Alexandre de Moraes rebate críticas sobre 8/1, e diz que réus tiveram 'ampla defesa'
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Fausto Macedo e Rayssa Motta - Quase um ano depois da invasão e depredação da sede dos poderes em Brasília, em 8 de janeiro, o Supremo Tribunal Federal (STF) já concluiu 30 julgamentos culminando na condenação dos primeiros acusados por atos golpistas e deve encerrar outras 29 ações penais na primeira semana de fevereiro, na volta do recesso.
A informação é do ministro Alexandre de Moraes, relator de todos os 1345 processos criminais abertos na Operação Lesa Pátria para investigar radicais apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que marcharam sobre a Esplanada dos Ministérios até o Palácio do Planalto, o Congresso e o Supremo.
Na próxima segunda, 8, o governo, militares da cúpula das Forças Armadas, parlamentares e ministros dos tribunais superiores vão fazer um ‘ato democrático’ em Brasília para marcar o primeiro ano do ataque dos vândalos.
“O STF demonstrou a força, a coragem e a independência do Poder Judiciário brasileiro na resistência à tentativa de golpe e nos atentados antidemocráticos”, declarou Moraes nesta quarta-feira, 3, à reportagem do Estadão.
Alexandre de Moraes faz um alerta àqueles que, eventualmente, ainda queiram escolher a trilha dos intolerantes do 8 de janeiro. “A democracia é intocável e o STF não permitirá qualquer tipo de impunidade.”
Ele enfatiza. “As Instituições mostraram sua maturidade e fortaleza, defendendo a Constituição, a democracia e o Estado de Direito.”
Na avaliação do ministro, o STF agiu ‘com celeridade e eficiência’ para responder aos ataques. Foram mais de 1300 prisões em flagrante, posteriormente convertidas em prisões preventivas, com as respectivas audiências de custódia.
Ele rechaça argumentos de advogados que alegam não terem oportunidade para fazer uma defesa completa, sem restrições. “Foi garantido o devido processo legal e a ampla defesa”, afirma. “Todos os presos tiveram imediato acesso a um magistrado.”
Ao longo de 2023, a Polícia Federal executou 22 fases da Operação Lesa Pátria, que mira golpistas que não aceitaram o resultado das urnas em 2022. O Plenário do STF recebeu, até o momento, 1345 denúncias criminais da Procuradoria-Geral da República. Ao todo, foram 1413 denunciados. O número ainda pode aumentar com o avanço das investigações, sobretudo em relação aos financiadores dos protestos violentos. Até o momento, apenas um empresário de Londrina (PR) foi acusado de custear a viagem de manifestantes a Brasília, com o pagamento de quatro ônibus fretados, mas outros estão na mira do Ministério Público. As apurações correm em sigilo.
Moraes lembra que a instrução processual de todos os 232 casos mais graves denunciados pela PGR, ‘aqueles em que os réus invadiram e destruíram a sede dos Poderes’, já foi encerrada.
Até aqui ocorreram 30 julgamentos com decisão condenatória pelo Plenário do STF - o primeiro condenado foi Aécio Pereira, que pegou 17 anos de prisão, pena ‘padrão’ para acusados do 8 de janeiro. Outras 29 ações penais estão em julgamento e serão concluídas na primeira semana de fevereiro.
“Os julgamentos das demais 139 ações penais pelos crimes mais graves, dos réus que invadiram e destruíram a sede dos poderes, serão encerrados até final de abril, com 15 ações penais pautadas todas as semanas”, informa o ministro.
Os crimes mais graves são investigados no inquérito 4922. Os réus foram acusados formalmente pela PGR por cinco crimes - associação criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça, com emprego de substância inflamável, contra o patrimônio da União e com considerável prejuízo para a vítima e deterioração de patrimônio tombado, em concurso de pessoas e concurso material.
O cerco aos radicais não acabou, avisa Moraes. “A Polícia Federal e a PGR continuam investigando os financiadores, contra um deles já houve denúncia, inclusive, e também os instigadores, divulgadores e, principalmente, agentes públicos e autoridades civis e militares que participaram por ação ou omissão na tentativa de golpe de Estado e atentado contra os poderes constituídos.”
“Todos os responsáveis serão processados e punidos na medida de suas culpabilidades”, afirma ao Estadão.
Há quatro inquéritos principais em curso sobre os atos do dia 8 de janeiro. Além do 4922, o mais avançado, que mira os extremistas que participaram diretamente dos atos de vandalismo, a PGR também investiga os financiadores da manifestação, que custearam a viagem de radicais a Brasília, os ‘autores intelectuais’ do 8 de janeiro, que incitaram os manifestantes, sobretudo com pautas antidemocráticas e fake news nas redes sociais, e autoridades públicas que podem ter incentivado os golpistas ou falhado para impedir a invasão da Praça dos Três Poderes. Sete oficiais da Polícia Militar do Distrito Federal, incluindo o ex-comandante da corporação, Fábio Augusto Vieira, chegaram a ser presos preventivamente, mas depois foram colocados em liberdade provisória.
Bolsonaro é um dos investigados. A PGR avalia se ele instigou seus apoiadores contra as instituições e a não aceitarem o resultado da eleição. Uma das provas é o vídeo publicado pelo ex-presidente no Facebook, dois dias após as cenas de vandalismo em Brasília, com teorias infundadas sobre a segurança das urnas. A postagem foi apagada minutos depois. Em depoimento à Polícia Federal, ele afirmou que estava medicado e que queria assistir o vídeo e não publicá-lo em seu perfil. Um impasse na recuperação da publicação opõe a defesa e o Ministério Público. A Meta, empresa que administra o Facebook, informou ao STF que não tem meios para acessar publicações deletadas pelos usuários. A PGR conseguiu uma cópia em um site alternativo, mas os advogados de Bolsonaro alegam que a prova não é válida. A palavra final cabe a Moraes.
Os inquéritos vinham sendo conduzidos pelo subprocurador Carlos Frederico Santos, que entregou o cargo em dezembro, após a aprovação e posse de Paulo Gonet no comando da PGR. O novo procurador-geral pode escolher assumir as investigações ao invés de delegar a coordenação dos processos do 8 de janeiro a um auxiliar. Os casos começaram centralizados no Grupo Estratégico de Combate aos Atos Antidemocráticos, criado na gestão de Augusto Aras.