Punhal verde amarelo com DNA do nazismo
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Virou um clássico o vaticínio de Karl Marx de que a história só se repete como farsa. Semana passada escrevi aqui que o grotesco autoextermínio de “Tiü França” com explosivos em plena Praça dos Três Poderes, em frente ao STF, onde pretendia se autoexplodir se alcançasse o plenário, ao detonar um arsenal de bombas que acabou por explodir a PEC que visava anistiar os já condenados pelas invasões e depredações das sedes dos três Poderes em 8 de janeiro de 2023 (e em última instância, abrir caminho para a revisão da inelegibilidade do ex-presidente Jair Bolsonaro por oito anos), lembrava o impacto da explosão da bomba no RioCentro. A bomba explodiu no colo do sargento do Exército Guilherme do Rosário, no Puma do tenente Wilson Dias Machado, que saiu gravemente ferido, na noite que antecedia o 1º de maio de 1981, com show de música popular promovido pelo Cebrade (Centro Brasil Democrático), no governo do general João Figueiredo, o último do regime militar.
Pois os fatos dessa semana, com as revelações da descoberta, pela Polícia Federal, da Operação “Punhal Verde Amarelo”, uma conspiração que estava em execução em dezembro de 2022, menos de 45 dias após a derrota de Jair Bolsonaro por Lula, por um grupo de militares (um general, um coronel, dois majores e um tenente coronel, além de um policial federal), que pretendia sequestrar e matar o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes, na data de 12 de dezembro, quando o também ministro do Supremo Tribunal Federal, daria posse a Lula e ao vice Geraldo Alckimin, que também seriam sequestrados e mortos, abrindo espaço para intervenção federal no TSE, assumem maior gravidade. Diante da acefalia de poder, seriam convocadas novas eleições por uma junta militar interina a ser comandada pelos generais Augusto Heleno (do Gabinete de Segurança Institucional) e Braga Neto, vice na chapa de Bolsonaro e ex-ministro da Casa Civil e da Defesa. A gravidade dos fatos levou ao indiciamento, pela Polícia Federal, de 37 pessoas, numa lista liderada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.
Também estarrecido, meu amigo Ricardo Noblat exclamou sexta-feira, no site “Metrópoles”, em seu blog: “A ditadura de 64 acabou depois de 21 anos, mas o golpismo que fazia parte do DNA dos militares continua a circular nas veias dos que um dia expulsaram Bolsonaro do Exército por má conduta”. Bolsonaro, um tenente insubordinado contumaz, e que se opunha a acatar a “distensão lenta, gradual e segura” do governo do general Ernesto Geisel, visando a redemocratização concluída no governo do general Figueiredo, foi forçado a passar à reserva como capitão, após críticas a seus superiores e ser apanhado com desenho detalhando como explodir a adutora do Guandu, que deixaria o Grande Rio sem água por vários dias. Geisel o classificava como “um mau soldado”. Pois chega a ser um ato falho, explicado por psicanalistas, a fala do filho 01, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) de que “planejar ou pensar em matar alguém não é crime”. O Exército não pensou assim e excluiu o tenente Jair Messias Bolsonaro. Quase 40 anos depois, o filho 03, deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), ainda ecoou as falas do irmão.
Na falta de argumento diante do ”batom encontrado na cueca”, chama atenção a escolha do nome da operação golpista que poderia prolongar o governo (?) de Bolsonaro, que parece ter sido inspirada na “Noite dos Longos Punhais”, o assalto de 30 de junho de 1934, há 90 anos, quando o nazismo fez um expurgo e virou um “rebanho” único, a mais feroz e cruel ditadura da humanidade de todos os tempos, chefiada por Adolf Hitler e seguida cegamente pelos nazistas alemães até a explosão da Segunda Guerra, de 1939 a 1945.
Na “Noite dos Longos Punhais”, Hitler e os asseclas Herman Göring, Henrich Himmler e Reinhard Heydrich, os chefões do partido, queriam acabar com os milicianos nazistas, os Sturmabteilung, organização paramilitar nazista conhecida como AS, ou Tropa de Assalto, de grande importância no período de ascensão nazista ao poder em 1933, sob o comando de Ernst Röhm. No assalto, enquanto aqui se usariam os “kids pretos”, força de elite do Exército, na Alemanha foram usadas diversas forças repressivas do regime (a SS, a Gestapo e a polícia secreta de Göring), embasadas em uma série de ações extrajudiciais, decretadas e executadas. Houve um massacre cruel, com centenas de mortes e prisões. Capturado Röhm, Hitler o entregou um revólver, dando-lhe dez minutos para pôr fim à própria vida. Röhm disse que caberia ao próprio Führer executá-lo. Hitler saiu e ordenou a um oficial que o fizesse.
