CULT, POP & ROCK
Canções de Amor – Vol. 1
Publicado em 19/09/2024 às 10:32
Alterado em 19/09/2024 às 10:32
Somos resultados concretos dos nossos passados. E eu não sou diferente. Sou apaixonado pelo meu, por todos os meus vários e diferentes "eus" que caminharam e caminham por estas décadas de uma vida vivida ao meu modo. Sem cabrestos nem rédeas. Sem correntes, a não ser as da minha consciência, que está sempre dando uma freada no meu freewill.
Me aborreço quando leio ou ouço pessoas criticando os saudosistas, reclamando dos nostálgicos. Me sinto ofendido quando pedem para que eu abandone o que vivi e só pense no presente e no futuro. Essa turma deveria ler alguns capítulos da Teoria da Relatividade, de um sujeito chamado Albert Einstein, que abandonasse os livros de autoajuda e buscasse entender um pouco sobre Tempo e Espaço. Deveria sintonizar o canal Discovery Science, que exibe programas ótimos sobre os temas. Ou veja e reveja “Interestelar”, cultuado filme dirigido pelo britânico Christopher Nolan.
Vivo revisitando as minhas memórias. Coloco tubos imaginários de oxigênio, roupas de borracha, pés de pato, e vou bem fundo, muito fundo. Me atiro no mais profundo abismo do imenso oceano das lembranças. Dia desses, porém, não precisei mergulhar para reencontrar alguns momentos das minhas vidas passadas. Alguns vieram até mim quando, no fundo raso de uma gaveta, achei cinco pequenas fitas cassetes que, durante alguns anos, fizeram parte da minha secretária eletrônica, aquele conhecido e útil aparelho antigo, acoplado ao telefone, que capta mensagens e as armazena sem que precisemos nos preocupar com direitos trabalhistas.
A que me serviu trabalhou de graça, pra caramba, sem reclamar, durante os 15 anos em que vivi em Ipanema. Vinte e quatro horas por dia. Sem descanso. Sem fins de semanas livres. Sem férias, vale-transporte etc. E parte desse trabalho escravo ficou registrado nestas pequenas fitas que, curioso, coloquei para tocar novamente depois de anos. Um pouquinho de tudo ainda está preservado naquelas finas fitas magnéticas depois de tanto tempo: mensagem de mãezinha perguntando se eu estava melhor da virose; da minha gerente de banco avisando que o meu cartão tinha chegado; do seu Rodolfo, do mercadinho da Teixeira de Mello, perguntando se poderia levar as minhas compras; dos meus irmãos; de um amigo do grupo do quiosque da orla me convidando pra um almoço no Iate Clube; de outro, confirmando uma feijoada em um cantinho do Leblon; de uma amiga querendo companhia para um show do A Cor do Som no Parque da Catacumba, na Lagoa; e aquelas que mais me fizeram rir e refletir. As das minhas ex.
Delas, as mensagens me mostraram o quanto eram inocentes e como eu fui tolo. O quanto eram dedicadas e delicadas enquanto eu, escravo da minha preguiça nos relacionamentos, fui omisso e, muitas vezes, ingrato.
Mesmo estando em casa, eu preferia deixá-las falando sozinhas. Reclamando, aborrecidas, com a máquina que, discreta, não se metia no monólogo, como a que divido com os leitores:
"Tem alguém aí? Você não vai atender, né? Tá em casa? Tá cansado? Tá cozinhando, lendo, ouvindo música? Aaaah... tá assistindo ao jogo do Vasco, né? Me ligue quando terminar (risos)."
Uma dessas, digamos, abandonadas, me enviava diariamente, normalmente durante a tarde – quando eu realmente não estava em casa –, trechos de canções românticas. Na época, eu achava cansativo, entediante, brega. Hoje, depois de quase duas décadas, quando ouvi essas gravações novamente, finalmente descobri que eu poderia ter sido muito mais caloroso, paciente, carinhoso, amoroso, e que devemos, sempre, enviar canções para pessoas que nos são importantes.
E, inspirado nesta mensagem em especial, encontrada em uma das fitas, resolvi, copiando a coluna “Love Songs Vol. 1”, publicada meses atrás, só com músicas estrangeiras, criar também a “Canções de Amor Vol. 1”, com algumas nacionais óbvias, clássicas, clichês, que, de um jeito ou de outro, falam de amores perdidos ou conquistados, que ainda me são especiais e que deixo como sugestão para uma playlist para os leitores.
