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Eduardo Shimahara ensina a arte de poupar para investir

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Leda Rosa, Jornal do Brasil

SÃO PAULO - Eduardo Shimahara, engenheiro e diretor de Sustentabilidade e Inovação do Anima Educação, grupo que gerencia os campus da Unimonte de Santos e Belo Horizonte, tem o desafio de ser sustentável na prática. Shima, como é mais conhecido pelos colegas, dribla um orçamento quase zero poupando recursos de insumos como água, energia, papel e copos plásticos. Na prática, seu desafio é ainda maior: trazer o tema para as salas de aula numa perspectiva transdisciplinar, em especial no curso de Administração. Só assim os futuros gestores estarão aptos para um mercado cada vez mais exigente em práticas sustentáveis.

Por que é importante desenvolver a educação voltada para a sustentabilidade?

Venho estudando o tema há seis meses, inclusive fora do Brasil, e percebo que sustentabilidade não é uma onda de marketing ou algo passageiro mas uma transformação pela qual o mundo está passando. Acho que não estudar o tema hoje vai te colocar numa posição defasada, na qual o mercado avança para o tema e você não esteja preparado. Quem não estudar sustentabilidade, vai ficar fora do mercado.

As empresas querem profissionais que dominem estas informações?

Recentemente, o presidente de um conglomerado alimentar me disse que contrata trainees das melhores faculdades de administração de São Paulo. No processo seletivo, faz cinco ou seis questões sobre sustentabilidade e nenhum dos candidatos consegue responder a todas. O resultado é que a empresa está sendo obrigada a criar cursos para reajustar ou reformar este recém-formado.

De 2008 para cá, que ações a Unimonte desenvolveu em prol da sustentabilidade?

A Anima assinou o Pacto Global (iniciativa da Organização das Nações Unidas que conta com 10 princípios e cujo foco é reforçar a importância da responsabilidade social corporativa), em setembro de 2008. A adesão ao Pacto pode ser feita por qualquer empresário, mas o importante mesmo é mostrar que tem práticas sustentáveis, descritas em relatórios, nos quais informa a ONU sobre ações desenvolvidas.

Que projetos estão sendo trabalhados?

Estamos debruçados agora sobre os princípios ligados ao meio ambiente, de número sete e oito no Pacto Global. O tema nos aponta desafios como o de não termos reciclagem em grande parte dos nossos campi e a necessidade de monitoramento do uso de energia, água e papel per capita.

Qual a previsão de implantação do projeto da reciclagem?

Temos quatro campi em Santos e dez em Belo Horizonte. Começamos no campus Victorio Lanza, em Santos e no Raja, em Belo Horizonte, com 7 mil pessoas, entre alunos e funcionários, em cada cidade. Todos devem estar cobertos entre 18 a 24 meses.

Qual a verba para o projeto?

O presidente da Anima, sempre nos coloca um desafio, dizendo que como núcleo de sustentabilidade precisamos ser exemplo, partindo do investimento zero e usando recursos gerados em ações como a economia efetiva no consumo de água, energia e papel. Estes valores serão reinvestidos, por exemplo, em lixeiras e coletores, que podem chegar a custar R$ 900 a unidade. E cada campus precisa de, no mínimo, 100 lixeiras. E este gasto não virá do bolso do aluno.

Qual a meta de redução?

Não fechamos um total, mas algo em torno de 25%.

Como é o plano de trabalho na prática?

A conta de insumos beira hoje os R$ 90 mil reais nos três campi de Santos. Com o programa de controle dos gastos conseguindo poupar 25% deste valor ao mês, terei R$ 22,5 mil para compor os outros campi rapidamente. O mesmo se aplica aos copos plásticos, consumidos em profusão e que, com uma economia mensal seria possível a compra gradual de canecas para uso mais perene. Pego R$ 8 mil em copos e R$ 2 mil em canecas e, teoricamente, o setor que está com as canecas vai parar de consumir copos plásticos. Aos poucos, consigo zerar a conta e substituir o plástico pelo não-descartável e sem falar no impacto ambiental. É um exemplo de que sustentabilidade não custa caro. São recursos que já estão dentro de casa. É uma questão de inteligência. E de educação.

