Paladinos afinam diante de Moraes

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Ministro do STF Alexandre de Moraes

Os que apostaram que o bilionário Elon Musk, dono do X (ex-Twitter), da Tesla de carros elétricos, da Starlink e da Space X, que manda satélites ao espaço e promove passeios turísticos pelo espaço de milionários, iria aparecer como um paladino do espaço sideral para enfrentar e derrotar o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, que suspendera a circulação do X no Brasil, quebraram a cara. O mundo real nada tem de Guerra das Estrelas. Nascido na África do Sul e com cidadania americana e canadense (nacionalidade de sua mãe), tem bem os pés na terra e não rasga dinheiro.

Assim como já tinha submetido sua rede X aos ditames legais da Austrália e cedeu às pressões da União Europeia, antes que o prazo de 48 horas de intimação de Alexandre Moraes para o X apresentar um representante legal no Brasil, sob pena de multas diárias de US$ 5 milhões para a rede X e as coligadas Starlink e Space X, com filiais no país, Elon Musk piscou primeiro. E mostrou que não despreza alguns milhões de dólares (necessários para cobrir os prejuízos da fábrica de caros elétricos da Tesla na China, superada pelos fabricantes locais). Comemoraram antes da hora os bolsonaristas que viram em Musk a capacidade de encontrar pêlo em ovo ou de infernizar a vida do careca.

Mas, no combate do século entre o dono do X e o Xandão, prevaleceu o xerife que faz cumprir as leis brasileiras e zela pelo Estado Democrático de Direito e no respeito aos ditames da Constituição de 1988, cuja última palavra em sua defesa provém do Supremo Tribunal Federal.

Já tinha sido assim em setembro de 2021, lembra, caro leitor? Um raivoso presidente da República, no alto de um trio elétrico, em pleno 7 de setembro, na Avenida Paulista, bradava, colérico, que não iria mais cumprir ordens do ministro Alexandre de Moraes. “Acabou”, emendou. No mesmo dia, poucas horas depois, o então presidente do STF, ministro Luiz Fux, fez um discurso duro e curto, lembrando que é indispensável o cumprimento de decisões judiciais no Estado Democrático de Direito e que deve prevalecer a harmonia entre os três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), que tem a última palavra. Se um dos poderes se sentiu contrariado, que apele ao próprio STF.

Menos de 48h depois, sentindo o risco de ser preso por desacato, um acovardado presidente Jair Bolsonaro entrou em contato com o ex-presidente Michel Temer, que era amigo de Alexandre de Moraes, a quem nomeou ministro da Justiça e Segurança Pública e o indicou para uma vaga no Supremo Tribunal Federal, com a morte, por acidente do ministro Teori Zavascki. Assim, Moraes herdou inquéritos sobre “fake News” que estavam sob o jugo de Zavascki. Numa carta de 10 pontos, o feroz Bolsonaro se comportou como um gatinho. Ou um lobo em pele de cordeiro, como se veria depois.

Na verdade, as forças bolsonaristas apostaram pesado no poder de afronta de Elon Musk. Imaginaram um paladino das estrelas, um Luke Skywalker, de “Star Wars”. Se até numa ficção como Guerra nas Estrelas há regras e preceitos, não poderia ser diferente no Brasil, na Austrália, no Canadá e na Europa.

De qualquer forma, o delírio segue presente, como externou o ex-chefe da Casa Civil de Bolsonaro, o ex-senador Ciro Nogueira (PP-PI), em entrevista à “Folha de S. Paulo” de sábado (certamente apostando na rebeldia de Musk). Entre algumas afirmações delirantes, como a possibilidade de o Supremo reverter a condenação de inelegibilidade de oito anos de Bolsonaro, ou uma emenda do Congresso alterar a decisão do Tribunal Superior Eleitoral e Bolsonaro ficar liberado para concorrer à presidência em 2026. Logo adiante diz que se não for possível, a campanha para o Senado só vai eleger (com exceção do Nordeste) políticos comprometidos com a aprovação de “impeachment” dos ministros do Supremo. É melhor Ciro descolar uma carona em um dos foguetes da Space X de Elon Musk para pôr a cabeça no lugar.

TREs precisam ‘falar’ com varas criminais

Os brasileiros que circulam em Portugal logo percebem, com pequeno esforço de compreensão do sotaque, como o Brasil está atrasado na caminhada para o mundo digital. A falta de adoção de um documento único (identidade, CPF, carteira de motorista e de segurado do INSS ou de vínculo ao SUS), além de complicações quando se precisa atestar vacinações, geram fraudes bilionárias no Bolsa Família, no Benefício de Prestação Continuada e na Previdência (aposentadorias pagas a quem já morreu, sem herdeiros credenciados, seguro-desemprego além do prazo máximo e suspensão de trabalho por acidentes ou inabilitação sem perícia adequada.

