Lendro Souto Maior, Jornal do Brasil
RIO - O pé-sujo Rosa de Ouro, na Voluntários da Pátria, em Botafogo, está bombando quando o nome 'Erasmo Carlos' pisca no bina do celular do guitarrista Luiz Lopez, do grupo Filhos da Judith. Ele, que já entornara algumas cervejas, quase não acredita. Achou que era miragem de bêbado. O grupo já havia gravado vocais no mais recente disco do Tremendão, mas sequer imaginava que a aproximação renderia ainda mais. Pensa, atendo ou não? . O aparelho, surrado de guerra, só funciona no viva-voz. Atende. Nem tamanho falatório à sua volta é suficiente para abafar a inconfundível voz de um dos reis do iê-iê-iê, que dispara a constrangedora pergunta: Bicho, é o Erasmo, tenho uma coisa para te perguntar: há quanto tempo você não trepa? . Exposto em alto e bom som a todos presentes no boteco, sem entender direito o que acontecia, Luiz hesita por um momento, no que Erasmo emenda: Tô ligando para convidar o Filhos da Judith para a turnê do disco Rock 'n' roll. Agora é que você vai trepar como nunca !
Foi o melhor convite que recebi na vida conta o guitarrista, de 27 anos, ainda incrédulo, Rickenbacker vermelha em punho, dividindo o estúdio com o ídolo de toda uma vida.
Depois de anos batalhando no underground carioca com vitórias como a classificação para o festival Mada, em Natal, nas eliminatórias do site Laboratório Pop a oportunidade finalmente bate à porta. O trio, que Luiz Lopez divide com o irmão Pedro Dias (28, baixo, ambos filhos de uma Judith na vida real), mais o adotado Alan Fontenele (26, bateria), é a base da banda que cai na estrada a partir de 25 de setembro com estreia no Vivo Rio na nova turnê que Erasmo Carlos levará ao país inteiro.
Quando conheci essa rapaziada, através do Liminha, produtor do álbum, senti uma energia de sonho e esperança, um ímpeto que me lembrou na hora do que eu era no início da carreira destaca Erasmo. Hoje sou um cara sério, responsável, que paga imposto de renda... Me rejuvenesce a vibração dessa moçada.
Fotos: Vitor Silva
O astral retrô do grupo fez mesmo a cabeça do eterno roqueiro, de 68 anos. Fãs dos Beatles e dos Mutantes, os garotos estão sempre vestidos de impecáveis terninhos como os que caracterizaram a fase inicial da carreira dos cabeludos de Liverpool. A vocação para bolar intrincados arranjos vocais fez toda a diferença na hora da escolha.
Lembro quando o Liminha me mostrou as vozes que colocaram no meu disco recorda Erasmo. A primeira coisa que perguntei foi: que droga esses caras tomaram? Isso está sensacional .
Para a turnê, estão recrutados também músicos de uma geração intermediária. Dadi e Billy Brandão completam a parede de três guitarras e o maestro José Lourenço, escudeiro de Erasmo há 25 anos, está atrás de seus teclados e é quem coordena os arranjos.
Me amarrei desde a primeira vez que ouvi esses caras cantando, no CD, e mais ainda agora tocando elogia Dadi, que troca o usual baixo que sempre marcou sua carreira por uma guitarra Fender Stratocaster. Adoro tocar guitarra, me sinto muito bem também com este instrumento. E essas músicas maravilhosas do Erasmo são diversão total.
Os ensaios quase que diários já começaram, no Estúdio Verde, no Cosme Velho. No que a equipe do Jornal do Brasil acompanhou, estão passando e repassando Negro gato (Getúlio Cortes). O Filhos da Judith faz uma levada puxada para o soul de James Brown. Veterano, Billy Brandão sugere que o lance vá para um caminho mais Led Zeppelin .
O Erasmo disse para ninguém ouvir as versões originais das músicas, para não se deixar influenciar. Quer que saia tudo naturalmente conta Pedro Dias. Ele diz os acordes são esses , e a gente vai tocando atrás.
O repertório, baseado no disco Rock 'n' roll, está recheado de clássicos da carreira (confira abaixo).
Vou colocar a modéstia de lado: os Rolling Stones que me perdoem, mas eu não tenho uma Satisfaction... tenho várias gaba-se o compositor. É impossível eu fazer um show e não tocar músicas como Festa de arromba ou Gatinha manhosa.
O grupo não se limita às previamente selecionadas. Garante que tem na manga umas 200.
Herdamos da nossa mãe Judith vários LPs dele conta Lopez. Já tocamos essas músicas há anos.
Ele parece da nossa idade
O intervalo de cinco minutos no ensaio é a deixa para os jovens músicos sacarem da mochila seu CD-demo, Eu queria ser vinil, que gravaram com suas próprias músicas. Distribuem aos novos colegas de banda. O exemplar para Erasmo vem com uma recomendação:
Mestre, essas são as músicas para você aprender para o próximo ensaio faz galhofa Lopez.
O Tremendão olha atentamente, curioso, guarda em sua bolsa e devolve a brincadeira, perguntando ao jornalista:
Eles já contaram que são todos homossexuais?
O clima de banda, onde um sacaneia o outro incessantemente, não para de rolar.
Ele parece um cara da nossa idade compara Dias. Não tem nada a ver com o mito que a gente criou em nossa cabeça, da distância que um ídolo impõe.
O que vai para a estrada:
Jogo sujo (Erasmo Carlos)
Mar vermelho (Erasmo Carlos/Nando Reis)
Celebridade (Erasmo/Patrícia Travassos)
Mulher (Erasmo Carlos)
Minha superstar (Erasmo Carlos/Roberto Carlos)
Sentado à beira do caminho (Erasmo Carlos/Roberto Carlos)
Fama de mau (Erasmo Carlos/Roberto Carlos)
Cover (Erasmo Carlos)
Chuva ácida (Erasmo Carlos/Nelson Motta)
Panorama ecológico (Erasmo Carlos/Roberto Carlos)
Gatinha manhosa (Erasmo Carlos/Roberto Carlos)
Negro gato (Getúlio Cortes)
Noturno carioca (Erasmo Carlos/Nelson Motta)
Olhar de mangá (Erasmo Carlos)
Lobo mau (versão de Hamilton
di Giorgio)
A guitarra é uma mulher (Erasmo Carlos/Chico Amaral)
Sou uma criança não entendo nada (Erasmo Carlos)
Quero que vá tudo pro inferno (Erasmo Carlos/Roberto Carlos)
Pode vir quente que eu estou fervendo (Carlos Imperial/Eduardo Araújo)
Festa de arromba (Erasmo Carlos/Roberto Carlos)