POLÍTICA
Indicado por Bolsonaro, Mendonça vota contra derrubar indulto a Daniel Silveira e admite 'lado ideológico'
Por GABRIEL MANSUR
[email protected]
Publicado em 04/05/2023 às 21:05
Alterado em 05/05/2023 às 12:49
O ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou contra a anulação do indulto concedido pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL) ao ex-deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado pelo STF em abril do ano passado por estímulos a atos antidemocráticos. Indicados pelo ex-chefe do Executivo à Corte, Mendonça e Nunes Marques foram os únicos contrários a invalidar o perdão da pena, mas foram votos vencidos. Com seis votos a dois, o STF formou maioria para derrubar a medida.
Nomeado por Bolsonaro em julho de 2021 por ser "terrivelmente evangélico", André Mendonça foi o primeiro a votar nesta quinta. Ele chamou atenção ao admitir que o ex-parlamentar é "alguém próximo a mim ideologicamente". Reforçou que, após a condenação de Silveira, "surgiram vozes dizendo que a pena teria sido excessiva". Por fim, disse que, pelo "contexto daquele momento", a "concessão da graça também teve um efeito de pacificação, ainda que circunstancial e momentâneo".
O ministro considerou que a competência conferida na Constituição para a concessão do perdão é exclusiva do presidente da República e que a análise do Poder Judiciário sobre o tema deve se limitar a questões de legalidade do procedimento, e não aos motivos do presidente.
"Descabe ao Poder Judiciário substituir o juízo da autoridade constitucionalmente capacitada [presidente] para agir. Entendo que descabe a esta Suprema Corte promover análise mais verticalizada acerca da existência dos apontados vícios de finalidade e abuso de poder", justificou.
Mendonça x Moraes
O ministro do STF Alexandre de Moraes ironizou o colega André Mendonça durante a sessão que formou maioria para derrubar o indulto concedido pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ao ex-deputado Daniel Silveira (PTB).
Ao proferir seu voto, Mendonça afirmou que "vozes da sociedade" defendiam a tese de que a pena de oito anos e nove meses de prisão aplicada ao então parlamentar foi muito pesada. O ministro citou uma entrevista do cientista político Fernando Abrucio ao jornal Estado de S. Paulo, na qual ele avaliou que a sentença foi "um pouco exagerada".
Moraes rebateu: "O Abrucio é jurista?", e com a negativa, o ministro continuou: "Só para que conste nos anais". Mendonça então citou o ex-deputado estadual Fernando Capez, dizendo se tratar de consultor jurídico e um "colega" de Moraes. O ministro rebateu mais uma vez: "À época, candidato a deputado pelo partido do presidente [Jair Bolsonaro, do PL]".
Por fim, Mendonça citou o jornalista Valdo Cruz, da GloboNews, e Moraes, pela terceira vez, ironiza o colega: "Também não jurista".
Nunes Marques também vota contra
O ministro Nunes Marques acompanhou Mendonça. O ministro entendeu que o Poder Judiciário pode analisar se o decreto atendeu a requisitos legais, mas não pode discutir o mérito.
"As alegações de ocorrência de desvio de finalidade, de violação dos princípios da impessoalidade e da moralidade constituem, na verdade, tentativa de exame do mérito do ato de governo de concessão do indulto, o que se demonstra claramente inadmissível à luz da Constituição Federal de 1988, tendo em vista a observância dos limites impostos pelo texto constitucional", argumentou.
Moraes, Fachin, Toffoli, Barroso e Cármen Lúcia acompanham relatora
O ministro Alexandre de Moraes, terceiro a votar, acompanhou o voto da relatora. Assim como Rosa Weber, concluiu que houve desvio de finalidade, já que as justificativas para a medida "não correspondem à realidade". Já o ministro Edson Fachin, quarto a votar, afirmou que o perdão concedido foi inconstitucional. Segundo o ministro, não há dúvidas de que o ato de concessão da graça é discricionário do presidente e um ato político.
Barroso, por sua vez, considerou que o presidente, "de forma inusitada, editou decreto de indulto no dia seguinte à decisão condenatória do Supremo Tribunal Federal, deixando claro a afronta que pretendeu fazer ao tribunal". Segundo ele, o então presidente "se arvorou na condição de juiz dos juízes".
O ministro Dias Toffoli também votou por invalidar o perdão, sustentando que crimes que atentam contra o Estado Democrático de Direito não são suscetíveis de graça ou indulto. Cármen Lúcia consolidou a maioria.
O caso
O Supremo começou a analisar o caso na sessão da quinta-feira (27), quando advogados de partidos que apresentaram as quatro ações defenderam que a medida fere a Constituição. Já a Procuradoria-Geral da República concluiu que o perdão é constitucional – mas só tem efeito sobre as implicações penais da condenação, isto é, Silveira permaneceria com os direitos políticos suspensos.
O ex-deputado foi condenado pelo Supremo, em abril do ano passado, a oito anos e nove meses de prisão por estímulo a atos antidemocráticos e ataques aos ministros do tribunal e instituições, como o próprio STF. Ele também foi condenado à perda do mandato, à suspensão dos direitos políticos e ao pagamento de multa de R$ 212 mil. Um dia depois, Bolsonaro concedeu o perdão da pena.