Hugo Cals, JB Online
RIO - Por um período de 34 anos, Otacílio d'Assunção, o cartunista Ota, esteve à frente da edição brasileira da Mad, revista americana de humor lançada originalmente por lá em 1952, nas sucessivas editoras que a publicaram no Brasil. Além de editar mais de trezentos números nas várias séries, tornou-se a principal estrela da revista na década de 80, quando começou a publicar os famosos e hilários Relatórios Ota.
Desligado da revista desde setembro, o cartunista decidiu promover um leilão, que acontece no próximo domingo no Rio às 18h30, para se desfazer de todo seu acervo ligado à revista, que vai além das edições, e conta também com bonecos, brinquedos, desenhos originais, até rolos de papel higiênico estampados com símbolos da revista como o desdentado Alfred E. Neuman, o principal personagem da Mad, palavra inglesa que significa 'louco' em português. Ota explica que tem material de muitos artistas, não só desenhos feitos por ele.
O papel higiênico | Foto: Divulgação
- Os artistas eram muito desorganizados e nunca pegavam seus originais de volta. Eles ficaram guardados em caixas e mais caixas no arquivo morto e nem mesmo eu sabia que estavam comigo. Tinha verdadeiras obras-primas no acervo sem saber. O passo seguinte foi contatar os artistas e pedir permissão para incluir os originais na exposição e no leilão. Afinal eles são os verdadeiros donos das obras, eu estava só como fiel depositário - afirma Ota.
O cartunista conta que deseja se desfazer do material que ocupa uma sala inteira em seu estúdio, local onde não por acaso funcionou a redação da revista nos últimos anos. Para Ota, os caminhos diferentes tomadas pela revista estimularam sua saída (a revista que está nas bancas brasileiras atualmente não tem mais a assinatura de Ota).
O jogo de tabuleiro em que quem ganha, perde | Foto: Divulgação
- Saí da revista porque discordava dos rumos que ela está tomando. Então, quando dei o basta, a intenção era jogar tudo fora. Mas ao ver o material percebi que essa época não poderia ficar sem registro. Vou celebrar, com uma grande festa de despedida, o fim de uma era. Teremos até uma exposição, é bom ver como as coisas eram feitas naquela época - diz o cartunista.
A maioria dos originais são das décadas de 70, 80 e 90, quando Ota tinha o controle editorial absoluto e a revista chegou a vender quase 200 mil exemplares mensais. Nesse período, as únicas diversões baratas eram gibis e ir ao cinema, e os preços de ambos não eram tão salgados. Época áurea para a Mad, quando a revista era exposta com destaque nas bancas. Com a chegada dos videogames, jogos RPG, internet, DVDs e outras mídias mais modernas, o interesse dos adolescentes (eterno público-alvo da revista) foi se desviando e as vendas caíram.
- Com isso a Mad foi para uma editora menor, que nunca deu o tratamento que ela merecia e não se levantou mais. As verbas encolheram e ficou impossível fazer um bom produto. Hoje não vende 10 mil exemplares e o preço (R$ 5,90) não cabe no bolso da molecada que compra. Para um adolescente com 10 reais na mão, mais vale comprar um X-tudo e baixar coisas de graça na Internet. Eu fiz o que pude, mas é impossível remar contra a maré - desabafa.
Carreira solo e o futuro do humor
Depois de deixar a revista que o acolheu por três décadas, Ota parte para carreira solo. Uma coleção de livros de bolso, compilando o melhor dos Relatórios Ota, começa a sair pelo novo selo Barbanegra. O cartunista está mais voltado para animações, sua paixão atual. Criou o seu OtaTube, onde exibe uma animação nova todos os dias, experimentando várias técnicas, e acaba de fechar contrato com a Oi Futuro para criar a área infantil do site do Museu.
- A minha próxima meta é produzir animações para celular e para as novas mídias que estão surgindo. O papel está acabando, até porque, daqui a pouco, não vai haver mais árvores para servir de matéria-prima. Tudo está mudando muito rápido e breve teremos o papel eletrônico, onde as imagens vão se mexer como nos livros de Harry Potter. Quem não estiver preparado para isso, dança. Desejo boa sorte aos que estão fazendo agora a revista, mas creio ser impossível levantá-la no formato atual.
Lancheira estampada com o mascote da revista, Alfred E. Neuman | Foto: Divulgação
No entanto, apesar de reconhecer que revistas como a Mad perderam espaço por conta de seu formato tradicional, mas ressalta que humor, sátira e comédia não vão acabar nunca. Para Ota, as revistas vão simplesmente migrar para outra mídia.
- Estamos num período de transição, por isso as coisas estão confusas...o que é certo é que a banca está deixando de ser um canal para vender esse tipo de revista, que não sobrevive sem anúncios e por isso custa muito caro. Toda a logística da distribuição tem que ser revista. Estou meio fora disso por enquanto, agora estou correndo com os livros de bolso do Relatório Ota que saem nas livrarias a partir do ano que vem e investindo todas as minhas energias no OtaTube, o que não deixa de ser uma outra maneira de fazer o mesmo trabalho que eu fazia na Mad. Mas se o leilão der muito lucro, por que não? Lanço a revista do OtaTube - finaliza.
Serviço
Leilão e mostra de artigos da Mad pertecentes ao cartunista Ota
Abertura da Mostra: 11/12/2008, às 19h.
A exposição permanece aberta ao público de 12h às 22h, entre 12 e 13/12/2008
Leilão: 14/12/2008 às 18:30.
Casas Casadas - Rua Leite Leal 11 - Laranjeiras - Rio de Janeiro