O time dos Pilatos
Ciro Gomes declarou apoio crítico, lavou as mãos e foi para a Europa. Marina Silva declarou neutralidade, criticou Bolsonaro e também lavou as mãos, não pregando o voto em Haddad. Os partidos de centro-direita fizeram fila no lavabo para lavar mãos. O último a sair foi o MDB, que ontem declarou sua neutralidade. Fernando Henrique renegou a promessa anterior de apoiar o PT contra a extrema-direita. Nele cai pior, por tudo que é e foi, a roupa de Pilatos. Não é o PT e Haddad que estão jogando ao mar. É o Brasil, sua democracia, suas instituições e seu futuro que ele colocam em risco, omitindo-se diante da possível eleição do candidato que representa o autoritarismo e o mais agudo “reacionarismo cultural”, como definiu FHC, mas sem por isso se mexer.
Antes de falar de tantos Pilatos, um parêntesis sobre o aumento dos casos de violência envolvendo bolsonaristas e outros brasileiros, nem sempre petistas, como a jovem do Recife espancada porque usava botton de Ciro e criticou Bolsonaro. Ganharam destaque o assassinato de Moa do Katendê, em Salvador, e o caso da jovem gaúcha tatuada com uma suástica mas, segundo a Agência Pública, já foram notificados 50 casos de agressão por bolsonaristas. Seis deles também foram atacados. Isso faz calar fundo o que diz o antropólogo e ex-secretário de segurança do Rio, Luiz Eduardo Soares: “ Não tenho dúvidas de que, se acontecer um desastre histórico imenso, uma tragédia, e a candidatura fascista passar –o que eu espero que não aconteça–, no dia seguinte, não vai ser nem necessário esperar a posse, no dia seguinte teremos banhos de sangue nas periferias e nas favelas. Porque a vitória será percebida como uma grande autorização para que se transforme em ato a disposição para a violência.”
Razões menores
E como podem, diante do cenário claramente projetado, os partidos centrais do sistema político, e suas lideranças mais importantes, optarem pelo conforto da neutralidade? A situação criada não comporta isenção. Quem não está contra Bolsonaro, está a favor dele. Ontem foi o MDB que declarou sua neutralidade, liberando os filiados para apoiarem quem quiser. Já haviam feito isso PP, PPS, PR, PRB, SD, Novo, Patriota, Podemos e DEM. O PTB assumiu que apoia. Quase todos estes aí se apresentam como integrantes do “centro democrático”, fugindo ao rótulo de centro-direita. Não há mal no nome e uma direita civilizada faz falta, se tem compromisso com a democracia. Para ficar só no exemplo francês, ela se uniu com a esquerda e centro-esquerda para enfrentar a extrema direita no grande susto de 2002.
Todos estes partidos lavam as mãos, piscando para Bolsonaro, pensando numa composição lá adiante, quando ele precisar da maioria . Mas são movidos também pelo horror ao PT, pelo medo que o ingresso numa frente contra Bolsonaro seja visto pelos eleitores como um socorro ao PT, e não ao país que desperta a piedade do mundo. Desnecessário repetir que o PT cometeu seus erros, mas é importante assinalar que foi sua diabolização constante, seu espancamento como culpado de tudo, a amplificação do que fez, agregando calúnias e até mentiras toscas, como a do kit gay em que os evangélicos acreditam, que produziram isso aí: o furacão que passou sobre os partidos e a classe política, elegendo arrivistas e ameaçando nos impor Bolsonaro como presidente.
Não menos grave é a omissão do PDT e de Ciro Gomes, de quem se esperava um apoio decidido e firme à frente que já conta, além de PT e PC do B, com o PSB, o PSOL e o PPL. Corretamente Haddad já deixou de ser candidato do PT e de Lula para tornar-se candidato da resistência democrática. Mas o PDT declarou foi “apoio crítico” e em seguida Ciro pegou um avião para a Europa.