Decano dos professores de economia da Fundação Getulio Vargas e vice-reitor da FGV-EPGE, Escola Brasileira de Economia e Finanças, e professor do Instituto de Matemática Pura Aplicada (IMPA) Aloisio Araujo, não tem dúvidas em apontar a questão fiscal como o principal desafio do novo governo a ser eleito em outubro. E, para esse especialista em Atuária, que, em 2006, foi eleito para a National Academy of Sciences dos EUA, “a reforma da Previdência é a prioridade 1, 2 e 3 do novo governo. Qualquer que seja ele”.
Em conversa com o JORNAL DO BRASIL, Aloisio Araujo, considera que os assessores econômicos dos principais candidatos na disputa têm “plena consciência de que se nada for feito para estancar os gastos da Previdência, que hoje são 8% do Produto Interno Bruto (PIB), em pouco tempo, com o aumento da expectativa de vida, o alto desemprego e o envelhecimento da população, as crescentes despesas da Previdência vão esmagar tudo no Orçamento da União”.
Entusiasta das inovações, o professor Aloisio defende investimentos maciços em pesquisa e tecnologia e lembra que os avanços no pré-sal são resultado de esforços em núcleos de pesquisa entre a Universidade (Coppe-UFRJ) e a Petrobras. Por isso, se mostra preocupado com a restrição que o teto dos gastos pode causar “nas pesquisas da Embrapa e fronteiras da ciência como a área de medicamentos e vacinas”. Outro ponto importante é a reforma do sistema financeiro. Ele critica a resistência dos grandes bancos ao avanço das fintechs: “Os banqueiros são os novos taxistas, que não querem o avanço da competição do Uber (as fintechs)”, ironiza.
Estamos a um mês da eleição. O senhor acha que os candidatos estão abordando os mais críticos na economia que, em meio ao forte desemprego, encontra dificuldades para voltar a crescer?
Os cinco principais candidatos têm plena consciência, pelos contatos que já tive com os formuladores do plano econômico de governo, dos problemas que a economia brasileira enfrenta para superar a maior recessão da história. O principal problema é que a recessão, com o desemprego, ao reduzir a base fiscal, da arrecadação - que já vinha sido castigada por subsídios e desonerações fiscais e na folha salarial - tornou o problema do déficit público mais crítico ainda.
E por que o senhor acha que um novo governo poderia promover uma reforma mais profunda na Previdência se o governo Temer não conseguiu?
Um novo governo eleito sempre tem força para avançar em reformas. E a da Previdência é a prioridade 1, 2 e 3. Hoje ela consome 8% do PIB, Breve vai chegar a 14% e vai esmagar todas as demais contas do Orçamento Geral da União. É uma reforma que, para dar certo, não pode ser suave.
Os assessores econômicos dos candidatos concordam com o tema, que não veio ao debate?
Não veio porque é complexo e pode tirar voto. Mas os assessores têm plena consciência e são bons em ajuste fiscal. O Paulo Guedes (Bolsonaro), o André Lara Resende (Marina), o Edmar Bacha (Alckimin) e a assessoria do PT sabem disso. O Mauro Benevides, assessor de Ciro Gomes (PDT), fez um trabalho extraordinário no Ceará, recomprou dívida. Sabe fazer ajuste fiscal e lidar com o endividamento bancário, outro problema nosso.
A dívida bruta está chegando a 77% do PIB e no setor privado, empresas e famílias estão altamente endividadas. A inflação cedeu, mas os juros bancários não caem na mesma proporção da taxa básica do Banco Central (Taxa selic, em 6,50% ao ano). O que pode ser feito?
Isso não se resolve num estalo, mas com um conjunto de fatores. O principal é aumentar a competição do sistema bancário, com o crédito hoje concentrado em cinco bancos, o que prejudica vários setores e as famílias. É preciso que o Cade e os reguladores sejam mais atuantes, a começar pelo Banco Central. É preciso liberar as fintechs, de forma a permitir que surjam novas tecnologias para pulverizar a assistência financeira e reduzir custos dos spreads, que são exagerados. O Banco Central tem de abrir o mercado e depois regular e corrigir excessos. Mas os banqueiros são os novos taxistas; não querem o avanço da competição do Uber.
O senhor diria que os banqueiros não estão fazendo um papel adequado na economia brasileira?
Os bancos não aceitam conversar. Eles têm de pagar mais Impostos sobre os lucros e dividendos.
O senhor mencionou a necessidade das agências reguladores estimularem a competição no sistema financeiro. Em geral, as agências reguladoras atuam mal no país.
As agências reguladoras não podem ser politizadas como estão agora. O papel da privatização de formentar competição e eficiência no mercado depende muito da atuação rigorosa e eficiente das agências reguladoras, protegendo a competição sadia e o direito dos consumidores. O Brasil precisa voltar a estimular a eficiência do ambiente regulatório.
Como o senhor situa o Brasil na corrida tecnológica com o grupo das 10 maiores economias do qual estamos em 9º lugar?
O que me preocupa muito é a falta de ênfase em ciência, tecnologia e educação, que são instrumentos básicos para o progresso e desenvolvimento das sociedades. No Brasil, com a difícil situação fiscal diminuiu o gasto. Mas, a verdade é que gastava-se mais que o obrigatório. Ás vezes um gasto mal dimensionado. Defendo o reforço do parque de ciência e tecnologia, com a formação de mais doutores. Devemos ter obsessão por conquistar novas patentes com avanço nos núcleos da ciência de ponta. A que faz a diferença, como fez na Embrapa, na Petrobras em águas profundas, em parceria com a Coppe-UFRJ, e a área de biotecnologia e vacinas. Mesmo que não se tenha patentes, o avanço é enorme.
Mas essa área também não está ameaçada pelo teto dos gastos?
No meu curso na Columbia University e nos meus estudos em Berkely (California) me convenci de que o que leva ao desenvolvimento dos países são os investimentos em educação, ciência e tecnologia. Toda teoria econômica prova isso. Mas é preciso fazer gasto bem feito e de qualidade em educação. No Fies, os preços das mensalidades estavam muito elevados em estudos de qualidade duvidosa.