No mínimo contraditórios os discursos e as ações dos governos petistas em relação ao meio ambiente. Fala-se tanto em sustentabilidade e biocombustíveis para o setor automobilístico, mas, passados 37 anos do lançamento do primeiro carro movido a etanol, os veículos que utilizam esse combustível continuam consumindo 30% mais do que os seus similares a gasolina.
Soma-se a essa disparidade o fato de que a gasolina continua tabelada – mesmo com os altos custos de importação, extração e refino da Petrobras –, enquanto o setor sucroalcooleiro tem que repassar os seus custos para o consumidor. O resultado não poderia ser outro, aumento alarmante no consumo e importação de gasolina (+185% entre 2012 e 2011, jan/set , www.anp.gov.br), o que está provocando um custo bilionário para a área de abastecimento da Petrobras – prejuízo de R$ 17,28 bilhões no acumulado do ano até setembro – e uma crise sem precedentes no setor do etanol.
Essa situação poderia ter sido resolvida quando do lançamento do Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica e Adensamento da Cadeia Produtiva de Veículos Automotores – Inovar-Auto (Decreto nº 7.819, 03/10/12), que, no fundo, não passa de mais um “pacote de bondades” com redução de impostos para a sempre protegida indústria automobilística, em detrimento de outros setores, que também necessitam de apoio para sobreviver, gerar empregos e renda.
No Inovar-Auto fala-se de inovação tecnológica, mas não há uma só palavra que exija da indústria automobilística um prazo para que a mesma renove a tecnologia dos motores flexfuel e os adeque ao consumo dos motores que utilizam gasolina. O correto seria que o governo desse incentivos para montadoras que investissem em tecnologia para melhorar a eficiência de consumo dos motores que utilizam o etanol e no lançamento dos carros 100% elétricos, já em uso em vários países.
Dou o exemplo do veículo da marca Mitsubishi, modelo i-MiEV, 100% elétrico, completíssimo – seis airbags, freios ABS e demais itens de segurança –, que com incentivos do governo, custa US$ 21.625,00, equivalente a R$ 43.250,00 nos Estados Unidos. Como bem expressou Fábio Maggion, supervisor de planejamento estratégico da Mitsubishi no Brasil (Folha, 20/10/12): “Os veículos elétricos não são os carros do futuro, são os carros do presente. Estamos prontos para abastecer o mercado brasileiro de unidades elétricas”.
No entanto, em função dos impostos e outros penduricalhos para proteger e manter a reserva de mercado para a indústria automobilística que utiliza a poluente gasolina, segundo a matéria da Folha, “esse modelo (do i-MiEV) não sai por menos de R$ 200 mil”. Sugiro aos prezados leitores que acessem o site https://i.mitsubishicars.com/, e lá encontrarão todos os detalhes desse revolucionário veículo.
Como está o Inovar-Auto, tudo continuará como antes...e haja gasolina, mais poluição ambiental e outros tantos bilhões de dólares não só para importar o combustível fóssil mas, também, para a área da Saúde curar as consequências da poluição.
As autoridades governamentais parecem desconhecer (ou não dão importância a tal fato) que, desde a criação do Proálcool, o etanol combustível substituiu até o fim do primeiro semestre deste ano o equivalente a 2,2 bilhões de barris de gasolina, com uma economia a preços atuais, da ordem de US$ 280 bilhões, e evitou lançar bilhões de toneladas de CO2 na atmosfera.
O governo, apesar de seu discurso de sustentabilidade, pelo visto não está nem um pouco preocupado com esse “pequeno” detalhe, pois o negócio é proteger a sempre privilegiada indústria automobilística e vender mais e mais carros, não importa se eles são poluentes ou não. Para ganhar votos, o governo quer dar um carro para cada brasileiro entupir as ruas e estradas cada vez mais engarrafadas, em vez de investir em transporte público eficiente.
E para dar mais uma “ajudinha” à indústria automobilística, não obstante as suas margens de lucro serem três vezes maiores do que nos seus países de origem, o governo publicou no dia 21/05/12, com vigência até 31/08/12, o Decreto nº 7.725, que reduziu (em alguns casos zerou) drasticamente o IPI sobre os veículos. Como era previsto, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) fez mais um pedido, e o governo, sempre solícito com esse setor, não se fez de rogado e através do Decreto 7.796, de 30/08/12, prorrogou a redução do IPI até 31/10/12.
Não obstante, tal pacote de bondades ter um custo (desoneração) da ordem de R$ 400 milhões por mês, a senhora presidente da República resolveu dar um belo presente de Natal para a Anfavea e durante a cerimônia de abertura do27º Salão Internacional do Automóvel de São Paulo anunciou que a desoneração do IPI para veículos seria prorrogada até o dia 31de dezembro (Decreto nº 7.834, 31/10/12).
A justificativa da presidente foi que, “se nós suspendêssemos a desoneração, provavelmente as empresas iriam aumentar os preços e recolocar o IPI em novembro e dezembro. Nós queremos que os preços continuem baixos” (www.planalto.gov.br).
Tendo em vista a declaração da presidente, faço a seguinte pergunta: qual será o novo “pacote de bondades” para a indústria automobilística manter os preços baixos após 31/12/12, quando acabar a desoneração do IPI?
* Humberto Viana Guimarães, engenheiro civil e consultor, é formado pela Fundação Mineira de Educação e Cultura, com especialização em materiais explosivos, estruturas de concreto, geração de energia e saneamento.