Boulos é aposta de Lula para o futuro da esquerda no país

Aos 39 anos, deputado pode ser visto como herdeiro político do presidente mesmo fora das fileiras do PT

Por MARINA AMARAL

Guilherme Boulos

Em uma eleição em que a direita prevaleceu, do eterno centrão aos renovados extremistas, e a esquerda foi tida como a grande derrotada – o que não é nenhuma novidade, aliás, com a força do antipetismo que emergiu na Lava Jato –, aproveito este espaço para falar um pouco das jovens lideranças de centro e de esquerda que se projetaram nestas eleições.

Afinal, em um país em que a direita ascendeu e se radicalizou nos últimos dez anos,em um fenômeno erroneamente lido como polarização, é preciso abrir espaço para um futuro progressista. E aí estou falando da nova geração, para além de 2026, em que aparentemente ainda teremos Lula, então com 82 anos, disputando as eleições.

Para ficar nos líderes com maior destaque: além de João Campos, 30 anos, que, como esperado, conquistou a reeleição em Recife com fabulosos 75% dos votos, a chegada de Guilherme Boulos ao segundo turno e a resiliência da centrista Tabata Amaral nas eleições em São Paulo, galvanizadas pelo jovem líder de extrema direita Pablo Marçal, credenciam os dois deputados federais a sonhar com um papel político maior.

Tabata obteve mais de 600 mil votos em sua primeira disputa para um cargo eletivo e conquistou o respeito do eleitorado com uma atitude mais propositiva e educada do que os adversários homens. Aplicada, certamente aprendeu com a campanha e deveria ser mais valorizada pelo seu partido, o PSB de Campos e do vice-presidente Geraldo Alckmin. Gilberto Kassab, o cacique do PSD apontado como o grande vitorioso destas eleições, já estava de olho em Tabata quando ela saiu do PDT, em 2019, e o cacife dela sem dúvida aumentou.

Do lado da esquerda, faz tempo que o presidente Lula sacou o potencial do líder psolista e o chamou para junto de si. “Boulos tem 35 anos. Eu tinha 33 quando fiz minha primeira greve. Você tem futuro, meu irmão”, disse o então ex-presidente, em frente ao Sindicato dos Metalúrgicos naquele 7 de abril de 2018. Horas depois, Lula se apresentaria voluntariamente à Polícia Federal de Curitiba, para cumprir o primeiro dos seus 580 dias de prisão, decretada pelo então juiz Sergio Moro.

Naquele momento, o gesto do presidente ao deputado, que, como ele, tem origem no movimento social, tinha a força do legado político. Revendo as fotos daquele dia, salta aos olhos a escolha simbólica de dois jovens, pré-candidatos à Presidência que não eram do seu partido, para reafirmar a fé no futuro: Boulos, do PSOL, e Manuela, candidata do PCdoB, a quem Lula abraçou logo depois da frase dita a Boulos.

Imagino a ciumeira no PT.

Agora, a eleição em São Paulo é uma grande oportunidade para Guilherme Boulos com uma grande vantagem para o psolista: pesquisas e analistas indicam que o mais provável é que a mediocridade do atual prefeito, turbinado com recursos e máquina política, vença o segundo turno. Se perder, não decepciona; se ganhar, faz milagre e desponta como a maior liderança jovem da esquerda no país. Sob as bênçãos do presidente Lula, que deve se envolver mais no segundo turno da campanha.

Não é o que se espera, mas Boulos pode surpreender. Nunes tem muitas fragilidades – de acusações de corrupção e favorecimento de amigos ao caso de violência doméstica contra a esposa. Os que recordam do abandono da cidade durante os três anos anteriores à campanha, como expôs principalmente Tabata, durante os debates, só o reelegem se a rejeição ideológica a Boulos for maior. E, nesse campo, a briga com Pablo Marçal não o favorece. Os eleitores do ex-coach não são exatamente guiados pela razão. Sabe-se lá o que farão.

Além disso, o deputado do PSOL já conseguiu um grande feito anterior, nas eleições municipais de 2020, quando chegou ao segundo turno mesmo não sendo o único candidato da esquerda. Perdeu para Bruno Covas, herdeiro do PSDB que dominou São Paulo por décadas, mas dobrou a votação entre o primeiro e o segundo turno.

E o candidato ainda tem lenha para queimar nesta eleição, em que deveria ter chegado no primeiro lugar no primeiro turno, não fosse a confusão dos números de PT e PSOL; sem falar nas fake news de Marçal.

Seja qual for o resultado final da eleição, Boulos pode reforçar a sua liderança também dentro do PT, que até o momento não conseguiu apresentar novos nomes com cacife eleitoral e teve que reconquistar uma veterana que votou no impeachment de Dilma para ser a vice na chapa encabeçada pelo PSOL.

A renovação de lideranças é uma boa notícia para o campo progressista, que, se não brigar entre si e souber conviver com o centro, como faz o presidente Lula, pode superar a direita, que sai destas eleições fortalecida, mas dividida. Do contrário, o que nos espera é uma nova expansão da direita como promete a união entre Kassab e Tarcísio de Freitas.

 

Marina Amaral é diretora da Agência Pública