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Crítica - Um elefante sentado quieto: Carta de despedida

*** (bom)

Divulgação -
Os protagonistas errantes de "Um elefante sentado quieto"
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Hu Bo nem chegou a ser considerado um prodígio. Com um curta elogiado de 2016, e terminado de montar seu primeiro longa, o jovem cineasta chinês tirou a própria vida antes de lançar 'Um Elefante Sentado Quieto', que o colocaria nos holofotes e nas listas de promessas pro cinema da próxima década. No desenrolar das longas quatro horas de duração de seu único filme, fica claro como sua relação com o resto da humanidade estava desgastada e condenada. Um olhar desesperançado e condenatório é lançado sem concessões em uma narrativa onde não há sequer um mínimo espaço para a tranquilidade.

Macaque in the trees
Os protagonistas errantes de "Um elefante sentado quieto" (Foto: Divulgação)

São quatro histórias entrelaçadas que revelam não apenas o pior lado da sociedade hoje, mas principalmente a apatia ao redor que impede cada um de tomar atitudes frente ao caos emocional. Um adolescente que foge após um acidente com um colega de classe, uma menina envolvida num escândalo sobre o vazamento de um vídeo de conteúdo sexual, um idoso posto em um asilo pela própria família e um homem que ao trair o melhor amigo com a esposa dele, assiste ao seu suicídio: juntos, eles querem desaparecer, mas lhes falta a paz que o mundo rouba diariamente de cada indivíduo, e que mergulhou a todos em uma melancolia incurável.

O filme também é um retrato soturno sobre o estado da China atual inclusive politicamente, mergulhada em um cotidiano acinzentado e desolador, com belíssima e elaborada fotografia de Chao Fan. Uma espécie de "filme da catástrofe interior", o filme encontra ecos no 'Babel' de Iñarritu, sendo aqui um desenvolvimento bem mais amplo e problematizado do que lá, embora o desamor e falta de amparo pessoal seja excessivo, o filme nunca deixa de interessar, funcionando como uma carta de despedida a um mundo que tem legado pouca beleza a seus habitantes, mas declara que a reflexão pode ser capaz de mostrar uma saída diante da incompreensão e da incompletude.

*Membro da ACCRJ