MEIO AMBIENTE

Instituições ambientalistas assinam Manifesto em Defesa do Sistema Nacional de Unidades de Conservação

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Por JB AMBIENTAL
redacao@jb.com.br

Publicado em 30/03/2025 às 13:10

. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Na quinta-feira (27), representantes de 68 entidades de preservação ambiental como SOS Mata Atlântica, SOS Pantanal, Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem (SPVS), Rede Nacional Pró-Unidades de Conservação (Rede Pró-UC), Associação Onçafari e Instituto Arara-Azul, entre outras, entregaram à Marina Silva, ministra de Estado do Meio Ambiente e Mudança do Clima do Brasil, e à direção do ICMBio, o Manifesto em Defesa do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC).

O documento, que também conta com a assinatura de 48 personalidades da sociedade civil engajadas com iniciativas de defesa socioambiental, expressa preocupação com decisões recentes do governo federal que têm enfraquecido a preservação das Unidades de Conservação de Proteção Integral (UCs) a partir da emissão de termos que permitem o uso das UCs para fins pessoais, contrariando a Constituição Federal e prerrogativas do próprio SNUC.

Citando como exemplo a tentativa recente de acomodar um número indeterminado de famílias de comunidades indígenas em uma área de 6,7 mil hectares da Reserva Biológica Bom Jesus, no Paraná, o manifesto dá ênfase às políticas públicas conjuntamente promovidas pelo ICMBio e a Funai, com destaque para o potencial nocivo decorrente da ocupação de territórios de conservação e a permissividade de atividades incompatíveis com a preservação, como a caça de espécies ameaçadas.

Ressaltando apoio total às causas dos povos originários e reiterando a necessidade de implementações de UCs e TIs, os signatários defendem que propostas como as que são alvo do manifesto, ineptas pela sobreposição de interesses, além de não atender aos propósitos de proteção integral das UCs e TIs, não contribuem para o pleno domínio de comunidades indígenas em áreas especialmente delimitadas para esta finalidade.

Para o ex-deputado federal constituinte e ambientalista Fabio Feldmann, signatário do manifesto e um dos criadores da Lei da Mata Atlântica e do decreto que sancionou a existência do SNUC, áreas preservadas, como UCs e TIs, podem ter seus atributos gravemente comprometidos com a implementação de atividades econômicas desprovidas de estudos que possibilitem o fomento de iniciativas sustentáveis.

“A Constituição Federal trata Área Protegidas, de uso restrito ou comunitários, assim como Terras Indígenas, como categorias distintas. E é com muita preocupação que vejo as práticas em curso no ICMBio, que não está respeitando o texto constitucional brasileiro. Quando tratamos de áreas de proteção ambiental, principalmente as de proteção integral, atividades que podem comprometer seus atributos devem ser vistas com muito cuidado", adverte Feldmann.

Entre as principais reivindicações destacadas no manifesto, o documento defende a preservação rigorosa das Unidades de Conservação, com a exigência de que o Governo Federal respeite os objetivos das UCs de Proteção Integral, sem abrir precedentes para sua ocupação ou exploração. O documento destaca, ainda, a necessidade de separação das funções entre ICMBio e Funai e denuncia flexibilizações que ameaçam espécies protegidas e comprometem a integridade das áreas de conservação.

 

A íntegra do documento:

"Manifesto em Defesa do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC)

27 de março de 2025

As instituições e pessoas físicas abaixo vêm a público demonstrar sua contrariedade e grande preocupação em relação a iniciativas promovidas por instâncias do Governo Federal que fragilizam a devida proteção de UCs de Proteção Integral e o direito constitucional a um meio ambiente íntegro.

Não são compreensíveis movimentos que, de formas desconexa e contraditória com compromissos estabelecidos e do próprio respeito à Constituição Brasileira e ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação, coloquem em risco as poucas Unidades de Conservação de Proteção Integral em biomas já extremamente pressionados por continuados processos de degradação e crônica falta de pessoal e recursos.

Casos como a tentativa recente de inclusão no interior da Reserva Biológica Bom Jesus, no Paraná, promovida pelo ICMBIO e pela FUNAI, numa área delimitada de cerca de 6,7 mil hectares e para acomodar famílias de comunidades indígenas, sem um limite, o que inclui práticas de caça de espécies ameaçadas de extinção dentre outras atividades incompatíveis com a categorização desta UC, representam não apenas uma abertura perigosa de precedentes como uma demonstração de pouca aderência do Governo Federal com o compromisso de proteger e de garantir o incremento da gestão de nossas UCs, cada qual dentro de suas atribuições.

