgou nesta quarta-feira, 26 de junho, a radiografia do crédito bancário em maio, o Banco Central informou:
“A taxa média de juros das concessões em maio alcançou 25,2% a.a. (-0,1 p.p. no mês, +0,4 p.p. em 12). No crédito livre, a taxa média situou-se em 38,5% a.a., após quedas de 0,4 p.p. e 0,6 p.p. nas mesmas bases de comparação, com reduções mensais de 0,7 p.p. e 0,4 p.p. nos segmentos de pessoas físicas (52,9% a.a.) e de pessoas jurídicas (19,5% a.a.). No crédito às famílias, as principais reduções ocorreram em cheque especial (-2,4 p.p.) e crédito pessoal não consignado (-7 p.p.); no crédito às empresas, destaque para descontos de duplicatas e recebíveis (-2 p.p.) e capital de giro (-0,3 p.p.).
Excluindo-se as operações rotativas, a taxa de juros do crédito livre situou-se em 29% a.a., com variações de -0,6 p.p. no mês e +0,1 p.p. em 12 meses. O spread geral das taxas das concessões de maio manteve-se estável em 19,2 p.p.”.
Ou seja, se não houver pressão do Banco Central sobre os bancos, nada vai mudar para os clientes. Pior para a economia e a sociedade brasileira.
Nos EUA, Trump cobra do Fed
Nos Estados Unidos, o presidente Donald Trump voltou hoje à carga contra o presidente do Federal Reserve (o Banco Central de lá), Jerome Powell. Lá, o presidente do FED tem mandato de 4 anos outorgado pelo Congresso.
Já escrevi algumas vezes criticando o presidente Donald Trump. Nas condições gerais da economia americana, o Fed agiu bem em ter sido cauteloso no manejo das altas (iniciadas por Janet Allen, no governo Obama e continuadas no mandato de Trump, porque os mandatos não são coincidentes, como no Brasil, e na queda, já anunciada por Powell.
A questão é que antes de ser presidente, Trump é um grande empresário do mercado imobiliário. Qualquer pessoa versada em economia sabe que imóveis, que são investimentos de longo prazo, não convivem com juros altos.
Para Trump, cujo patrimônio definhou desde a crise do subprime das hipotecas, que gerou a maior crise financeira mundial em 2008, o ideal é manter os juros o mais baixo possível. Isso enfraqueceria o dólar e favoreceria as exportações americanas, em meio à queda de braços com China, Europa e países asiáticos.
Trump é imediatista. Mas o Banco Central (Fed) tem responsabilidade de olhar adiante, com seis a nove meses de distância.