Drummond, 120 anos; 'Tinha uma pedra no meio do caminho'. Agora não tem mais, Lula é presidente!

Nesta eleição, a democracia brasileira tinha enfrentado uma grande pedra no caminho, caso Jair Bolsonaro fosse reeleito, com todas as ameaças de regressão nas políticas sociais, ao Estado de Direito e o desprezo para com a educação e a cultura. Com a vitória de Lula, que reiterou seu compromisso pela Democracia perante o arco da sociedade que o apoiou no 2º turno, agora o Brasil não tem mais uma pedra no caminho da redemocratização. O mineiro de Itabira, hoje (segunda, 31) celebrado pelo 120º aniversário de seu nascimento, ganhou a admiração geral quando publicou, em 1928, na Revista de Antropologia, o poema 'No Meio do Caminho', sobre os obstáculos que as pessoas encontram na vida

Por Gilberto Menezes Côrtes

Por três décadas - de 1969 a 1984 - as páginas do JORNAL DO BRASIL tiveram a honra de abrigar as crônicas de Carlos Drummond de Andrade

A vitória do ex-presidente Lula sobre o presidente Jair Bolsonaro, em eleição acirrada e decidida por 2,139 milhões de votos, não representa só a garantia da democracia. Ela abre possibilidades para o resgate de sentimentos de amor e fraternidade para com os mais desassistidos da sociedade brasileira. No campo cultural, o sol volta a raiar para nos devolver o “tempo da delicadeza”.

Nada mais adequado para relembrar o tempo da delicadeza, da retomada da política no seu sentido mais amplo, de compreensão e empatia para com o outro, do que revisitar a obra do nosso poeta maior, Carlos Drummond de Andrade. O mineiro de Itabira, hoje (segunda, 31) celebrado pelo 120º aniversário de seu nascimento, ganhou a admiração geral quando publicou, em 1928, na Revista de Antropologia, o poema “No Meio do Caminho”, sobre os obstáculos que as pessoas encontram na vida.

Nesta eleição, a democracia brasileira tinha enfrentado uma grande pedra no caminho, caso Jair Bolsonaro fosse reeleito, com todas as ameaças de regressão nas políticas sociais, ao Estado de Direito e o desprezo para com a educação e a cultura. Com a vitória de Lula, que reiterou seu compromisso pela Democracia perante o arco da sociedade que o apoiou no 2º turno, agora o Brasil não tem mais uma pedra no caminho da redemocratização.

 

Drummond e o JB

Por três décadas - de 1969 a 1984 -, as páginas do JORNAL DO BRASIL tiveram a honra de abrigar as crônicas de Carlos Drummond de Andrade. O Caderno B era o seu refúgio, onde comentava fatos do cotidiano, geralmente notícias do próprio jornal, que resumia na sua visão diferenciada. Em vez de notas ou pílulas, Drummond batizou os pitacos de “Pipocas”.

Logo, o JB tratou de valorizar as pipocas mais disputadas pelos assinantes e pelos leitores que iam às bancas da esquina, com ilustrações do também mineiro, de Caratinga, Ziraldo Alves Pinto, o Ziraldo, que completou 90 anos semana passada. 

 

O enigma da pedra

Em 31 de outubro de 1987, em comemoração ao 85º aniversário de nascimento do poeta, que falecera poucos meses antes, em 17 de agosto de 1987, o Caderno B fez uma homenagem especial a Drummond publicando, como um brinde ao leitor, extensa matéria com a transcrição do poema, ilustrada por carinhosa charge de Ziraldo, que tornou-se grande amigo do conterrâneo. Drummond sacudiu as letras brasileiras quando publicou o poema “No Meio do Caminho”, que assim dizia em seus 10 versos

 

 


“No meio do caminho tinha uma pedra

Tinha uma pedra no meio do caminho

Tinha uma pedra

No meio do caminho tinha uma pedra




Nunca me esquecerei desse acontecimento

Na vida de minhas retinas tão fatigadas

Nunca me esquecerei que no meio do caminho

Tinha uma pedra

Tinha uma pedra no meio do caminho

No meio do caminho tinha uma pedra”

 

 




Livro vai reviver 'O Pipoqueiro da Esquina' 


No mês de novembro, a parceria entre Ziraldo e Carlos Drummond de Andrade vai ganhar edição comemorativa com o título de “O Pipoqueiro da Esquina”, livro lançado pelo Pasquim nos anos 1980, onde ficava patente a sintonia entre as crônicas de Drummond e as charges de Ziraldo.

Editada pela Filmes de Minas, a convite da Fundação de Artes do Estado do Rio de Janeiro (Funarj), a obra juntará cada pipoca de Drummond à charge correspondente criada por Ziraldo, revelando também o afeto e admiração entre esses dois mineiros, descritos em cartas, bilhetes e textos da época.

As pipocas de Drummond foram publicadas na coluna do escritor no JB entre 1979 e 1981. Como um pipoqueiro, que vende suas pipocas observando atentamente a vida que pulsa ao seu redor, Drummond fez um registro acurado dos fatos políticos e sociais durante esses anos, criando frases relâmpagos cheias de humor, que retratavam criticamente o país.

E as pipocas eram, para Ziraldo, “enxutas, palavra pura, contêm a crítica, a observação aguda, a análise, a contundência, a revelação, a criatividade e o humor que uma charge exata deveria ter”. E o chargista diz que simplesmente tentou fazer uma transposição de linguagem: “Dizer com a caricatura o que Drummond disse com as palavras”. E o poeta, entusiasta do trabalho de seu conterrâneo, concordou com o convite de juntar texto e traço.

Ziraldo escolheu 100 pipocas para ilustrar, mostrando em suas charges todas as influências que definiram seu traço. Mas o livro original trazia apenas as charges inspiradas nas pipocas. “O que essa edição comemorativa apresenta são justamente as frases inspiradoras e as charges correspondentes, pela primeira vez juntas”, explica Tarcisio Vidigal, diretor da Filmes de Minas Edições. Segundo ele, várias preciosidades serão oferecidas como um extra aos leitores. Originais, correspondência trocada entre o escritor e o chargista, além de textos publicados à época, serão reunidos e levados a público pela primeira vez. Um trabalho de garimpagem que Vidigal, também mineiro e amigo de Ziraldo, costuma fazer no acervo do Instituto Ziraldo para idealizar projetos criativos.

Com projeto gráfico de Adriana Lins, diretora da Manifesto Design e do Instituto Ziraldo, e capa de Gê Alves Pinto, irmão caçula de Ziraldo que também ilustrou a capa do primeiro livro, a obra deixará para sempre registrada a parceria criativa desses dois ícones da cultura brasileira. Serão 240 páginas, em formato fechado 28x28, capa dura com laminação e guardas color plus.