Crítica - ‘Noite passada em Soho’: uma viagem de sonho no tempo que vira pesadelo

Cotação: três estrelas

Por TOM LEÃO

'Noite passada em Soho', o bom Edgar Wright se perde no final

Depois de conseguir ‘estourar na América’ com seu filme anterior, ‘Baby driver: em ritmo de fuga’ (2017), que ultrapassou a soma dos US$100 milhões nas bilheterias dos EUA (e foi seu único filme rodado inteiramente lá), o diretor inglês Edgar Wright volta para casa com ‘Noite passada em Soho’ (‘Last night in Soho’), que, até o momento, vem decepcionando. Mal arrecadou US$10 milhões nos EUA até agora.

O que deu errado? Talvez ser inglês demais? O filme tem uma boa trama (menina sonhadora se transporta para o Soho dos anos 1960, magicamente, qual Alice, através do espelho); um nome que chama público no elenco (a atriz em ascensão Anya Taylor-Joy, de ‘O Gambito da Rainha’), além de Matt Smith (um dos mais populares Dr. Who recentes). E grandes nomes do passado, como Diana Rigg e Terence Stamp. Mas o que parece ter prejudicado o filme, no todo, é que a sua primeira parte (a melhor) é muito diferente da segunda, que deixa a desejar e termina mal.

No começo, viajamos juntos com a jovem e inocente Eloise (Thomasin Mckenzie, ótima), do interior para a fervilhante Londres. Todos à sua volta fazem questão de frisar, o tempo todo, que Londres é uma cidade dura, difícil. Mas ela fica deslumbrada, mesmo assim. Sobretudo quando, ao alugar quarto num antigo prédio no Soho, sem maiores explicações, se transporta para os anos 60, todas as noites, e encarna em Sandie, uma aspirante a cantora (Taylor-Joy), que, depois de ser enganada por um inescrupuloso agente (na verdade, um cafetão), é obrigada a se prostituir com senhores ricos que frequentam o nightclub onde trabalha.

Nesta parte do filme, Wright nos leva do sonho ao pesadelo, ao mostrar como a vida era difícil para mulheres naqueles tempos. O glamour era apenas fugaz. Eloise descobre isso da pior maneira. E passa a misturar a rotina de sua vida, nos dias atuais, com os problemas de Sandie. Até começar a agir como uma louca descontrolada. Aí, quando a trama guina para o terror, tudo meio que ‘degringola’ e leva o filme a um final mal ajambrado e óbvio. Que nos decepciona.

A embalagem (fotografia, cenografia, trilha sonora) é bacana. As atuações, boas (Rigg, que morreu logo depois, sai de cena por cima), as protagonistas convencem (o elenco coadjuvante, nem tanto). Mas o diretor, mais uma vez (como em vários de seus filmes, inclusive no sucesso ‘Baby driver’), não sabe acabar o que começou tão bem. Mesmo em seus melhores, como ‘Heróis de ressaca’ (‘The world´s end’, 2013), isso acontece. Mas o cara que nos deu um dos melhores filmes de zumbi, a comédia ‘Todo mundo quase morto’ (’Shaun of the dead’, 2004), e fez uma das melhores adaptações de quadrinhos, ‘Scott Pilgrim’ (2010), sempre nos dá algo um pouco além do óbvio. E isso, atualmente, é ouro. Vale a viagem.

 

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COTAÇÕES: ***** excelente / **** muito bom / *** bom / ** regular / * ruim / bola preta: péssimo.