ô abre alas que eu quero passar

Por CLAUDIA CHAVES *

Letícia Isnard e José Karini participam da comédia "Rio 2065", em cartaz no CCBB

Carnaval. Festival. Alegria. Ribombos. Rico vira pobre. Pobre vira rico. Serpentinas, confete, alegria, música, dança, beijo, abraço. Casais que se formam, amores efêmeros, se perder na multidão. Quatro dias de folia. É a marca maior da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Expressão de nosso povo, de nossa gente, do espírito que ameniza o calor, transcende fronteiras, nosso evento maior – o desfile das escolas de samba – é considerado o maior espetáculo da terra. A comédia "Rio 2065", uma história de carnaval, comemora os 30 anos do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) e os 20 anos da premiada companhia carioca Os Dezequilibrados.

O texto afiado de Pedro Brício, dramaturgo que melhor consegue construir uma densa dramaturgia a partir de fatos históricos e aspectos culturais do Rio, vai se concentrar em uma possível homenagem aos 500 anos de fundação da cidade, em uma mistura de science fiction, chanchada pastelão, comédia, quiproquós. Assim, o carnaval, a festa da inversão, império da paródia, paraíso do sonho e do desejo, é utilizado como alegoria de nossas mazelas atuais, ao mesmo tempo que nos apresenta um duplo sentido de como o poder é capaz de matar as aspirações populares.

A direção de Ivan Sugahara coloca o bloco na rua, com todas as suas alas – as subtramas – e com os participantes – uma diversidade de personagens, com estrangeiros, replicantes, cariocas de vários quadrantes - dizendo na voz e no corpo, com falsetes, sotaques exagerados, barrigas proeminentes que dançam péssimo, cantar desafinado, fantasias descoordenadas, um clima de total farsa, como é farsesca a história, tudo improvável na própria trama, mas que, com o ritmo e as marcações, Ivan consegue um belo espetáculo no qual a risada não abafa o sentido.

O elenco formado pelos integrantes do grupo interpreta os mais variados papéis que acabam por formar um verdadeiro desfile, que vai dos tipos mais acabados e folclóricos cariocas até a personificação de fantasias populares do carnaval. Quatro integrantes do grupo - Ângela Câmara, Cristina Flores, José Karini e Letícia Isnard), se juntam a quatro convidados: Alcemar Vieira, Guilherme Piva, Jorge Maya e Lucas Gouvêa – que alterna com José Karini. E evoluem todos com muita competência, conseguindo um samba sem nenhuma atravessada, como é raro se ver, inclusive no Grupo Especial.

É a visão dos quadros que se sucedem, que se misturam, que o fio condutor é uma teia da qual saem os filamentos que vão compor os preparativos de um desfile importante. Radicaliza que o Rio deixa de ser um centro cosmopolitano e se torna um local subalterno de puro entretenimento, no qual os clássicos desmandos mudaram de eixo. É brilhante o texto, pois a comédia vêm de todos os lados. Das situações, das piadas, dos personagens atrapalhados e inadequados. É um conjunto de ondas, no qual se equilibra o público vendo o desenvolvimento da metáfora e se divertindo, entendendo que a vida do futuro é plantada hoje. Mas que a gargalhada vem da acidez do bom espetáculo.

* Professora do Depto de Comunicação da PUC-Rio e doutora em Letras

 

SERVIÇO

Rio 2065

Teatro I - Centro Cultural Banco do Brasil (R. Primeiro de Março, 66 – Centro; Tel.: 3808-2020). Qua. a seg., às 19h. Duração: 100 minutos. Classificação: 14 anos