JUSTIÇA

Lava Jato: Toffoli anula todas as provas de acordo com a Odebrecht e diz que prisão de Lula foi 'armação'

Ministro do STF manda órgãos investigarem agentes públicos envolvidos com a celebração do acordo, como Sérgio Moro e Deltan Dallagnol

Por Gabriel Mansur
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Publicado em 06/09/2023 às 11:45

Alterado em 08/09/2023 às 09:19

Ministro Toffoli STF

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu anular, nesta quarta-feira (6), todas as provas obtidas por meio do acordo de leniência da empreiteira Odebrecht (hoje Novonor), homologado em 2017, que foram usadas em acusações e condenações resultantes da Operação Lava Jato. O magistrado declarou que essas provas são imprestáveis e não podem ser usadas em processos criminais, eleitorais e em casos de improbidade administrativa.

Em seu despacho, Toffoli afirma que a prisão de Lula, decorrente da Operação Lava Jato, foi, além de “um dos maiores erros judiciários da história do país”, uma "armação fruto de um projeto de poder de determinados agentes públicos em seu objetivo de conquista do Estado".

"Pela gravidade das situações estarrecedoras postas nestes autos, somadas a outras tantas decisões exaradas pelo STF e também tornadas públicas e notórias, já seria possível, simplesmente, concluir que a prisão do reclamante, Luiz Inácio Lula da Silva, até poder-se-ia chamar de um dos maiores erros judiciários da história do país. Mas, na verdade, foi muito pior. Tratou-se de uma armação fruto de um projeto de poder de determinados agentes públicos em seu objetivo de conquista do Estado por meios aparentemente legais, mas com métodos e ações contra legem", pontuou.

Toffoli acrescentou que esse foi "o ovo da serpente dos ataques à democracia e às instituições", inclusive ao STF, que foi "chocado por autoridades que fizeram desvio de função", desrespeitaram o devido processo legal, descumpriram decisões judiciais, subverteram provas e agiram com parcialidade e fora de sua esfera de competência – numa referência ao ex-juiz e agora senador Sérgio Moro (União Brasil-PR).

"Valeram-se (...) de uma verdadeira tortura psicológica, UM PAU DE ARARA DO SÉCULO 21, para obter 'provas' contra inocentes", escreveu o magistrado.

Toffoli escreveu que não quer dizer que a Operação Lava Jato, que levou Lula à prisão, não tenha investigado crimes que efetivamente ocorreram, mas que foi usado um "cover-up" (disfarce) de combate à corrupção "com o intuito de levar um líder político às grades".

Conforme o magistrado, há indícios de que as tratativas envolveram colaboração informal com autoridades estrangeiras, à margem dos canais oficiais. Isso porque, segundo ele, o acordo foi feito por meio de tratativas diretas dos procuradores de Curitiba com autoridades dos Estados Unidos e da Suíça. Além disso, os termos da leniência estabeleceram a restituição de valores, pela empresa, aos dois países.

“Dessa maneira, além de promover tratativas diretas com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos da América, bem como com a Procuradoria-Geral da Suíça, os Procuradores de Curitiba e os magistrados lotados na 13ª Vara de Curitiba avançaram para efetivamente remeter recursos do Estado brasileiro ao exterior sem a necessária concorrência de órgãos oficiais como a Advocacia-Geral da União, o Ministério das Relações Exteriores e o Ministério da Justiça e Segurança Pública”, afirmou o ministro.

Em sua decisão, Toffoli considera que as tratativas resultaram em “gravíssimas consequências” para o Estado brasileiro e para “centenas de réus e pessoas jurídicas em ações penais, ações de improbidade administrativa, ações eleitorais e ações civis espalhadas por todo o país e também no exterior”.

Nos últimos anos, Toffoli e o ministro Ricardo Lewandowski, hoje aposentado, já haviam anulado as provas em diversos processos, incluindo do atual presidente, que pôde concorrer nas eleições do ano passado. Essas decisões, contudo, valiam para cada caso. Agora, a determinação vale para todos as ações.

O ministro do STF ainda determinou que a Procuradoria-Geral da República (PGR) e outros órgãos devem identificar os "eventuais agentes públicos que atuaram e praticaram os atos relacionados" ao acordo de leniência e "adotem as medidas necessárias para apurar responsabilidades não apenas na seara funcional, como também nas esferas administrativa, cível e criminal".

A medida vale também para o Tribunal de Contas da União (TCU), a Controladoria-Geral da União (CGU), o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), entre outros.

Entenda

A decisão do ministro Dias Toffoli foi tomada em uma ação movida inicialmente pela defesa de Lula em 2020 para obter acesso às mensagens da operação Spoofing.

Essa ação tinha como relator o ministro Ricardo Lewandowski. Nesse processo, Lewandowski encerrou as últimas pendências jurídicas do petista originadas na Lava Jato, por entender que as provas usadas contra o petista (baseadas na leniência da Odebrecht) eram imprestáveis.

Diversos implicados e réus, incluindo políticos, já conseguiram estender esses efeitos aos seus casos. Alguns exemplos são o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e o ex-senador Edison Lobão (MDB).

Com a aposentadoria de Lewandowski, Toffoli assumiu a relatoria do caso. Ele continuou estendendo os efeitos iniciais sobre a imprestabilidade das provas para outros investigados, individualmente.

Agora, ele declara imprestáveis o uso dessas provas em qualquer “âmbito ou grau de jurisdição”, para todos os implicados.

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