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Anie Welter traz ao Rio sua premiada Cia Noz de Teatro, Dança e Animação

Por CADERNO B
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Publicado em 11/10/2024 às 21:56

Alterado em 11/10/2024 às 21:56

Adaptação do livro homônimo de Eva Furnari, 'Cocô de passarinho' fala sobre moradores de uma pacata cidade sempre de mau humor, até que um vendedor de sementes inspira a mudança inesperada Foto: Fellipe Oliveira/divulgação

Anie Welter tem nome de estrangeira, a descendência materna une alemão e italiano, já a paterna resulta de união de português e índia. Anie nasceu no Itaquera, bairro da zona leste de São Paulo, de uns anos para cá, região célebre em função do Corínthians. “Gosto muito da minha história”, anima-se ao começar a contar o caminho que a levou tornar-se premiada atriz, coreógrafa, figurinista, bonequeira, dramaturga, diretora e fundadora da Cia Noz de Teatro, Dança e Animação, que nestes sábado (12) e domingo (13) apresenta o divertido “Cocô de passarinho”, às 16h, no Teatro Caixa Nelson Rodrigues, no Centro.

Adaptação do livro homônimo da consagrada escritora infantil e ilustradora Eva Furnari, a peça traz uma história recheada de humor e maestria em teatro de bonecos, que são manipulados e movimentados em corpo inteiro pelos atores. “Cocô de passarinho” conquistou o Prêmio APCA de Melhor Espetáculo de Bonecos pelo conjunto da obra que o público do Rio vai poder conferir.

Ao ouvir a história de Anie, é improvável desgostar. Parece perfil de personagem de novela. “Atualmente, Itaquera é uma potência, morei até os 21 anos lá. Sou de origem pobre, nasci na periferia e desde sempre fui apaixonada por arte, acho que é coisa de outras vidas. Tudo começou com a dança. Sabe como? Vendo TV. Achava incrível a coreografia das chacretes do programa Cassino do Chacrinha. Meu pai ficou horrorizado quando eu disse que queria trabalhar como elas”, conta a artista.


Anie Welter Foto: divulgação

O padrinho ajudou a tornar realidade o primeiro passo de Anie rumo ao sonho. Trabalhando no Carrão, bairro próximo, levava a afilhada para ter aulas no clube em que prestava serviços. Aos 11 anos, começou a ter aulas e não parou mais. “Aprendi a ir sozinha para ter aulas de balé. Entrava no ônibus e ía contando os postos de gasolina para saltar no ponto certo. O tempo passou, continuei estudando e sempre dançando. Participei de apresentações no Programa do Bozo, no primeiro programa do Gugu Liberato, tive um trio que imitava Gretchen e Madonna, não parava de trabalhar”, lembra com bom humor.

Nesse ritmo, foi fazer um curso no Centro Cultural São Paulo com Oswaldo Gabrielli, artista plástico argentino que, juntamente com o músico brasileiro Roberto Firmino, fundou o Grupo XPTO, referência mundial em teatro de animação. “Entrei no XPTO em 1988. Participei de uma oficina em que objetos do cotidiano assumiam identidade, era tudo bem inovador. Peguei um espremedor de batata e criei um taradão.Todo mundo riu. O Oswaldo era fã da Bauhaus, para ele, sempre interessou no método de trabalho a junção de várias linguagens, músicos ao vivo, artistas plásticos, atores, bailarina, que era eu. Aprendi muito ao longo dos 12 anos em que fiz parte do grupo. Viajamos por Portugal, França, Itália, Venezuela, Colômbia... Uma grande escola”, recorda.

Paralelamente, com outros companheiros de grupo, fundou a Cia Teatro de Papel, com o objetivo de investigar novas linguagens, mesma inquietação que, mais adiante, gerou a Cia Circo de Bonecos, sempre com parceiros artistas.