Para rir ou para chorar
Depois das barbaridades que viriam à tona, alterno minha indignação com certa ironia diante da ginástica (dialética não cabe no caso) farsesca como os aliados e entusiastas de Jair Bolsonaro tentam minimizar o gravíssimo atentado ao Estado Democrático de Direito, que só não aconteceu em dezembro de 2022, com um final funesto, porque a sessão do STF, onde também atuava Alexandre de Moraes (o comando do TSE cabe, em sistema de rodízio, a ministros do STF – no momento a presidência é da ministra Carmen Lúcia – com o vice também do STF e ministros do Superior Tribunal de Justiça), demorou além do tempo.
Os passos de Moraes estavam sendo vigiados há semanas, e o executor da tarefa, preocupado em não encontrar táxi perto da casa de Moraes, onde seria executado o sequestro, recebeu ordem de “abortar a ação”. Os fatos mostraram que Bolsonaro sabia e autorizara a trama – mas os comandantes do Exército, general Freire Gomes, e da Aeronáutica, Baptista Junior, reagiram à proposta de golpe, e Freire Gomes ainda ameaçou prender Bolsonaro. Cabe notar que o seu vice de chapa, o general Braga Neto, incitava os executores e conclamava os apoiadores de Bolsonaro nas tropas, os acampados diante dos quartéis e as redes sociais a investirem contra os comandantes do Exército, chamando-o de “cagão”, e o da Aeronáutica.
Vejam as declarações desta sexta-feira do vice-presidente de Bolsonaro, general Hamilton Mourão, eleito senador pelo (PL-RS):
“Temos um grupo de militares, pequeno, maioria militares da reserva” [na época, muitos estavam na ativa e comandavam forças especiais] “que, em tese, montou um plano, sem pé nem cabeça. Não consigo nem imaginar como uma tentativa de golpe. Importante que as pessoas compreendam que uma tentativa de golpe precisa ter apoio de parcela expressiva da Força Armada” [Mourão não pode ignorar a reação firme dos comandantes do Exército e Aeronáutica]. “Ninguém dá golpe no país sem ter a Força Armada, nem que seja para proteger uma mudança constitucional”. E ainda emendou que "não houve deslocamento de tropa" [a PF descobriu que o plano previa deslocamento de tropas do Rio para Brasília] e classifica o plano como "um troço absurdo", uma vez que os militares "teriam armas, mas iriam executar o presidente e vice por envenenamento".
“Vejo uma fanfarronada”, prossegue Mourão. “E a partir daí, dentro de uma busca incessante de envolver o presidente Bolsonaro, o general Braga Netto, o general Heleno, que você conhece tão bem” [sim, é verdade, Heleno era ajudante de ordens na tentativa de golpe do então ministro do Exército, general Sylvio Frota contra o presidente, general Ernesto Geisel, em 12 de outubro de 1977. Frota queria derrubar Geisel por não concordar com o plano de abertura política e foi demitido por Geisel] “e que é um homem que não toma atitudes dessa natureza. Arma-se esse cenário todo, joga um pó de pirlimpimpim e shazam: saem 37 pessoas desse pacote indiciadas”.
Depois de ficar recluso desde a semana passada, o ex-presidente Jair Bolsonaro tenta agora tirar o ministro Alexandre Moraes do comando do inquérito do STF, porque era também ameaçado, como presidente do TSE, afirmando: “O ministro Alexandre de Moraes conduz todo o inquérito [estendido ao 8 de janeiro de 2023], ajusta depoimentos, prende sem denúncia, faz pesca probatória e tem uma assessoria bastante criativa. Faz tudo o que não diz a lei”, atacou Bolsonaro.
Mas o decano, do STF, o ministro mais antigo da Suprema Corte (embora não seja o mais velho), Gilmar Mendes, foi curto e sucinto ao abordar o plano de assassinato de autoridades revelado pela Polícia Federal (PF), durante evento esta semana, em São Paulo: “Qualquer tentativa de atentado contra o Estado de Direito já configura um crime consumado”.