Outro problema vem na hora das eleições. Sem que os Tribunais Regionais Eleitorais troquem informações com as varas criminais e os tribunais de contas para saber quais candidatos já foram inabilitados por peculato na coisa pública ou por crimes – na realidade, a clivagem deveria ser feita pelos partidos na hora de aceitar inscrições de candidatos – tivemos a vergonhosa revelação esta semana de que há 61 criminosos, condenados, concorrendo a cargo de vereador. A maior cidade brasileira tem candidatos vergonhosos. E o 21º município mais rico do país, Paulínia-SP, que tem a maior refinaria da Petrobras, tem entre seus nove postulantes um candidato já condenado por má gestão das verbas da cidade de pouco menos de 120 mil habitantes.

O caro leitor, dirá: “o exemplo vem de cima”. Concordo, se Trump, condenado em vários processos, corre o risco de tomar novamente as rédeas de “Tio Sam” para a saga da MAGA, só Kamala Harris encarnando a princesa Leia.

Quem aposta contra as Bets?

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, precisa ordenar a vigilância redobrada da Receita Federal contra os sites de apostas, e a Polícia Federal, que parece ter puxado uma pena e já encontrou um galinheiro de lavagem de dinheiro e evasão fiscal no caso do site de apostas Esporte da Sorte, vai acabar necessitando de uma atuação dura de algum ministro rigoroso do Supremo Tribunal Federal para separar o joio do trigo na bagunça instalada no país desde que o governo Temer aprovou, em 2018, sem qualquer regulamentação posterior no governo Bolsonaro, os sites de apostas. Como o ministro Alexandre de Moraes está assoberbado, sugiro entregar a missão ao operoso ministro Flávio Dino, já entrosado com a PF.

Desde então, a jogatina corre livre e espanta como os sites – só agora o Ministério da Fazenda conseguiu enquadrá-los e estarão sujeitos às novas regras a partir de outubro – exibem seus truques de sedução no rádio, TV e internet. Mais de 100 empresas se credenciaram. Quem não cumprir as exigências e depositar R$ 30 milhões, não será habilitado. A onda das “bets” está avassaladora (programas esportivos e os clubes grandes têm sempre mais de um patrocínio de site de apostas) indicando movimentação monstruosa de recursos que já está viciando e endividando segmentos da sociedade. Desde que a tavolagem corre solta no mundo se sabe que as proporções distribuídas em relação ao arrecadado sempre favoreceram às bancas.

O escândalo que envolveu a prisão da “influencer” Deolane Bezerra, uma advogada paraibana que operava como divulgadora da Esporte da Sorte, a “bet” de um bicheiro do Recife, com ramificações de lavagem de dinheiro no Paraná e em São Paulo para remessas a paraísos fiscais – não por acaso muitos dos sites de apostas declaram registro em paraísos fiscais do Caribe (Barbados, onde Maduro engabelou Estados Unidos, México, Brasil e Colômbia, além da União Europeia, se comprometendo a realizar eleições transparentes e democráticas na Venezuela), em Malta ou ilhas do Canal da Mancha, dão todas as pistas de fraude e evasão de divisas. Mas tudo estava correndo solto até o ministro Haddad fechar umas portas. Daí surgiram os memes de Taxadd. A audácia ganhou a Times Square, em Nova Iorque.

Na gangorra dos juros, quem fica de ‘castigo’?

Quando era criança, a gangorra era um brinquedo divertido. Salvo quando do outro lado estava um(a) colega maior ou mais pesado(a) que a gente e nos deixava de “castigo” no alto da gangorra, fazendo chantagens para descer ou até mesmo nos abandonar no meio do caminho, com uma queda livre e preocupante quando o outro lado pulava fora. No mercado financeiro brasileiro, que, desde maio, sofria pressão especulativa contra o real diante do dólar, que chegou a subir mais de 10% quando o Federal Reserve adiou o início da queda de juros nos Estados Unidos, está havendo algo parecido ao efeito gangorra.

