Por Coisas da Política

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COISAS DA POLÍTICA

Trump e as nossas dúvidas

Publicado em 28/01/2025 às 07:09

Alterado em 28/01/2025 às 11:20

O fato de ser concordância geral que ainda é muito cedo para se falar, consistentemente, sobre os rumos do segundo mandato de Donald John Trump no governo dos Estados Unidos, há poucos dias festivamente inaugurado, nada impede que algumas observações possam ser feitas, mesmo que sujeitas a desmentidos ou confirmações nos meses que se seguirem. Mais ainda porque, sem embargo de ter sido contemplado com uma eleição histórica, inequivocamente legítima, o presidente está longe de ter a unanimidade dos aplausos do mundo, exceção para a bela primeira-dama de sangue iugoslavo. Restam, então, muitas expectativas. Na verdade, não só pelo que diz e promete, porque, no dia em que se empossam, todos os presidentes do planeta, não apenas ele, prometem fazer o melhor, o que é, na maioria das vezes, negado pela rotina da vida e pela pressão dos fatos. No caso mais recente, ele determina, não se sabe exatamente a quem, a redução dos preços de alimentos básicos. Aqui já vimos esse filme… Também quer o serviço público mais eficiente e os barnabés trabalhando. Outro filme reprisado.

Nesse painel, há um interesse maior pelo futuro das relações com o Brasil, o que mais de perto cumpre avaliar. Temos uma tradição de boa convivência comercial com os americanos do Norte, mesmo quando politicamente afetada nos momentos de ingerência indevida, como na conspiração e no golpe de 64. Hoje, os dois países estão governados por pessoas que já trocaram confissões de mútuas antipatias, mas nada que possa chegar ao nível de prejudicar interesses maiores; e, se prejuízos houver, como na sobretaxação excessivamente salgada sobre produtos exportáveis, caberia ampliar outros mercados. De forma que as coisas possam não estar sujeitas apenas a um sentimento patriótico da Casa Branca. Em relação ao maior entre seus competidores, sente-se em Trump, mesmo que não suficientemente confessado, o desejo de contê-los, a começar por amarrar os interesses de Pequim no Canal do Panamá.

(No contraponto, Washington e Pequim não dizem, mas são irmãos siameses campeões mundiais na obra sinistra da poluição e degradação dos recursos ambientais. Espanta a consciência do líder americano ao desvincular-se de um acordo internacional de defesa do clima, se seu povo vive atormentado por incêndios, furacões, tempestades e nevascas atemporais. Já os chineses afogam-se nas enchentes, morrem asfixiados no ar poluído, mas fingem que é coisa passageira).

Há um detalhe que tem relevância, quando se trata do futuro trânsito Brasília – Washington, talvez o principal item a considerar, se se relevar a simples opinião de observador leigo. É que em março, renova-se a secretaria-geral da Organização dos Estados Americanos, e Trump deve interessar-se muito por ganhar influência nesse cargo. Como também terá peso seu aliado, o presidente argentino Xavier Millei, novo líder do continente. Pois é exatamente a partir da OEA que vamos saber como o republicano tentará se posicionar frente aos latinos. Particularmente com o Brasil, que terá de mostrar apurado profissionalismo diplomático nessa questão.

Quanto a nós, o presidente, repetindo a fanfarronice que já ouvimos de Nicolás Maduro, garantiu, como a Venezuela, que os Estados Unidos não precisam de nós, porque nós é que precisamos deles. Talvez devesse, num gesto de modéstia protocolar, ou certo controle da arrogância, lembrar que os mais fortes são exatamente os que devem ser comedidos ao apregoar virtudes próprias, se considerarem que, nas sociedades modernas, diferentemente das medievais, é cada vez mais difícil um país poder julgar-se uma ilha totalmente autônoma, capaz de dispensar os caminhos da convivência universal. A marcha da História leva e aprofunda a interdependência, contrariando o isolacionismo, que tem na Coreia do Norte o melhor modelo da atualidade. Se não mais por outras motivações, tome-se em conta que os desafios modernos importam políticas de colaboração estreita. Nenhum país, por si só, vive e prospera apenas com o que tem e com o que produz; porque, quanto maior for sua capacidade de produzir, maior a necessidade de ter a quem vender. É a lógica que ninguém desmente.

Mas a palavra final é para aplaudi-lo em uma questão de grande relevo. Trump jura que será um defensor da liberdade de expressão, contra qualquer tipo de censura, como exemplo para outros países do continente. Precisamos.

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