O indiciamento dos acusados pela PF precisa passar pelo crivo da Procuradoria Geral da República, que atuaria como promotor no caso para o julgamento dos eventuais réus pelo Supremo Tribunal Federal, em julgamento na 1ª turma do STF, integrada por Moraes, Carmen Lúcia, Cristiano Zanin, Luiz Fux e Flávio Dino, uma turma durona].
O calendário apertado, com o recesso do Poder Judiciário, de 18 de dezembro até meados de janeiro, adia o indiciamento pela PGR para o começo de 2025. Ou seja, muitos dos implicados correm o risco de passar o Natal e o Ano Novo detidos, por medidas preventivas, enquanto se desenvolvem novas diligências e interrogatórios dos “kids pretos”, como o do tenente-coronel Rodrigo Bezerra Azevedo, que será ouvido nesta semana pela Polícia Federal.
Petrobras mira do Oiapoque ao Chuí
Tanto quanto as exportações do agronegócio, tônica, aliás, dos 500 anos da descoberta do país, a Petrobras ajudou a salvar o Brasil da crise da dívida externa, com a produção de petróleo e gás da Bacia de Campos (descoberta em agosto de 1974, um ano depois da primeira grande crise do petróleo) e neste século 21 com a produção do pré-sal (da Bacia de Campos e, sobretudo da Bacia de Santos, que hoje responde por 80% da produção nacional de petróleo e gás equivalente a 2,3 milhões de barris/dia). Para continuar a exercer seu papel, a estatal apresentou, dia 22 de novembro, seu plano de negócios para o quinquênio 2025-2029 e o Plano Estratégico até 2050.
Serão investidos US$ 111 bilhões até 2029, com US$ 77 bilhões em E&P concentrados no pré-sal e US$ 16,3 bilhões em transição energética e novos negócios. As estrelas da companhia são os campos gigantes de Búzios, Tupi e Mero na Bacia de Santos, que terão investimentos em 9 novos blocos. Mas a Petrobras, que vem descomissionando velhas plataformas da Bacia de Campos, no pós-sal, descobriu reservas mais fundas no pré-sal da bacia campista e vai investir em 13 blocos em águas ultraprofundas para revitalizar Albacora e Marlim Sul e em outros campos em processos exploratórios.
De todas as atividades da Petrobras, incluindo refino, transporte, gás e eletricidade e as novas diversificações (fertilizantes, petroquímicas e a transição energética), a que oferece maior taxa interna de retorno é a Exploração e Produção de óleo e gás, cuja TIR é de 22%. Como os custos líquidos por barril da Petrobras estão hoje no mínimo de US$ 6, um custo de extração de US$ 28 por barril, com o preço médio de US$ 70 dá alto retorno em 9-10 anos. O preço atual é de US$ 83 e, dado a seus baixos custos no pré-sal, a Petrobras considera alto o retorno mesmo se o barril cair a US$ 48, considerando custos financeiros e de arrendamento de equipamentos.
Entretanto, como o pré-sal é finito e tende a diminuir a produção a partir de 2030, a companhia prevê diversificar investimentos em E&P do Oiapoque, ponto extremo da Margem Equatorial, que compreende a Bacia da Foz do Amazonas, ao Chuí, ao Sul. A bacia petrolífera de Pelotas, na costa do Rio Grande do Sul, tem 29 blocos exploratórios em perfuração, dos quais 26 como operadora e controle de 70% em consórcio com outras petroleiras, e três blocos em que detém 50% na parceria com mais de um “player”.
Para a Petrobras, o petróleo e o gás são ativos que devem ser explorados ainda pelos próximos 30 anos ou mais. Por isso, a despeito das restrições do Ibama e dos ecologistas, programa investir em 15 blocos da Margem Equatorial (a prioridade é avaliar o potencial de duas descobertas na bacia Potiguar-RN), explorar blocos marítimos na Bacia de Barreirinhas (MA), outros na Bacia Pará-Maranhão) e está de prontidão para dar início às perfurações no dar início às explorações no primeiro poço em águas ultraprofundas do Amapá, no Bloco FZA-M-90) tão logo o Ibama dê a autorização.
