POLÍTICA

CPMI do Golpe: coronel preso diz que Abin avisou da invasão e que secretário interino 'foi enganado ou enganou''

Interinamente no posto, Fernando Souza Oliveira encaminhou áudio ao governador afirmando que se tratava de 'manifestação totalmente pacífica'

Por GABRIEL MANSUR
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Publicado em 26/06/2023 às 22:16

Alterado em 26/06/2023 às 22:36

Ex-chefe do Departamento Operacional da PMDF, Jorge Eduardo Naime Lula Marques/ Agência Brasil

O coronel da Polícia Militar do Distrito Federal Jorge Eduardo Naime Barreto, preso desde fevereiro por suposta omissão nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro, disse à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CMPI), nesta segunda-feira (26), que o secretário de segurança em exercício no dia da depredação da Esplanada, Fernando de Souza Oliveira, "ou foi enganado ou dolosamente enganou o governador [do DF, Ibaneis Rocha]".

Na ocasião, Oliveira ocupava interinamente o cargo de secretário de segurança, já que o titular da pasta, Anderson Torres, que também era ex-ministro da Justiça do presidente Jair Bolsonaro (PL), tinha viajado de férias para os Estados Unidos. No dia 8 de janeiro, pouco antes do ataque, Oliveira encaminhou um áudio a Ibaneis afirmando que se tratava de uma "manifestação totalmente pacífica", e que o "clima" estava "bem tranquilo e ameno".

Jorge afirma que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) avisou sobre ameaças de invasão das sedes dos Três Poderes na manhã do dia 7 de janeiro. Segundo ele, o alerta foi dado por volta das 10h em um grupo de Whatsapp que reunia representantes de órgãos de inteligência, mas não sabe dizer se Oliveira tomou conhecimento dessa operação. Naime afirmou que nenhum membro de seu departamento participava do grupo.

“Os senhores precisam ver onde essa informação chegou. Se essa informação chegou ao nível de Secretário e Comandante-Geral, eles não tomaram as providências, porque, minimamente, o Gabinete de Gestão de Crise tinha que ter sido acionado nesse momento, ou se as inteligências não passaram essas informações para o Secretário. E aí o que causa estranheza é que, nos relatórios que têm... o próprio Secretário relata que ele passa praticamente a tarde inteira informando ao Governador [do Distrito Federal] que estava tudo bem. Ou ele foi enganado ou ele dolosamente enganou o governador, passou informações erradas para o governador", afirmou.

Ainda de acordo com Naime, "se a cadeia de comando tivesse sido cumprida", ele próprio - que estava de férias desde o dia 3 de janeiro - teria sido chamado para retornar ao posto.

"Quando os senhores [senadores] lerem o relatório da Abin, os senhores vão ver que as informações foram passadas para esse grupo com precisão e com tempo possível para que fosse refeito o planejamento feito na sexta-feira. Se a cadeia de comando tivesse sido cumprida, o próprio comandante-geral [da Polícia Militar] teria me determinado voltar ao trabalho naquela própria semana, coisa que não aconteceu, eu só fui acionado no domingo [data do ataque], já às 16h. O que aconteceu? As informações não chegaram", declarou.

O coronel ainda disse que "é claro que a PM falhou no 8 de janeiro". A fala ocorreu durante questionamentos feitos pelo deputado federal Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ) sobre quem eram os responsáveis pela omissão da Polícia Militar no domingo dos ataques.

"A PM falhou, e está claro que a PM falhou. Porque ela fez um planejamento subestimado por conta das informações que foram dadas na sexta-feira [antevéspera dos ataques]. Foram diferentes das informações de sábado 10h da manhã. E ninguém chegou ao DOPE, e não chegaram à coordenação de operações as informações de 10h da manhã. Houve uma falha no sistema de inteligência do DF", afirmou Naime à CPI.

Atestado médico

Quatro horas antes do depoimento, o coronel apresentou atestado médico alegando falta de condições psicológicas para depor aos parlamentares. A CPMI desconfiou e pediu que uma junta médica do Senado analisasse a situação do policial para confirmar a veracidade do atestado. Durante a análise da junta, Naime mudou de ideia e aceitou falar à CPMI.

A desconfiança ocorreu porque, segundo Arthur Maia (União-BA), presidente da Comissão, o atestado só foi apresentado após o Supremo Tribunal Federal (STF) negar um habeas corpus da defesa do militar. Na ação, os advogados pediram para ele não comparecer à CPMI.

O ministro Alexandre de Moraes negou o pedido, determinando a ida dele ao Congresso, mas garantindo o direito constitucional ao silêncio de não responder a todas as perguntas dos parlamentares.

“Quarenta minutos depois da decisão do habeas corpus obrigando o depoente a vir, foi apresentado esse atestado médico. Diante dessa realidade, nós determinamos que o depoente viesse até o Senado para ser avaliado por uma junta médica”, explicou Maia.

No início do interrogatório, a relatora da comissão, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), perguntou o porquê de o coronel ter mudado de ideia e resolvido falar. O depoente respondeu que, por estar há cinco meses preso, as mudanças na rotina acarretam “alterações mentais”.

“Mas como já havia sido conduzido ao Congresso, já tinha sido alterada minha rotina, e como não tem nada que eu não possa declarar perante essa CPMI, ou qualquer outro órgão do Estado que me chame para depor, e como eu já estava na casa, eu espontaneamente decidi vir, mesmo não estando na melhor performance emocional que poderia estar”, explicou.

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