Até que em 2004, logo depois do primeiro filho, João Gabriel, nasce a Noz Cia de Teatro, Dança e Animação (Anie é mãe também de Isabela, de 17). Nestes 20 anos da Cia, é a primeira vez do grupo em curtíssima temporada no Rio de Janeiro. ““É a nossa primeira temporada no Rio. O fato de ser no tempo do Dia das Crianças é especial. Sobretudo, com ‘Cocô de Passarinho’, porque é uma das nossas peças mais consagradas e queridas. Também porque é uma forma de mostrar como podemos despertar para a mudança a partir de momentos inusitados. E Dia das Crianças é hora certa de celebrar a escritora infantil Eva Furnari, que tão bem faz à cabeça da gente”, afirma a diretora. Segundo ela, foi determinante para a criação da Cia Noz a vontade de elaborar espetáculos nos quais a mistura das linguagens do teatro, dança, mímica, clown, artes visuais, possa fluir. Tudo junto e misturado.

“Quando meu filho era pequeno, amava bolas de uma forma incrível. Passei a enxergar as possibilidades de escrever e desenvolver a primeira peça da Cia Noz, ‘Oras bolas’. Foi o pontapé inicial. O universo redondo foi o grande mote”, completa.

A Cia Noz de Teatro, Dança e Animação tem em seu repertório, além de “Oras bolas”, “100 + nem menos (2009), e “POP”, inspirado na pop art – Prêmio Coca-Cola Femsa de Teatro (2011 - Música Originalmente Composta); “O sonho de Maria Luísa” (2015), “Bê a Bach”, em parceria com o Grupo Furunfunfum (2016), e “Papinha”, em 2022.

“A minha história com animação se inicia quando entro para o Grupo XPTO. Me descobri muito nessa forma de confeccionar objetos e bonecos de forma manual, foi determinante para a forma como trabalho nesse momento e cada vez me apaixono mais por essa forma de estar no teatro não só de animação, mas manipulação de bonecos, teatro musical, mímica, clown, tudo isso me encanta muito”, diz.

Num momento em que se discute o excesso de uso de telas, Anie pondera que o teatro colabora de maneira inequívoca para a formação pedagógica da criança. Ou deveria. “Na educação, o teatro e artes em geral deveriam ser obrigatórios como forma de aperfeiçoamento. Se a gente tivesse mais essa atitude, porque teatro é uma atitude, seria possível tirar mais os jovens e as crianças das telas”, analisa.
Tudo em “Cocô de passarinho” é feito pelos atores da companhia. Anie é de sala de ensaio, de pesquisa, de mão na massa. Ou na espuma.

Foi durante encontros sem um tema definido que passou a elaborar com os integrantes da Cia Noz os bonecos de espuma em tamanho natural que se acoplam ao corpo dos atores. Entre momentos de dança e muito movimento de improvisação, o material ganhava novos contornos. Aprimorou a técnica, que conheceu num espetáculo gringo, e incorporou à adaptação do livro homônimo de Eva Furnari. Ao longo dos ensaios, foram surgindo conexões entre as partes.

A história pode parecer fábula, mas não envelhece. Tire suas próprias conclusões: moradores de uma pacata cidade mantêm-se fiéis ao hábito de reclamar da vida diariamente sob uma árvore. O bom é que os passarinhos se aliviam sobre os enfezados de plantão. Para não perder um dia de pessimismo, os vizinhos inventam chapéus que os protegem da artilharia vinda da árvore cotidianamente. Tudo muda quando um vendedor de sementes deixa o carro com o produto parado na praça. Era o que faltava para mudar o rumo da prosa daquela gente.

Neste sábado, às 13h30, a Cia Noz de Teatro, Dança e Animação promove a Oficina de Formas Animadas, no Teatro Caixa Nelson Rodrigues. É de graça, sem pré-requisitos. As inscrições podem ser feitas através do Instagram @cianoz.

O Teatro Caixa Nelson Rodrigues fica na Avenida República do Paraguai, 230, no Centro. Informações pelo telefone 3509-9621. Ingressos a R$ 20 e R$ 10 à venda somente na bilheteria do teatro. A peça é indicada para crianças a partir de 3 anos. Sessões sábado e domingo, às 16h.

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