JUSTIÇA

ENTREVISTA - Angela Kimbangu, candidata a vice-presidente da OAB-RJ, que é filha de lavradores

Ela está na única chapa com integrantes negros, contou um pouco de sua história na profissão e falou sobre racismo

Por JB JURÍDICO com Revista Fórum
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Publicado em 08/11/2024 às 08:57

Alterado em 08/11/2024 às 08:57

A advogada Angela Kimbangu Foto: divulgação

Única chapa com componentes negros em sua formação, a "Chapa 3 - Reviravolta", uma das que disputam a presidência da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio de Janeiro, tem como candidata a vice-presidente a advogada Angela Kimbangu. Presidente da Associação Preta Carioca, Angela é filha de lavradores do interior do Estado do Rio de Janeiro e tem sua atuação pautada na "militância da advocacia", como costuma dizer.

Comprometida com a advocacia preta, pobre e periférica, Angela Kimbangu relembra os episódios racistas que já sofreu e acredita que ter mais profissionais negros na advocacia é fundamental para a democracia. "A chapa 3 tem o compromisso de olhar para esses profissionais, pobres, pretos e periféricos, que não têm tradição na advocacia", afirma.

Confira a entrevista:


Na sua opinião, qual a importância de termos uma chapa com uma mulher negra?

É importantíssimo termos uma chapa com uma mulher negra. Principalmente depois de tantos anos de luta do povo preto, como o nosso próprio irmão Luiz Pinto da Gama, mais conhecido como Luiz Gama. É importantíssimo termos uma mulher compondo uma chapa que é plural e termos uma candidatura numa chapa onde tem uma mulher preta como vice-presidente e comprometida com a advocacia preta, pobre e periférica. Exatamente preta de base, pobre e periférica, como nós temos dentro da Associação Preta Carioca, onde estou presidente.

 

Já sofreu algum tipo de preconceito no exercício da advocacia? E fora dela?

Sim, com certeza já sofri preconceito. Já aconteceu de eu estar numa audiência, sentada no local correto, onde fica o advogado, começar a audiência e o juiz me perguntar "Quem é a senhora?". Só que eu sou uma advogada que me posiciono. Isso não me para. Pelo contrário, me dá forças para continuar e firmar o meu pé. Porque isso não é hierarquia do juiz nem do Ministério Público. Não deixo nenhum juiz me subestimar nem subjugar. Porque eu acredito na força da advocacia, na importância de se posicionar. Eu entreguei a carteira ao juiz e falei “Advogada, excelência, boa tarde” e seguimos.

 

Qual o diferencial da Chapa 3?

O diferencial da Chapa 3 é exatamente sua composição, que é plural, e que abraça e tem a pretensão de abraçar toda a advocacia do Estado do Rio de Janeiro. A advocacia da cidade do Rio, como a de Itaboraí, a de São Gonçalo, Santa Cruz, Madureira, Barra da Tijuca, Botafogo... É uma chapa formada por militantes na advocacia e não de advogados que estão dentro do escritório encastelados que sequer conhecem a senha do seu token. Diferente disso, a Chapa 3 é aquela formada por advogados que conhecem a senha do seu token.

 

Dentro da sua história de vida e essência, qual a importância de termos mais profissionais negros na advocacia? E qual a importância disso para a democracia?

Ter mais profissionais negros é fundamental para a democracia. Porque, se a gente parar para pensar, com o advento das cotas, a advocacia será cada vez mais preta, pobre e periférica. Porque os pretos, que são pobres também, e moram na periferia, conseguem passar no Enem, entrar numa universidade, concluir o curso, fazer a prova da Ordem, passar e se tornar advogado. Ao que pese, eu não sou das cotas, mas defendo. Sou uma defensora.

Até nesse sentido, a chapa 3 tem o compromisso de olhar para esses profissionais, que não tem tradição na advocacia. E muitas vezes não querem estar dentro da Ordem. E eu os convenci, explicando que era importante estarmos dentro do nosso órgão de classe, porque nós também somos advogados e também queremos o respeito de toda advocacia.

 

Fale um pouco mais de você, da sua história de vida e de como se tornou advogada

Eu me tornei advogada porque minha família passou por uma situação complicada de desrespeito e aquilo nos humilhou muito. Sou de uma família de lavradores da terra de São Sebastião do Paraná, em Cantagalo. Uma pessoa estava errada, entrou dentro da nossa casa, nos humilhou e meus pais escutaram, não colocaram a pessoa para fora. Ali eu vi o quanto aquilo foi duro e nos humilhou e eu decidi estudar Direito. Numa época que isso era impossível para mim. Na época, eu ouvi "você vai fazer Direito?" E riram de mim. Só que hoje eu estou aqui, né? Para quem quiser ver. Minha intenção, ao escolher o Direito, era defender a minha família para que eles nunca mais passassem por aquele tipo de humilhação.

 

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