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Biografia de Raul Seixas prioriza as histórias prosaicas do cantor

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Ricardo Schott, Jornal do Brasil

RIO - Publicações sobre Raul Seixas existem inúmeras, indo desde almanaques, teses e dissertações a volumes de fãs ou sobre esoterismo.

O jornalista paulistano Edmundo Leite está há cinco anos empenhado no objetivo de dar ao roqueiro baiano sua primeira biografia digna deste nome. O livro, para o qual ainda não decidiu um título, está previsto para lançamento em agosto de 2009, quando acontece o 20º aniversário de morte de Raul.

Mesmo num momento em que os inúmeros mitos em torno do cantor vêm à tona, Leite diz que planejou seu trabalho para caminhar na direção contrária do Raul mitológico.

Durante a pesquisa, trabalhei o tempo todo com o objetivo de humanizar o Raul destaca o jornalista.

Ele era um cara carismático, era natural que esse carisma todo dele se sobressaísse. Só que essa devoção, que os fãs sempre tiveram, acabou tirando o aspecto humano dele, suas fraquezas. E percebi o quanto fazia falta uma biografia de verdade, com apuração realmente boa.

Entre os aspectos explorados no livro, está o trabalho de Raul no estúdio. Antes de estrear solo com o álbum Krig-Ha Bandolo (1973), o cantor atuou como produtor e músico de estúdio na CBS (hoje Sony BMG), trabalhando com hitmakers como Mauro Motta e cantores populares como Jerry Adriani, Odair José, Trio Esperança e Oswaldo Nunes, para quem concebeu álbuns.

Dureza no estúdio

Os fãs têm a tendência de achar que o Raul abria o armário e tirava um disco pronto lá de dentro, como se fosse uma coisa mágica. Mas trabalhava-se duro na produção de seus álbuns. comenta Leite, que descobriu que até músicos nunca relacionados ao cantor, como Wagner Tiso, trabalharam com ele.

A lista dos músicos participantes de Gita, por exemplo, era enorme. Os discos dele tinham orçamento caro. Raul já chegou na Philips (hoje Universal) como top de linha, era uma das prioridades da gravadora. Procurei esmiuçar as histórias das gravações das músicas, como se deu tudo, quem estava ao lado dele nas ocasiões.

Para quem lida com um personagem como Raul um sujeito que, em entrevistas, tinha o hábito de contar diferentes versões dos mesmos casos não é tarefa fácil confirmar certas histórias.

Objetivando dissipar dúvidas, o biógrafo relata ter confrontado várias versões. Mas não escapou de se deparar com situações inusitadas.

Tem situações que foram presenciadas por três, quatro pessoas, e cada uma diz uma coisa sobre o assunto. Confrontei tudo e depois fui percebendo que algumas coisas não poderiam ter acontecido. Outras aconteceram, mas eram contadas de várias formas explica, citando um exemplo: A ida do Raul aos Estados Unidos em 1974, quando dizia ter se encontrado com John Lennon, é coberta de histórias e desmentidos. Corri atrás dos fatos e, quem ler a biografia, vai ver o que aconteceu.

Durante a realização de sua pesquisa, Leite não economizou esforços para encontrar personagens importantes da história de Raul. Até mesmo alguns cujas presenças são, geralmente, abafadas.

É o caso do guitarrista americano Gay Vaquer (pai do cantor Jay Vaquer), que tocou com Raul de 1970 a 1978 e chegou, com o amigo, a se envolver num projeto malsucedido de road movie, em 1976, O triângulo do diabo.

O autor foi aos Estados Unidos encontrar-se com ele e com a família americana de Raul (a ex-esposa Gloria, irmã de Gay, e Scarlet, filha que teve com ela).

Todo mundo que procurei falou bastante sobre todos os assuntos, ninguém se negou a explorar nada, até mesmo as ex-esposas. Todas elas, inclusive a Kika Seixas (que detém os direitos de Raul), me receberam afirma o autor, que recebeu o mesmo tratamento de Paulo Coelho.

Quando falei com ele, ainda nem existia o projeto do Fernando Morais (a biografia O mago). Passei três dias com Coelho em Genebra e ele me abriu todos os seus arquivos, falou sobre tudo.

Do lado profissional de Raul, o escritor acabou chegando aos aspectos que construíram outras facetas suas.

Ele tinha excelentes músicos, mas não gostava muito de ensaiar, nem exigia muito deles. Os músicos é que queriam elaborar mais, mas Raul não ligava para isso. Queria um rock básico diz Leite, que abordou também como as drogas e o álcool foram tomando conta da vida do artista.

Depois de meados dos anos 70, ele passou a faltar shows, a fazer poucas apresentações. Aí ficou realmente complicado para quem tocava com ele, porque os músicos começaram a perder dinheiro.

Entrevistado (e personagem) do livro, o presidente do fã-clube Raul Rock Club, Sylvio Passos avisa que fãs de todas as faces do cantor da mitológica à mais realista terão vez em 2009.

O livro de Leite se junta a uma série de projetos conta Passos.

Tem o documentário do Walter Carvalho, O início, o fim e o meio, além de vários shows e de projetos de relançamentos que estou apresentando às gravadoras. A Globo também acaba de finalizar um Por toda minha vida sobre Raul.