Em resposta aos questionamentos feitos¹, o ICMBio usa um “jogo de palavras” para dizer que há um limite e para minimizar a questão da caça. É afirmado que “Novas admissões dentro da comunidade deverão seguir critérios internos dos Guarani Mbya e serem avaliadas pela Comissão de Acompanhamento instituída pelo TC”. Isso significa, sim, que todo aquele admitido pela Comunidade poderá ingressar na Reserva, sem limite. A Funai já deixou claro que as Unidades de Conservação Federais de Proteção Integral devem servir aos indígenas.

Quanto à caça, o ICMBio afirma: “O TC estabelece regras para a caça” e que “não há indícios de impacto ambiental significativo na fauna da Rebio desde a ocupação indígena”. Ora, estamos a tratar de espécies ameaçadas de extinção, essa discussão de “impacto” nem deveria ser aventada por um órgão que deveria proteger as UCs. O fato de ser vulnerável e ameaçada de extinção é pressuposto, por si só, para concluir que um único indivíduo caçado já impacta o pouco quantitativo de espécies. Então, o ICMBio inverteu sua lógica, desprotegendo a fauna das UCs para favorecer uma “condição imprópria para a manutenção da cultura e subsistência indígena”, sem, ao final, criarem novas TIs e nem mesmo ampliarem as áreas conservadas.

Soma-se a esse exemplo, o caso do Parque Nacional Iguaçu quando, recentemente, esta mesma premissa foi alentada. Também merecem atenção acordos tratando de UCs de Uso Sustentável, especialmente frente a possibilidades de autorização de caça de animais silvestres em seus territórios, como aventado em casos como o das Florestas Nacionais de Canela e de São Francisco de Paula, no Rio Grande do Sul.

Cabe ressaltar nosso total apoio à busca de áreas adequadas e necessárias para a consolidação e a criação de novas Terras Indígenas em todo o território nacional. No entanto, propostas de sobreposição representam tão somente um serviço imperfeito, que não atende aos propósitos nem das UCs de Proteção Integral nem do pleno domínio de comunidades indígenas em áreas especialmente delimitadas para esta finalidade. ICMBio e Funai têm missões distintas. UCs e TIs têm finalidades distintas. Esta prerrogativa, a despeito de interfaces existentes, não pode ser alterada de maneira a criar desvios de finalidade destas instituições e/ou de quem as está gerindo no momento."

Assinam, representantes das seguintes instituições, além de outras pessoas físicas:

Agencia de Sustentabilidade Mãozinha Verde, Associação de Preservação do meio Ambiente e Vida, Associação Ambientalista Copaíba, Associação dos Atrativos de Bonito e Região, Associação Catarinense de Preservação da Natureza, Associação em Defesa do Rio Paraná, Afluentes e Mata Ciliar, Associação Mico-Leão-Dourado, Associação Mineira de Defesa do Meio Ambiente, Associação Onçafari, Associação MarBrasil, Avinc, Bioflora – Tecnologia da Restauração, Centro de Estudos, Defesa e Educação Ambiental – CEDEA, Confederação Nacional de RPPNs, Divers for Sharks – Mergulhadores em Defesa dos Tubarões, Forum Brasileiro da Família Empresária, Fundação Brasil Cidadão, Fundação Ecotrópica, Fundação Museu Americano FUMHAM, Fundação Neotrópica do Brasil, Fundação Pró-Natureza, Fundação SOS Mata Atlântica, Fundação ZooFoz, Grupo Ação Ecológica, Grupo Pau-Campeche, IASB, Igré – Associação Socioambientalista, Instituto Amigos da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, Instituto Ampara Animal, Instituto Arara-Azul, Instituto Atmosfera2, Instituto Brasileiro de Conservação da Natureza, Instituto Curicaca, Instituto de Conservação de Animais Silvestres, Instituto de Estudos Ambientais Mater Natura, Instituto Floresta Viva, Instituto Homem Pantaneiro, Instituto Horus, Instituto Legado, Instituto Líbio, Instituto Mira-Serra, Instituto Onça-Pintada, Instituto Onças do Rio Negro, Instituto de Pesquisa Cananéia, Instituto de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental, Instituto Pouso Alto, Instituto Projeto Ariranhas, Instituto Purunã, Instituto Rã-Bugio para a Conservação da Biodiversidade, Instituto Reprocon, Instituto SOS Pantanal, Instituto Taquari Vivo, Observatório Justiça e Conservação, Partido Verde do Paraná, Panthera, Rede Ambiental Piauí, Rede Brasileira de Reservas Naturais, Rede Pro-UCs, Refúgio Bem Viver, RPPN Avá-Canoeiro, RPPN, RPPN Renascer, Sauá Consultoria Ambiental, SAVE Brasil – Sociedade para a Conservação das Aves do Brasil, Sociadade Chauá, Taoway – Sustentabilidade Socioambiental, União Petritense de Proteção ao Ambiente Natural, União Protetora do Meio Ambiente – UPAN.

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