‘Durval Discos’, de Anna Muylaert, será exibido na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
'Estou extremamente feliz com essa sessão comemorativa', diz a diretora. Filme está completando 20 anos
O filme foi lançado em 2002 no Festival de Gramado e exibido na mesma Mostra de São Paulo naquele ano. Em Gramado ganhou 7 Kikitos (entre eles, melhor filme do júri oficial e do público, além de direção, roteiro e fotografia).
A história segue Durval (Ary França), um homem de 40 anos, amante da MPB, que tem uma loja de música – Durval Discos – na casa de sua mãe, Carmita (Etty Fraser).
Um dia eles decidem contratar Célia (Letícia Sabatella) para trabalhar na loja. Inicialmente ela se mostra excelente empregada, mas logo some deixando para trás Kiki, uma menina de 5 anos. Eles julgam ser filha dela, mas aos poucos percebem que estão no meio de uma trama policial.
Desde o lançamento, o filme teve um enorme sucesso que continuou ao longo dos anos.
A sessão na Mostra de SP dia 28 será com projeção de uma cópia em 35mm (como foi exibido em 2002), e terá a presença da diretora e de membros do elenco, entre outros, Ary França, Letícia Sabatella, Rita Lee e André Abujamra.
O filme se passa no mesmo ano em que os discos de vinil começavam a deixar de ser produzidos, e mostra a mudança que a vida da cidade começava a ter, com casas sendo demolidas para dar lugar a prédios.
“Durval Discos” faz também homenagem à música brasileira dos anos 60 com diversas canções dessa época, como "London London", de Caetano Veloso, "Que maravilha", de Jorge Ben, "Madalena", de Elis Regina, "Back in Bahia", de Gilberto Gil, entre outras.
A ótima trilha sonora é de Abujamra e a produção é de Sara Silveira, Maria Ionescu, além da própria cineasta.
Muylaert, entre muitos outros, é também diretora dos ótimos “Que horas ela volta” (2015), premiado em Sundance e Berlim e do documentário “Alvorada” (2021),
A cineasta conversou com o JORNAL DO BRASILl sobre “Durval Discos”, as mudanças ocorridas no mundo desde o lançamento do filme e o significado de celebrar os seus 20 anos na Mostra de Cinema de São Paulo.
JORNAL DO BRASIL - “Durval Discos” é um clássico do Cinema Brasileiro. Quando você o realizou em 2002, qual era sua expectativa para a carreira do filme e como vê hoje todo o sucesso que ele tem tido desde então?
ANNA MUYLAERT - Quando você faz um filme, você dá o máximo de si, mas não sabe o que pode acontecer. Em 2002 quando o “Durval Discos” foi lançado, ele ia na contra mão do que estava fazendo sucesso na época, notadamente os cortes rápidos de “Cidade de Deus”, que foi lançado no mesmo ano. Então realmente eu não tinha expectativa em relação ao “Durval” que tinha planos longos e uma narrativa psicológica e sufocante. Mas como disse, era um filme muito sincero cujo roteiro foi muito trabalhado. Foram feitos muitos ensaios, tivemos uma montagem longa e detalhista sem falar no trabalho da trilha sonora que foi enorme. Então hoje posso dizer que me sinto muito feliz que o filme tenha esse reconhecimento do público e tenha tantos fãs até hoje apesar de não estar acessível em nenhum streaming – ou seja, o filme só existe na cabeça e no coração das pessoas.
Tendo em mente tudo que acontece no filme e a mensagem que ele passa, quais as mudanças mais significativas que você assinalaria e como elas afetam as pessoas atualmente?
Creio que o Durval é um filme feito com muito amor, tanto pelo cinema, como pela MPB e pelo bairro de Pinheiros. O filme foi feito em 35mm e é uma ode não apenas aos long plays mas ha toda uma forma de vida analógica que começava a morrer naquele momento. Como diz o Durval a um cliente que lhe pergunta por que ele não vende CDs: “O som pode ser melhor, mas a música não tem comparação”. Acho que todo fã do filme sente saudades de um tempo pré-digital, onde as crianças brincavam na rua e os vizinhos podiam trocar xícaras de açúcar.
Qual o significado de celebrar a data na Mostra de São Paulo, onde ele foi exibido há 20 anos e, desde então, vem mantendo o sucesso obtido na época e a sintonia e identificação com os espectadores?
Estou extremamente feliz com essa sessão comemorativa no maior festival de cinema da cidade, uma mostra que eu frequentava nos meus primeiros anos de escola de cinema e onde todos os cinéfilos da cidade se encontram não apenas para ver os filmes, mas também para tomar uma cerveja depois da sessão. A mostra, assim como o filme, é um evento de resistência a um mundo que acontece na rua e não apenas na tela do celular.