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Sábado, 10 de maio de 2025

Crítica: 'Beleza Adormecida'

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Uma coisa é certa: Emily Browning foi bastante corajosa em assumir a protagonista do estranho Sleeping beauty. Famosa por seus trabalhos em Desventuras em série e Sucker punch, a atriz australiana mostra que cresceu na trama escrita e dirigida por Julia Leigh, em cartaz no Festival do Rio. Com um história verdadeiramente inquietante, o filme é definitivamente do tipo “ame-o ou deixe-o”, embora pareça bem mais fácil deixá-lo.

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Sleeping beauty é uma mistura de Bela Adormecida com Cinderela. Lucy (Emily Browning) é  uma universitária tentando sobreviver aos pagamentos do fim do mês. Seus pais não são ricos, e, como uma gata borralheira, ela tem que se desdobrar entre três empregos para pagar a faculdade e o aluguel. Até aí nada de muito novo. O lado Bela Adormecida, contudo, é um tanto mais perturbador. Em vez de um encanto colocado por uma bruxa malvada, o sono de Lucy é causado por um chá exótico, oferecido por Clara (Rachael Blake).

Clara é líder de uma espécie de clube que oferece a velhos ricaços a oportunidade de dormir com belas moças. Mas é dormir mesmo, pelo menos no caso das meninas, que ficam completamente desacordadas enquanto os clientes podem fazer o que bem entendem com elas - exceto sexo propriamente dito, afinal "sua vagina é um templo", como diz a própria Clara. A história, quando contada, deve soar extremamente profunda. Homens que pagam para ter mulheres inertes. Mulheres que recebem para deixar que alguém as use sem que haja qualquer lembrança do que aconteceu.

De fato, a ideia é complexa, intrigante e perturbadora. A protagonista, Lucy, em si, também provoca uma certa curiosidade, porque nunca se sabe o que ela vai fazer em seguida. Ela é imprevisível, não há uma razão explícita em suas atitudes. Mas por que Lucy é assim? Por que ela se dispõe a isso? É pelo dinheiro? Ela chega a queimar uma nota de cem dólares, assim do nada. E por que esses homens buscam jovens inertes, tão inertes que parecem cadáveres, com as quais não podem fazer sexo? 

Nada disso é explicado com profundidade. Na verdade, nada efetivamente acontece no filme. Em pouco mais de 1h30, a sensação que fica é que fomos apresentados a diversos fragmentos de trama, que não foram devidamente colados de maneira a montar um todo consistente. Caminhamos por uma linha reta e cheia de falhas, diante de personagens os quais não temos a chance de compreender muito bem. O pior é que, muitas vezes, essa reta parece se transformar em um círculo de cenas repetitivas e vazias, com movimentos de câmera intermináveis de tão lentos. Nessas horas parece que o filme nunca vai chegar ao fim.

Tudo isso se alia ao fato de que Lucy não muda, não passa por transformações, não aprende, não vence e nem parece ter um objetivo específico. Não estamos, portanto, diante de um típico filme hollywoodiano. Julia Leigh quebra os padrões e nos apresenta uma protagonista que, durante a maior parte da trama, parece estar anestesiada, apática. Nem quando Lucy está consumida pela curiosidade de saber o que acontece nas horas em que fica apagada, conseguimos sentir essa necessidade. É somente quando ela acorda – no sentido mais amplo possível – que o público finalmente pode ver uma faísca de sentimento. Mas então o filme acaba.

Cotação: * (Regular)