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Quinta, 1 de maio de 2025

O risco de generalizar

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Passado o ano em revista, com a natural e preferencial preocupação de identificar o que andou errado, e nesse passo pouca atenção se dedica ao que caminhou bem – nem tudo era tragédia e lágrima – o que mais frequentemente se observou foi a condenação da classe política. Um sentimento coletivo cuidou de enviar ao patíbulo todos os seus agentes e representantes, sem distinção, tenham ou não engordado as algibeiras com o dinheiro das propinas e dos contratos obscuros da Petrobras. No conceito popular, notadamente nos dias que antecederam o processo eleitoral, o agente político ficou como sendo originalmente membro de uma categoria suspeita. Eis o que se precisava para a condenação sumária. Sumária e coletiva. Político não presta, eis a sentença que dispensa ponderações.

Um procedimento dessa natureza revela-se não apenas injusto, como inadequado, porque acaba por premiar os maus, dando-lhes, na generalização indiscriminada, a confortável companhia dos bons. Nada melhor para o bandido se, na hora em que chega a polícia, for visto, acidentalmente, ao lado de uma pessoa de bem. De forma que, quando a opinião geral coloca todos os políticos num balaio comum, comete grave injustiça com os bons, que pagam pelo mal que não praticaram; é a mesma injustiça que exalta os safados por estarem ombreados com a virtude e o crime. No momento em que soubermos refletir sobre diferenças e apreciá-las sem rancores e preconceitos os resultados serão melhores.

Confira-se o noticiário. Não houve presença mais notória que o banditismo que imperou em 2018, não apenas pelos assaltos contra o dinheiro do povo, nos doze meses que correram, como também pelo vigoroso respaldo vindo de tempos passados. Então, os brasileiros desencantaram-se com a classe política, mesmo que a recente eleição não excluísse o desejo sádico de vários em reeleger muitos veteranos habituais frequentadores dos relatórios da Polícia Federal.

Mas cabe insistir: é temerária a depreciação de todos, porque nas casas legislativas há pessoas honradas. Pode ser até que não sejam numerosas; muito menos a maioria. Contudo, ainda é possível encontrá-las, quase sempre discretas; e quando se expressam, é para confessar preocupação com o futuro incerto dos padrões de probidade como uma virtude essencial dos poderes. E, quando quedam confundidas com os suspeitos ou condenados, geralmente sua reação é abandonar a vida pública, para não terem de carregar o ônus do nivelamento injusto. Ora, se desistem, fica mais espaço para hospedar os aventureiros. Toda injustiça, por deplorável, deve ser evitada, e os políticos honrados estarem a salvo dela.

O necessário cuidado com o apelo à generalização, por causa dos males que ela favorece, voltou a ser lembrado, no sábado, quando o presidente Jair Bolsonaro prometeu trabalho persistente para reencontrar o desenvolvimento nacional, e o fará, segundo disse, sem o que chama de “entraves” de Organizações Não Governamentais, sem dizer quais são elas e as dificuldades que elaboram. Tornou-se o caso mais recente de espalhar para todos os pecados de alguns. Várias dessas ONGs, de fato, trabalham abertamente contra os interesses do país, transitam com a generosa complacência do Congresso, da Presidência da República e da polícia. Mas há também as que são sérias e dirigidas por pessoas honradas, o que o presidente devia ter levado em conta. As boas ONGs, como ocorre com os políticos sérios, se comparadas injustamente com as similares que deturbam suas finalidades, acabam desistindo. E o que o Brasil mais precisa neste momento é de gente boa para trabalhar.