A 'obsessão' pela comunidade LGBT que pode cassar o mandato de Nikolas Ferreira
Além de tornar-se oficialmente réu na Justiça de Minas Gerais por transfobia, bolsonarista será investigado pela AGU por espalhar mentiras sobre banheiros unissex
Além de tornar-se oficialmente réu na Justiça de Minas Gerais por transfobia, dentro do inquérito que trata da exposição de uma jovem trans, de 14 anos, em um banheiro escolar de Belo Horizonte, o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) agora será investigado pela Advogacia-Geral da União (AGU), chefiada pelo ministro Jorge Messias, por espalhar mentiras sobre uma suposta liberação de banheiros unissex no ambiente escolar.
A obsessão do parlamentar pelos transsexuais e comunidade LGBTQIA+, em geral, é o que pode abreviar seu mandato na Câmara dos Deputados e, curiosamente, tornar-se a pá de cal em sua curta carreira política.
Em relação ao primeiro episódio, Nikolas ainda exercia mandato na Câmara Municipal de Belo Horizonte. A denúncia, apresentada em abril deste ano, baseou-se em um vídeo publicado pelo então vereador, em julho de 2022, no qual ele discrimina - e expõe - uma menor de idade trans que estava em um banheiro feminino de uma escola na capital mineira.
Na gravação, Nikolas se referiu à menina como um “estuprador em potencial” e chamou de “ousadia” o fato dela frequentar o banheiro do gênero com o qual se identifica.
De acordo com os procuradores, o parlamentar teria agido de forma discriminatória, razão pela qual deveria ser condenado ao pagamento de indenização por dano moral coletivo pelo crime de transfobia, além da perda do mandato na Câmara e cassação de seus direitos políticos.
“O acusado causou irreparável dano a autoestima e identidade [da adolescente], querendo fazê-la crer que a sociedade não a reconhece em seu gênero autodeclarado, que ignora sua narrativa de gênero e que a denomina de forma que não condiz com suas vivência”, diz a denúncia.
O despacho da juíza Kenea Márcia Damato de Moura Gomes, da 5ª Vara Criminal da Comarca da Capital, foi assinado na última quinta-feira (21). “Recebo a denúncia e não se vislumbra nenhuma hipótese de rejeição”, escreveu a magistrada.
Ao ser notificado sobre a denúncia, Nikolas culpou sua irmã menor de idade, que estuda na mesma escola da jovem trans e foi responsável por gravar o vídeo:
Com o recebimento da denúncia, o deputado poderá apresentar sua defesa e o processo seguirá para a fase de coleta das provas. Na sequência, o tribunal decidirá se condena ou não Nikolas pelos crimes apontados pelo Ministério Público estadual.
Desinformação sobre banheiro unissex
Em meio à acusação de transfobia, Nikolas causou nova polêmica ao propagar uma fake news, na sexta-feira (24), sobre o mesmo tema, o assombroso banheiro unissex, que virou a nova 'mamadeira de p*****' para a bancada bolsonarista.
Nas redes sociais, Nikolas e Filipe Barros (PL-PR), também deputado federal, divulgaram vídeos onde afirmam que a gestão do presidente Lula 'instituiu' banheiros unissex nas escolas brasileiras. As publicações geraram polêmica e foram repercutidas por outros atores políticos, como o senador Sérgio Moro (União-PR).
Trata-se, porém, de informações distorcidas sobre o caso. Diferentemente do que afirmam os deputados, a resolução sobre o tema partiu do Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+, órgão com autonomia para deliberar sobre o assunto, e não do Ministério dos Direitos Humanos ou do presidente Lula.
De acordo com o governo federal, "o que a resolução aponta é a garantia de uso de banheiros, vestiários e demais espaços onde haja uso de acordo com gênero de acordo com a identidade e/ou expressão de gênero de cada estudante".
No Twitter, o ministro dos Direitos Humanos e Cidadania, Sílvio de Almeida, disse que "quem usa a mentira como meio de fazer política, incentiva o ódio contra minorias e não se comporta de modo republicano tem que ser tratado com os rigores da lei. É assim que vai ser".
“Trata-se de divulgação de Fake News que claramente tem como objetivo provocar o pânico moral e expor ainda mais as pessoas LGBTQIA+ ao ódio e à repulsa social provocada pelo preconceito e pela discriminação”, escreveu o ministro. “Vale ressaltar que o Deputado Nikolas Ferreira se tornou réu pelo crime de transfobia no último dia 21, consoante amplamente divulgado pela imprensa profissional”, acrescentou Almeida.
O governo federal ainda rebateu as informações e esclareceu que "o documento não possui caráter legal ou de obrigatoriedade e nem cita banheiros unissex".
“Também não há decreto, ordem emanada de autoridade superior que determine o cumprimento de resolução sobre o tema. A resolução apenas formula orientações quanto ao reconhecimento institucional da identidade de gênero e sua operacionalização”, afirmou.
Após a desinformação, Silvio Almeida acionou a AGU, nesta sexta-feira (22), para que sejam tomadas providências cabíveis em âmbito administrativo, cível e criminal, contra os parlamentares.
Em nota, a AGU informou que recebeu o ofício:
"Diante de tais fatos, e considerando que se trata, em análise preliminar, de desinformação sobre política pública, o advogado-geral da União, Jorge Messias, determinou de imediato à Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia (PNDD) que analise o caso para a tomada de todas as medidas extrajudiciais e, eventualmente, judiciais cabíveis”, informou a AGU.