Quaest mostra reação sádica do mercado à isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil

Levantamento aponta altíssima desaprovação do governo Lula entre agentes do mercado, que rejeitam justiça tributária e pregam ajuste fiscal com o sacrifício dos mais pobres

Por JORNAL DO BRASIL com Revista Fórum

O ex-ministro José Dirceu diz, em entrevista ao jornal O Globo, que o mercado 'quer sangue'

Por Ivan Longo - Pesquisa Quaest divulgada nesta quarta-feira (4) mostra uma reação sádica do mercado financeiro à proposta do governo Lula de isenção do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil.

A proposta foi apresentada na última semana junto ao pacote de medidas elaborado pelo Ministério da Fazenda, comandando por Fernando Haddad, que visa cortar gastos e equilibrar as contas públicas. Para compensar a isenção do IR, a equipe econômica propôs taxar quem ganha mais de R$ 50 mil por mês e os super-ricos.

Com relação às medidas para cortar gastos em si, o governo propôs, entre outras medidas, alterações na política de reajuste salário mínimo, mudanças no abono salarial e no Benefício de Prestação Continuada (BPC), além de novas regras para aposentadorias militares e supersalários no funcionalismo público.

O levantamento da Quaest, feito apenas com agentes do mercado financeiro, revela que este setor, em sua maioria, aprova as medidas do pacote de corte de gastos, exceto uma: justamente a isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil. 85% dos entrevistados disseram que tal medida vai "prejudicar a economia", enquanto todas as outras propostas do pacote são aprovadas.

Confira:

A pesquisa mostra ainda que, após a apresentação do pacote de corte de gastos, a desaprovação do governo Lula entre agentes do mercado financeiro disparou: foi de 64% em março para 90% – mesmo patamar observado em março de 2023, ou seja, no início do mandato de Lula.

José Dirceu: mercado 'quer sangue'
Ex-ministro da Casa Civil do primeiro governo Lula, José Dirceu saiu em defesa do pacote de ajuste fiscal do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, dizendo que é a proposta possível diante da "correlação de forças atual", mas ressaltou que o mercado quer "sangue", busca antecipar as eleições de 2026 e que a burguesia brasileira não vê a "hecatombe" que será provocada no mundo com a volta de Donald Trump à Presidência dos EUA em 2025.

Dirceu afirmou, na longa entrevista ao jornal O Globo nesta quarta-feira (4), que a proposta apresentada por Haddad não precisa de correções e que o mercado quer "sangue" ao querer diminuir o crescimento do salário mínimo, Bolsa Família, Previdência e Benefício de Prestação Continuada.

"A proposta está certa nas circunstâncias atuais, na correlação de forças atual. Mas eles querem mais, querem sangue. O governo já fez a parte dele, agora a palavra está com o Congresso", afirmou, ressaltando que "se tivéssemos maioria, faríamos Reforma Tributária na renda, riqueza e propriedade", sobre a bancada progressista no Congresso, que é minoria.

O ex-ministro ainda rebateu uma pergunta capciosa do jornal da família Marinho, de que a "decisão de anunciar o pacote junto com a reforma do IR não minou o objetivo do governo" e escancarou o conluio entre mercado e mídia, que buscam atrair o governador de São Paulo, Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos), como candidato da terceira via anti-Lula em 2026.

"Por que pode diminuir salário mínimo, Previdência e Bolsa Família, que envolvem quase metade da população, e não pode aumentar o imposto para 100 mil brasileiros? É evidente que isso é inaceitável. Se querem fazer isso, eles têm que eleger um presidente que o faça ou convencer o Congresso de fazê-lo. Até as Forças Armadas aceitaram. A contragosto, mas aceitaram. A não ser que você queira desmontar o estado de bem-estar social previsto na Constituição. Então você disputa eleição e diga que quer desmontar", disparou.

Para Dirceu, o movimento especulativo mostra que "o mercado está querendo antecipar 2026" e, rebateu outra pergunta capciosa, sobre "o governo duelar com o mercado", em relação às críticas de Lula ao sistema financeiro.

"Quem duelou com o governo foi o mercado. Foi apresentada uma proposta dentro das possibilidades que o Executivo tem. Se faz a proposta do mercado, ele deixa de ser governo que foi eleito, ele praticamente trai seu programa. Estão pedindo que nós façamos haraquiri. É isso que eles estão pedindo".

Dirceu ainda alertou para a crise que será provocada com o retorno de Trump, que já prometeu aumentar a taxação de produtos estrangeiros, em especial da China, nos EUA.

"Tem que fazer aquilo que garanta o crescimento do país. Imagina se vem uma crise por causa do trumpismo, o país está em recessão", afirmou o ex-ministro, ressaltando que burguesia brasileira estaria cega diante da "hecatombe" mundial com a volta do trumpismo, que impactará a disputa presidencial no Brasil.

"Vejo o jogo aberto para 2026. Ainda é cedo para dizer o que acontecerá porque existe um fator: as medidas que Donald Trump tomará quando assumir os Estados Unidos. Dependendo da intensidade, toda a conjuntura política mundial e brasileira mudará. É quase jardim de infância o que estamos assistindo agora pelo ajuste fiscal. Fico estarrecido que a elite brasileira não se dê conta da gravidade do que acontecerá no mundo. Outros países já estão tomando medidas. O Brasil devia estar se preparando. É evidente que a crise na bolsa é um chuvisco perto da tempestade que vai ter no mundo. Se ele fizer o que ele está declarando, vai ser uma hecatombe mundial".