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Maria da Conceição Tavares: "O país direitizou"

Para a decana dos economistas, Jair Bolsonaro é um candidato muito ruim, "um fascistóide"

Reprodução -
Maria da Conceição Tavares
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Combativa e polêmica como sempre, a professora Maria da Conceição Tavares, de 88 anos, acha que se eleito, o candidato do PSL Jair Bolsonaro, vai agravar a recessão que já se abate sobre o país desde o segundo mandato de Dilma Rousseff . “Pode nos aprontar uma recessão maior do que a que já está aí”. Famosa e respeitada desde as críticas veementes que fez ao modelo econômico da ditadura militar, Conceição lamenta o que ela chama de “direitização” do mundo inteiro, mas explica que, no Brasil, o caso é ainda pior: “(Carlos) Lacerda perto do Bolsonaro é refresco”, ressalta. “Bolsonaro não é um conservador, ele é fascista”.

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Maria da Conceição Tavares (Foto: Reprodução)

Por que o candidato do PSL, Jair Bolsonaro, ganhou tanta força?

Há uma guinada política à direita. O país ‘direitizou’. Como se explica um Bolsonaro com esse prestígio? Você já viu, no passado, uma figura política como Bolsonaro? Não teve. Ele está com muita vantagem sobre o (candidato do PT, Fernando) Haddad. Nem o (ex-presidente) Lula ganhou por essa maioria. O mais direita que nós tivemos é o (jornalista e político, Carlos) Lacerda. E o Lacerda perto do Bolsonaro é refresco.

A senhora concorda que há, no mundo, uma tendência…

Direitizou no mundo inteiro. Isso pode ser explicado pela crise mundial que nós tivemos há três anos. E, ao contrário do que as pessoas dizem, crise direitiza, não esquerdiza. É evidente. Há no mundo uma tendência conservadora. A partir do que ocorreu nos Estados Unidos, com Donald Trump, e se espalhou.

Na Europa também?

Sim. Você viu na Suécia, as eleições recentes? Tem uma direitização geral sim.

Mas a senhora fica espantada disso estar ocorrendo também no Brasil?

Se está ocorrendo no mundo inteiro, porque não haveria de ocorrer no Brasil? Só que aqui o candidato é muito ruim. Não é uma direita conservadora normal, ele é um fascistóide, e isso faz uma diferença. Na Suécia e nos outros países da Europa, a tendência não é fascista, é de direita, que é outra coisa.

A líder da extrema direita francesa, Marine Le Pen, declarou que as ideias dele não se aplicariam na França. A senhora concorda?

Ela não ganhou na França. A Europa está conservadora, mas não de extrema direita. Enquanto esse nosso candidato aqui é de extrema direita. Essa que é a droga. Direita no Brasil é aquele paulista, o ‘picolé de chuchu’ (Geraldo Alckmin, do PSDB).

Há gente que atribui esse avanço ao antipetismo…

Na Europa não tem PT, de maneira que isso não tem sentido. É claro que aqui as pessoas racionalizam que é por causa do PT. Não acho que seja. O Lula já ganhou várias vezes e não aconteceu nada como aconteceu agora. Não apareceu nenhum candidato de extrema direita como agora.

E a igreja evangélica…

Não tem igreja evangélica na Europa. Ela tem peso, mas não é decisiva. Há uma maré de direita no mundo mesmo.

A senhora acha que o PT deveria fazer autocrítica, como alguns defendem?

Talvez. Mas eu não creio que haja autocrítica do PT que freasse ele. Bolsonaro é um fascista independentemente da autocrítica que o PT faça.

Como a senhora vê a assessoria econômica dele, com o Paulo Guedes?

Péssima. Imagina aquele Guedes… É um espanto. É o ultra neoliberal. Vai ser uma desgraça para o país se ele ganhar.

O Bolsonaro voltou atrás e disse que não vai privatizar empresas estratégicas…

Isso é para acalmar o público e aumentar a votação nele.

Mas o mercado reagiu contra…

O mercado é o mercado. A opinião do mercado vai ser sempre de direita.

E se o Bolsonaro ganhar…

Nem me diga. Esse é fascistoide mesmo. A perspectiva é ruim. Teremos um desequilibrado no governo. Nunca tivemos nenhum candidato tão ruim. Isso é pior do que o (ex-presidente, Fernando) Collor. O Collor é um troglodita. Bolsonaro não tem ideia de nada. Não é um conservador, que nós tivemos vários governos, ele é fascista.

Mas nós temos uma Constituição e ele não pode atropelá-la…

Poder, pode, né. A Constituição não diz qual é a política econômica. Não diz nada sobre privatização. Estou preocupada com a política econômica que ele vai fazer. Ele vai nos aprontar uma recessão maior do que já está aí. Vai contrair mais o gasto público, arrocho de crédito, uma política cambial imbecil... Nós estamos ferrados.

Alguma coisa pode ser feita para reverter essa situação? E se houver, quais seriam as possibilidades de governabilidade do Haddad?

Acho difícil. O Haddad é um sujeito muito tranquilo, ele não é um sujeito de extrema esquerda. Mesmo dentro do PT, ele é moderado. Sempre há uma ala mais à esquerda no PT, mas esse não é o caso do Haddad. Não acredito que ele teria grandes dificuldades de governar. Não está propondo nada de extraordinário. Não creio que vá acontecer nenhuma desgraça. Se fosse um cara mais radical, talvez desse bode. Ele não teria dificuldade de fazer uma aliança no Congresso.

Haddad defende que o debate deve se concentrar na questão econômica. É possível reverter a crise?

É claro que é possível. Investimento público gera emprego. Só que o investimento público caiu, por causa do governo de (Michel) Temer, que é conservador. O Brasil precisa de uma política progressista, por isso que a crise piorou. O problema é que o Bolsonaro é de extrema direita, então eu não sei o que ele vai fazer…

Uma das críticas que se faz é exatamente que o último governo da Dilma agravou a recessão.

Isso foi por causa da política de austeridade. Ela não devia ter nomeado aquele desgraçado daquele economista, o (ex-ministro da Fazenda, Joaquim) Levy. O impeachment veio depois dela nomear o Levy, não antes. Nomeou o Levy para evitar o impeachment e não deu resultado. Fez besteira. O Levy é de extrema direita. Devia ter mantido o (Guido) Mantega.