A cultura e você
Quando eu era criança, havia uma brincadeira que consistia em questionar quem foi criado primeiro: a galinha ou o ovo. Eu acredito que foi a galinha, mas talvez, para os geneticistas, tenha sido o ovo.
Brincadeiras à parte, a minha intenção neste artigo é refletir sobre o comportamento humano. O que afeta mais o comportamento: o temperamento ou o ambiente?
De acordo com vários estudos científicos, o comportamento humano é uma função do ambiente. E, se pararmos para pensar, é fácil entender que nossa maneira de agir varia em uma praia, por exemplo, comparativamente a como seria em um museu.
Se essa constatação é tão evidente, por que ainda nos preocupamos tão pouco com a construção de ambientes mais saudáveis no trabalho?
O Brasil ocupa o quarto lugar no ranking de trabalhadores que sentem mais tristeza e raiva na América Latina, segundo o relatório State of the Global Workplace, divulgado pela consultoria Gallup.
A pesquisa revela que 46% dos trabalhadores brasileiros estão estressados, 25% estão tristes e 18% sentem raiva no trabalho cotidianamente. Os primeiros colocados no ranking, quando o assunto é estresse, são: Bolívia (55%), República Dominicana (51%), Costa Rica (51%), Equador (50%), El Salvador (50%) e Peru (48%).
O ambiente afeta o comportamento, e o comportamento é modificado pelo ambiente. Um estudo apresentado por uma universidade norte-americana demonstrou que a cultura organizacional afeta mais o comportamento do indivíduo do que a cultura social.
O experimento foi realizado com um grupo de pescadores que trabalhavam juntos e outro grupo de pescadores que trabalhavam rotineiramente em seus barcos, separadamente. Após algumas atividades, notou-se uma propensão muito maior à colaboração e ao trabalho em equipe nas pessoas que já trabalhavam juntas, em comparação com aquelas que pescavam de forma isolada.
Dentro deste experimento, foram convocadas as esposas e familiares dos pescadores de ambos os grupos para verificar se havia correlação entre as atitudes deles e a cultura familiar. O interessante foi que se constatou um impacto maior da cultura organizacional do que da cultura vivida dentro da família.
Se somos tão impactados pela cultura organizacional, e se a levamos para dentro de nossas casas e ambientes familiares, por que não cuidar mais dela?
A cultura empresarial é constituída basicamente por três pilares: missão, visão e valores de uma organização. A missão determina o propósito da existência da empresa; a visão delineia os sonhos almejados e as conquistas desejadas; e os valores são os princípios que fundamentam e sustentam todas as entregas da instituição, hoje e no futuro.
Parece bonito e até poético, mas, no dia a dia, o complicado mesmo é colocar todo mundo na mesma página. Quanto mais uma empresa cresce, mais desafiador é cuidar de sua cultura.
Empresas pequenas, em grande parte familiares, têm a cara do dono. E as empresas grandes, multinacionais, têm a cara de quem?
É comum termos várias culturas em uma mesma empresa, com cada liderança apresentando suas características. Contudo, para o fortalecimento da instituição e sua longevidade, isso pode representar uma ameaça.
A era tecnológica trouxe à tona uma maior relevância para a cultura organizacional, por questões de reputação e identidade.
O que precisamos edificar é um relacionamento saudável com os times e as lideranças, balizado por conversas constantes, francas e consistentes.
Pessoas saudáveis e amigas constroem ambientes agradáveis e facilitam o caminho para a obtenção de resultados surpreendentes.
Recentemente, estava lendo um livro muito interessante que abordava a diferença entre burnout e boreout e os danos que ambos causam às pessoas, empresas e à sociedade.
O burnout é um esgotamento, infelizmente já conhecido. O boreout, que vem do inglês bored (entediado), é a expressão utilizada para colaboradores "mornos", aqueles que não são nem frios nem quentes: enfadados, enjoados, chateados, desentusiasmados.
O antídoto para esse "veneno" seria oferecer às pessoas atividades nas quais elas possam utilizar suas forças, florescer com autonomia e senso de pertencimento.
Isso só será possível com interesse genuíno pelas pessoas!
Se a galinha nasceu primeiro ou não, a gente pode continuar brincando, mas, quando o assunto for o comportamento das pessoas em um ambiente de trabalho, vencerá quem tiver mais atenção às respostas.
Cristiana Aguiar. Economista - Especialista em Gestão Empresarial e de Pessoas. CEO da Jeito Certo Consultoria. Membro no Conselho Empresarial de Gestão de Pessoas e Desenvolvimento Organizacional da ACRJ.