Demanda ainda cresce em transporte
É que até 2050 o Brasil continuará avançando no uso de fontes de energia renováveis (graças à hidroeletricidade, à eólica, à solar, e aos biocombustíveis) dos atuais 53% do total da energia consumida para 65% daqui a 26 anos. No período, deve reduzir o uso de petróleo dos atuais 33% da matriz energética, para 23% em 2050. O gás natural deve manter a atual participação de 9% na matriz, com ligeira queda no uso de carvão e aumento de outras fontes.
A transição energética no Brasil é bem mais suave que o cavalo de pau que terão de dar as maiores economias do mundo (a incógnita é se Trump vai mesmo abandonar o Acordo de Paris), pois hoje o carvão, que representa 27% das fontes de energia, teria que encolher a 10%, o petróleo, que representa 30%, reduzir a 20%, e o gás natural reduzir de 23% para 18%, abrindo espaço para o avanço da participação das fontes renováveis, de 16% para 40% no total, e multiplicar por 10 o uso de outras fontes.
Mas, por aqui, neste país continental e onde a praxe é o uso de caminhão e ônibus, o uso de derivados do petróleo se fará necessário e crescente, sobretudo no transporte pesado, até 2050, enquanto a utilização de veículos elétricos ou híbridos, com motores a biocombustíveis no transporte leve deve diminuir à metade o uso de derivados de petróleo.
Quem tem razão sobre o Trump 2.0?
Embora as mudanças esperadas no governo de Donald Trump sejam significativas, a partir de 20 de janeiro, David Mericle, o economista-chefe da Goldman Sachs Research, o departamento de estudos macroeconômicos de um dos maiores bancos dos Estados Unidos, não prevê que elas “alterem substancialmente a trajetória da economia ou da política monetária”. A Goldman espera que o Federal Reserve continue a reduzir os “fed funds” a uma faixa terminal de 3,25-3,5% (a atual é de 4,5% a 4,75%).
Há diferença substancial de meio ponto percentual em relação ao patamar de redução dos juros americanos pelo Federal Reserve em 2025, que pode poder determinar aumento maior ou menor do piso de juros no Brasil – a taxa Selic, que hoje está em 11,25% e deve subir a 11,75% ao ano na reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central, em 11 de dezembro, depois do governo anunciar, sexta-feira que vai congelar R$ 6 bilhões em gastos este ano para cumprir as metas do resultado primário no Arcabouço Fiscal..
Em análise feita esta semana sobre o cenário econômico americano, o Itaú, maior banco privado brasileiro, está prevendo, que, com “a atividade resiliente e a implementação da maioria das propostas de tarifas comerciais mais altas, expansão fiscal e restrições à imigração - aumentam os riscos de inflação”. (...) E os efeitos apontam para taxas de juros mais altas. O Itaú “espera agora um ciclo menor de cortes nas taxas de juros pelo Federal Reserve (150 p.b. vs. 200 p.b. anteriormente) nas reuniões de dezembro, janeiro e março, levando a uma taxa terminal do Fed de 3,75-4,0% (frente 3,25-3,50% anteriormente)”. E o banco avalia que os cortes ao longo do 1º semestre do ano que vem tendem a ser interrompidos com a intensificação da discussão de tarifas e fiscal. O Itaú ressalta que “os juros mais elevados (nos EUA) implicam em um cenário de dólar mais apreciado, impondo desafios adicionais para países emergentes, como o Brasil”. Em função disso, o Itaú vê a Selic escalando a 13,50% no 1º semestre de 2025 e ficando assim até dezembro.
O diagnóstico feito pelo Itaú e comungado por boa parte do mercado financeiro brasileiro, não corresponde ao que pensam o Goldman Sachs e o Ministério da Fazenda. Isto porque o relatório do GS prevê que “três mudanças políticas importantes após a varredura republicana em Washington afetem a economia: 1. Os aumentos tarifários sobre as importações da China e sobre automóveis podem aumentar a tarifa efetiva em 3 a 4 pontos percentuais; 2. Uma política mais rígida pode reduzir a imigração líquida para 750.000 por ano, moderadamente abaixo da média pré-pandêmica de 1 milhão por ano; e 3. Espera-se que os cortes de impostos de 2017 sejam totalmente estendidos em vez de expirar e haverá cortes de impostos adicionais modestos”.