Baile do Menino Deus encanta e inspira gerações no Recife
Por Luiz Claudio Ferreira - O ano é 2004. No palco da Praça do Marco Zero, no Recife (PE), o Baile do Menino Deus, um Auto de Natal pernambucano, encanta os olhos do jovem Ellan Barreto. O garoto que, aos 11 anos, aprende os primeiros passos de break, se imagina cercado por todas aquelas luzes, pelos aplausos daquelas milhares de pessoas. Dentre elas, a família de sete irmãos e os amigos da comunidade em que nasceu e se criou, a Favela do Canal, no bairro do Arruda.
Vinte anos se passam e agora Ellan, com 31 anos, adota o nome artístico de Okado do Canal. Ele não saiu da comunidade e criou projetos artísticos voltados para a sua "quebrada", o "Lado Beco", com atividades de hip hop. O coletivo é PE Original Style. Agora, Okado, junto com seu grupo, estará do outro lado do Baile do Menino Deus, em cima do palco. O espetáculo gratuito será encenado de 23 a 25 de dezembro, às 20h. "As crianças vão sonhar em ter esse momento como a gente já sonhou lá atrás. E isso é uma forma também de salvar vidas", afirma o artista.
Ele disse que conheceu a dança de rua pelos dançarinos mais velhos do bairro. "A partir daí, foi paixão à primeira vista". Okado entrará em cena por volta da metade do espetáculo. "É importante que a periferia tenha essa representatividade", diz. Afinal, o "Baile do Menino Deus: Uma Brincadeira de Natal" chega este ano à sua 41ª edição e é considerado o maior espetáculo natalino do país baseado na cultura brasileira, com mais de 300 artistas.
Identidade nacional
A encenação é vista anualmente por mais de 70 mil pessoas e exibida pelo YouTube. Os dramaturgos Ronaldo Correia de Brito e Assis Lima, além do compositor Antonio Madureira, produziram um espetáculo com cantigas, danças, brincadeiras, costumes, rezas, figuras folclóricas e outras linguagens.
Ronaldo Correia de Brito entende que o espetáculo é uma celebração da identidade nacional baseada na representatividade dos povos. "O Baile é um espetáculo totalmente inspirado nessa riquíssima cultura brasileira".
Ele testemunha que a tradicional encenação ajuda na formação de artistas e de público. "Há muitos adolescentes na plateia, que dançam, que cantam e choram". O diretor disse que existe uma preocupação em trazer a tolerância religiosa. "Buscamos um sentido mais transcendente, menos materialista e consumista".
O Baile do Menino Deus
O diretor afirma que a opção por uma orquestra popular, com berimbau de lata, rabeca e viola de arco traz um sentido de inclusão para o espetáculo, regido pelos maestros Spock e Forró. Neste ano, uma das estrelas é a cirandeira Lia de Itamaracá. "No espetáculo, há artistas dos mais eruditos e sofisticados a populares das periferias em uma harmonia perfeita. Hoje, a predominância é de pessoas negras".