Afinal, na última quarta-feira, 18, o Federal Reserve, o Banco Central americano, baixou os juros pela primeira vez em quatro anos, com uma queda de 0,50% para a faixa de 4,75%-5,00% ao ano. No Brasil, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), que se reuniu no mesmo dia, com três horas para decidir, mesmo com a queda do dólar em quase 4,00% nos últimos 30 dias e o aumento do diferencial de juros entre o piso brasileiro (a taxa Selic, que estava em 10,50% ao ano desde maio e o piso anterior americano, de 5,50% - passou de 5,00% para 5,50%), tratou de elevar os juros por aqui para 10,75%, alargando o diferencial para 5,75% ao ano. Isso vai permitir enorme aumento do turismo especulativo com os altos juros do Brasil. Espero a divulgação da Ata do Copom no dia 24, e a divulgação do Relatório Trimestral de Inflação, com entrevista do presidente do BC, Roberto Campos Neto, e do diretor de Política Econômica, Diogo Guillen, para justificar a medida e corrigir os erros de avaliação do BC que se sucedem a cada RTI.

De qualquer modo, o mercado financeiro está comemorando um extraordinário aumento da boca do jacaré entre os juros no Brasil e EUA. O diferencial só tende a aumentar até meados de 2025, quando o piso dos juros nos EUA pode descer até 3,50%, enquanto o piso dos juros no Brasil pode subir até 12% ou 13%, como defende o ex-diretor de Política Monetária do Banco Central, Bruno Serra. Seu mandato terminou em fevereiro de 2023. Foi substituído por Gabriel Galípolo, ex-secretário geral da Fazenda e principal assistente do ministro Fernando Haddad, que forçou a baixa da Selic em agosto do ano passado, na reunião do Copom, de 13,75% para 13,25%. Metade do Copom queria baixar só 0,25%, mas Galípolo reuniu o voto de três outros diretores indicados por Lula, e seus argumentos, num colegiado dividido, levaram o presidente Roberto Campos Neto a concordar com o corte de 0,50%, para 13,25%.

Em maio deste ano, o Copom se dividiu novamente: os quatro membros indicados por Lula e liderados por Galípolo queriam baixar a Selic em 0,50%, como fora anunciado na reunião de março, mas os quatro indicados na gestão Bolsonaro tiveram o apoio de Campos Neto, sob o argumento de que o diferencial abaixo de 5,00% entre os juros do Brasil e dos UEA poderia pressionar o dólar. A Selic ficou estacionada em 10,50% nas reuniões de junho e julho, e o dólar não parou de subir. A escalada só cessou quando o presidente do Fed, Jerome Powell, anunciou em agosto que era "a hora de baixar juros”. O Fed baixou por lá e o Copom, em decisão unânime, aumentou por aqui.

Houve comemorações entre os rentistas e “traders” do mercado financeiro que apostaram na alta dos juros. Mas o setor real da economia – que é o que importa, pelo menos, nos EUA - fez o Fed acelerar o pontapé inicial de baixa dos juros para cumprir a segunda parte do seu mandato, depois do controle da inflação, que vai bem obrigado, de evitar o desaquecimento do mercado de trabalho, pois a política monetária deve também visar “o pleno emprego”. Aqui o setor produtivo protestou com veemência. Em nota, a Confederação Nacional da Indústria disse que a medida, contraproducente, vai prejudicar os investimentos em modernização e transição energética no país, e só vai esfriar a economia.

Sacrifício hoje para colher em 2025

Concordo claramente, mas quero ser realista e otimista. Não seria uma contradição? - perguntaria o caro leitor. Pois justifico: você já percebeu, caro leitor, que, desde que decidiu indicar Galípolo como novo presidente do Banco Central, o presidente Lula parou de lançar críticas a Roberto Campos Neto e ao projeto de autonomia financeira do BC? Há um claro movimento tático de não acirrar os ânimos da oposição e do mercado financeiro contra a indicação de Gabriel Galípolo, que está com o discurso ortodoxo na ponta da língua.

Galípolo precisa ser coerente até o exame de seu nome da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado e sua posterior aprovação no Plenário. O passo seguinte seria a indicação do substituto de Galípolo na importante diretoria de Política Monetária, e mais dois novos diretores para substituírem Carolina Assis, diretora de Cidadania, e Octávio Dalmaso, de Regulação, cujos mandatos expiram dia 31 de dezembro, junto com o mandato de Campos Neto. O trabalho de alta de juros, que vai custar muito caro ao Tesouro Nacional e às famílias e às empresas, aumentando a renda dos rentistas e instituições financeiras, ficaria politicamente nas costas de RCN.

Em pouco tempo, debelado o surto inflacionário (repiso: efeitos de problemas climáticos, com seca que eleva as tarifas de energia e afeta os preços dos alimentos, não se combatem com juros altos, mas com chuvas e novas safras), Gabriel Galípolo pode aplicar lógica menos radical no Banco Central para atender a meta de 3,00% de inflação anual, com tolerância de +1,50%=4,50%, e a sociedade brasileira poderá desfrutar do círculo virtuoso de nova baixa dos juros nos financiamentos bancários – com piso hoje acima de 50% ao ano!