Pedem-me artigo de um dia para outro — no caso, o JB online —, em justa homenagem a dom Orani João Tempesta. Respondi que estava com dois problemas. Estou em Caxias, Maranhão, Encontro Nordeste da Rede de Educação Cidadã. Portanto, com pouco tempo. E, segundo, não conheço dom Orani, a não ser pelos artigos no JB, por notícias de imprensa e pelos elogios do papa Francisco na Jornada Mundial da Juventude, o que não é pouco.
Ano passado, quando me perguntavam sobre o papa Francisco e sobre as necessárias e urgentes mudanças na Igreja Católica, eu respondia: “Vamos esperar a nomeação de bispos e cardeais. Será um dos sinais do que irá acontecer. Bispo é bispo por 20 ou 30 anos. Dele depende a orientação pastoral da diocese, dele depende muito a formação dos padres, a importância dada aos leigos ou não. Tudo por décadas, até gerações”.
Para minha feliz surpresa, o papa Francisco nomeou dom Jaime Spengler arcebispo de Porto Alegre, franciscano, e quem o conhece diz ser bem diferente dos arcebispos anteriores, os quais conheci bem, alguns meus ex-professores de teologia. E nomeou frei João Inácio Müller bispo de Lorena, SP, meu ex-confrade e ex-provincial dos franciscanos do Sul.
O papa Francisco começou a mudar o Vaticano, suas estruturas de poder e seu banco. Pela primeira vez na história, um papa enviou mensagem e bênção para um Encontro de Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), que se realizou agora em janeiro em Juazeiro do Norte, Ceará.
Animador, muito animador.
Cardeal é príncipe na longa história da Igreja Católica. Príncipe em todos os sentidos, na Idade Média, inclusive terrenos, com todas as regalias, privilégios e, principalmente, poder. Basta ver filmes ou ler algum livro sobre aquele tempo. As roupas ainda hoje usadas por bispos e cardeais são sinais e resquícios dos ares e poderes principescos de então.
Pelo que testemunham as pessoas e por seus escritos, dom Orani é simples, é comunicador, é do diálogo, virtudes que não se encontram em todas as pessoas e todos os dias. Escreve muito, expõe suas ideias, exalta as mídias sociais. Escreveu recentemente em Comunicação e Encontro: “Como pode a comunicação estar ao serviço de uma autêntica do encontro? A Igreja, no contexto da comunicação, precisa levar calor, inflamar o coração. Diante de um mundo fragmentado e cada vez mais dependente da comunicação, a Igreja quer colaborar para que a cultura do encontro entre as pessoas construa um mundo mais fraterno e humano”.
Em outro artigo — Viver a caridade fraterna —, dom Orani escreve: “Iniciamos o Ano da Caridade. A vivência deste ano deve nos ajudar para que a nossa cidade e o mundo sejam mais humanos, solidários e fraternos. Amar o próximo por causa do Senhor revoluciona a sociedade. Iremos viver e aprofundar a caridade social e a defesa da vida, alicerçados no anúncio do que Jesus nos fala, do amor ao próximo”.
Seu lema de bispo, significativo, é Ut omnes unum sint. No latim que aprendi no seminário muito tempo atrás, e que não esqueci, quer dizer: Para que todos sejam um. Como escreve Maria Clara Bingemer, “trata-se, portanto, de um bispo que vê na construção da unidade o centro de seu ministério episcopal e da sua missão pastoral. Alguém sempre trabalhando e agindo para construir a unidade”.
Se o papa Francisco, que não tem nada de príncipe, nomeou dom Orani cardeal, é porque este está do lado dos pobres e excluídos, dos jovens, como mostrou na Jornada Mundial da Juventude. E ajudará o barco da Igreja Católica, tanto em nível mundial quanto de Brasil, a que os padres, como pede o papa, estejam no meio do povo e dos pobres, a que se reconheçam e fortaleçam as CEBs e as pastorais sociais, e os leigos, reconhecidos, e toda Igreja sejam luz de justiça e fraternidade no mundo, a exemplo de Jesus.
* Selvino Heck, assessor especial da Secretaria Geral da Presidência da República, é também membro da Coordenação Nacional do Movimento Fé e Política.