Que outros projetos o Pacto inspirou?

Os princípios um e dois, que tratam dos direitos humanos, nos inspiraram a treinar funcionários e professores recém-contratados e fornecedores. A sustentabilidade não se dá sozinha, não adianta ser uma empresa que não polui e seu principal fornecedor ter 50% de mão de obra escrava. A capacitação para os que já trabalham nos campi ocorre mês a mês. Ainda temos a abordagem do princípio dez, da não-conivência com qualquer tipo de corrupção. O professor Felipe Chiarello prepara ainda para 2009, em Santos, um grande fórum para discutir a corrupção.

O que é e como surgiu o Guia de Consumo Responsável de Pescados?

É um guia que foi lançado em novembro para ajudar qualquer pessoa que vai à feira a fazer escolhas mais conscientes na hora de comprar peixes e frutos do mar, indicando as espécies que estão ameaçadas ou não. Foi idéia da professora Cintia Miyaju e os interessados podem fazer grátis o download do material no site https://www.unimonte.com.br/bem-vindo/guia.html

Quais os maiores desafios que a sustentabilidade traz para a Unimonte?

O primeiro é as pessoas entenderam que sustentabilidade é uma nova forma de ver as mesmas coisas. Outro é perceber que sustentabilidade não é só meio ambiente. Na ótica corporativa, trata-se de um tripé. A empresa sustentável é aquela que é sustentável economica, ambiental e socialmente. O maior desafio é tentar de fato colocar isto dentro de todas as salas de aula.

A intenção é colocar a sustentabilidade em toda a grade disciplinar?

Tivemos uma experiência muito bem sucedida com a professora Juliana Salvador, coordenadora do curso de Administração de Belo Horizonte. Ela é estudiosa da questão estratégica da administração e, sentindo que havia receptividade da instituição para a questão da sustentabilidade, modificou o currículo para que todas as disciplinas tivessem sustentabilidade como pano de fundo. Levou três meses para que os 60 professores fossem conscientizados da importância do tema. O caso teve tanto sucesso que ela fará uma exposição no Global Forum, em Cleveland (EUA), em junho.

Qual a diferença desta experiência com inúmeras faculdades que têm disciplinas de sustentabilidade?

A diferença é que a professora Salvador tratou o tema de forma transdiciplinar. Quando um aluno de Administração de Belo Horizonte vai estudar a questão de balanços contábeis, já estudou balanços de sustentabilidade, o balanço GRI, no qual aprende a identificar e interpretar quais são as informações relevantes socialmente, ambientalmente e economicamente. Quando estuda a Teoria da Administração, começa a ver novos modelos de empresas que estão reajustando seu foco, melhorando seu produto, se tornando mais rentáveis, se tornando menos impactantes ambientalmente e se tornando socialmente mais viáveis. São pequenos detalhes nas disciplinas que fazem com que o tema permeie 100% da grade de administração. Infelizmente, tenho visto faculdades e universidades que notaram que a questão da sustentabilidade é importante mas querem correr contra o tempo, querem fazer o mais rápido possível. Penduram uma disciplina no último semestre depois de passar todo o curso defendendo a maximização econômica e criam uma incoerência curricular.

E Santos, quando terá esta mudança curricular?

A professora Juliana deve implantar a mudança para os 1100 alunos e 35 professores de Santos já em 2010.

Em quanto tempo a Unimonte colocará no mercado trainees preparados para a entrevista com aquele presidente do conglomerado alimentar citado no início da entrevista?

Em cinco anos, que é o prazo do curso de Administração, formaremos a primeira turma de administradores sustentáveis.