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A fronteira tecnológica das 'Deep Techs'

Por FERNANDO PEREGRINO

Publicado em 20/12/2024 às 13:12

Alterado em 20/12/2024 às 13:12

A formação econômica do Brasil possui características restritivas próprias que o tornaram um país periférico, exportador de matérias-primas para países industrializados.

É um alento que tenhamos iniciado, no governo do presidente Lula, com a Nova Indústria Brasil (NIB), sua transformação econômica, tecnológica e industrial.

Da periferia, em direção ao centro do país, já tendo alcançado maior crescimento do PIB industrial, menor taxa de desemprego e o maior investimento em P&D pela FINEP, ainda há muito a ser feito.
Temos características criadas que podem ser aproveitadas para superar essa condição.

Contamos com um robusto parque científico, formado por universidades responsáveis por 95% da produção de conhecimento, de acordo com dados da Academia Brasileira de Ciências (ABC).

Dispomos de laboratórios de ponta e pesquisadores de alto nível que atuam em áreas avançadas como biotecnologia, novos materiais, inteligência artificial e fontes de energia limpa. O fenômeno das "deep techs" surge como uma oportunidade para ajudar a mudar a configuração da nossa indústria.

As "deep techs" são ferramentas de inovação aberta, "startups" baseadas em investigação científica apoiada por patentes, que atuam com inovação complexa e lidam com questões como o tratamento de doenças, mobilidades, aquecimento global e desenvolvimento industrial.

São chamadas de “a nova fronteira tecnológica”, devido à proximidade com a produção de conhecimento científico.

Quando se usa o termo "deep techs", é para falar de empresas e tecnologias que desenvolvem produtos ou serviços com base em pesquisas científicas tecnológicas recentes.

Essas empresas têm potencial para criar soluções disruptivas em áreas como inteligência artificial, biotecnologia, computação quântica e energia limpa, nas quais o Brasil precisa alcançar domínio.
A importância desse setor é evidente no aumento dos investimentos globais em "deep techs", que quadruplicaram, entre 2016 e 2020, com previsão de atingir US$ 200 bilhões em 2025, consolidando seu papel no cenário econômico.

O Brasil é o 13º maior produtor de ciência do mundo, mas ocupa apenas a 50ª posição no Índice Global de Inovação.

Isso revela que, embora o país produza conhecimento científico, ele não se traduz em inovação.

Apesar de uma capacidade de engenharia respeitável, esta foi enfraquecida por duas ondas de choque: as políticas liberais de privatização e o impacto do Lavajatismo. Além disso, o Brasil é rico em matérias-primas essenciais para semicondutores, baterias, motores elétricos, mas continua a exportá-las em estado bruto para adquirir produtos manufaturados a preços entre 100 e 1.000 vezes superiores ao valor original.
Um estudo da Emerge, de 2024, revela que existem no Brasil 875 "deep techs", das quais 32% atuam em saúde humana e 27% no agronegócio e saúde animal. E que, outras estão focadas em energia limpa, meio-ambiente e áreas estratégicas. Com sua produção científica concentrada nas universidades, o país tem enorme potencial para fomentar essas "startups" como motores de inovação.

Entretanto, a dificuldade de acesso aos recursos, muitas vezes agravada pela burocracia nas agências públicas, torna essas empresas vulneráveis a aquisições por investidores estrangeiros. Isso resulta em uma dupla perda para o país: o esvaziamento do patrimônio tecnológico e o aumento da dependência de produtos importados de alto valor agregado.

Como reverter esse cenário? Para mudar essa realidade, o Brasil precisa investir na integração, ainda insuficiente, de seu sistema de políticas públicas para fortalecer o ecossistema de "deep techs".

É necessário, primeiro, racionalizar o sistema regulatório, qualificando linhas de financiamento, e utilizar largamente o poder de compra do governo, que corresponde a quase 12% do conhecimento.

Também é preciso incentivar a criação de "startups deep techs" dentro das universidades, construir laboratórios cooperativos para uso compartilhado, alinhar os desafios dessas empresas às missões da Nova Indústria Brasil (NIB), em áreas como saúde, bioeconomia, inteligência artificial e transição energética, e, ainda, utilizar o poder das encomendas tecnológicas e compras públicas, para estimular a demanda por inovações locais, e fomentar o capital privado, criando fundos com investidores para complementar os recursos públicos e reduzir a dependência de capital estrangeiro.

Recentemente, as principais agências de fomento — BNDES, FINEP, Sebrae — e entidades representativas do ecossistema, como CNI, CGEE, ABDE, ABIPTI, ANDIFES, ANPROTEC, CONFIES, CONFAP, entre outras, firmaram um protocolo de intenções para constituir um grupo de trabalho, com o propósito de formular uma proposta de política pública nacional para as "deep techs" e evitar que percamos essa janela para a industrialização.

O presidente da FINEP, Celso Pansera, e os demais presidentes das entidades parceiras que assinaram o Protocolo, assim como suas equipes técnicas, já estão construindo o elo que faltava para essa integração multi-institucional, como, por exemplo, novos mecanismos financeiros, permitindo que as "deep techs" ajudem a alterar a configuração da inovação no Brasil como requer a Nova Industria Brasil do atual governo.

 

Fernando Peregrino. Chefe de gabinete da presidência da Finep e vice-presidente do Clube de Engenharia.

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