Lado 1
Oceano - Djavan
A atriz Letícia Sabatella esteve, em setembro, ao lado do namorado, o ator Daniel Dantas, prestigiando o FestCine Pedra Azul, festival de cinema realizado em uma região das montanhas do Espírito Santo. Infelizmente, quando estive presente, no último dia do evento, ela já tinha retornado ao Rio. Perdi a oportunidade de conhecê-la pessoalmente e perguntar se ela se lembrava de uma manhã, bem cedo, em frente a um quiosque da orla de Ipanema, quando chegou, sozinha, e ficou durante longos minutos, sorrindo, como que hipnotizada, olhando o mar.
Eu iria contar a Letícia que eu também estava lá, sentado ao lado, e presenciei toda a cena e que, coincidentemente, Oceano, naquele exato momento, tocava nos fones de ouvido.
Só Pro Meu Prazer - Heróis da Resistência
Segundo Leoni, um dos compositores da canção, trata-se de uma letra sobre uma paixão fascista.
Você - Tim Maia
Um hino romântico lançado em 1971, no primeiro álbum do cantor, celebrando um amor conquistado e inesperado. Deveria ser proibido qualquer outra pessoa interpretar essa canção. Só Tim tinha e tem esse direito.
Nalgum Lugar - Zeca Baleiro
O maranhense musicou o poema do concretista E. E. Cummings traduzido por Augusto de Campos e que faz parte do “Líricas”, melhor álbum do músico. Quem assistiu “Hannah e Suas Irmãs”, de Woody Allen, se lembra da cena em que um personagem apaixonado lê o poema.
Como Vai Você - Roberto Carlos
Um curto adágio, a la Tomaso Albinoni, com letra. Escrita, composta por Antonio Marcos, é uma das mais tristes canções já gravadas por Roberto. Em um almoço na casa de Mauro Motta, um dos produtores de Roberto Carlos, conversamos um bom tempo sobre o arranjo maravilhoso de cordas e metais para “Como Vai Você”.
Cartão Postal - Rita Lee
Blues delicado que está no "Fruto Proibido", melhor álbum de Rita. Guitarra de Luiz Sérgio Carlini cheia de bossa e letra "enxuga lágrimas" de Paulo Coelho.
Lígia - Tom Jobim
Para ouvir pedalando ou caminhando pelas ruas de Ipanema para sentir a presença de vários "Tons" e o perfume das muitas "Lígias" que ainda vivem pelo bairro.
Lado 2
Amor de Índio - Beto Guedes
Obra-prima que abre o melhor álbum do mineiro e que também leva o nome da canção. Letra emocionante do craque e escudeiro fiel Ronaldo Bastos.
Meu Mundo e Nada Mais - Guilherme Arantes
Sucesso absoluto dos anos de 1970, lançado no primeiro álbum solo do músico paulista assim que se despediu da banda de rock progressivo Moto Perpétuo.
Tola Foi Você - Angela Ro Ro
Uma das 12 maravilhosas canções que destilam dor de cotovelo, amores e desamores que fazem parte do primeiro álbum de Ro Ro, lançado em 1979.
Lua e Estrela - Caetano Veloso
Canção composta por Vinícius Cantuária inspirada em um encontro que o músico teve com uma misteriosa garota no Arpoador e que nunca reencontrou. Interpretação mágica de Caetano que, parece, a cantou sorrindo.
Quase Um Segundo - Paralamas do Sucesso
Letra comovente e corajosa de Herbert Vianna escrita após o fim do relacionamento com a cantora Paula Toller. A voz chorosa, desconsolada, do cantor se arrasta acompanhada pelo piano mágico do mitológico músico argentino Charly Garcia.
Vento no Litoral - Legião Urbana
Sempre vejo Renato Russo no alto das pedras do Arpoador, em uma tarde nublada de inverno, quando ouço a canção. A música, para mim, também serve para isso: para criar imagens.
Todo Amor que Houver Nessa Vida - Cazuza
Originalmente lançada no primeiro álbum do Barão Vermelho, de 1982, com pegada animada, rock and roll, recebeu uma roupagem blues por Cazuza no seu álbum ao vivo gravado no Canecão, em 1988. Na época, ainda resistindo aos problemas de saúde, Cazuza comoveu a plateia com uma apresentação espetacular. Tem uma outra versão da canção, também ao vivo, ainda mais incrível, gravada em um show na TV Globo, com belo arranjo e solos de harmônica do músico Christiaan Oyens.
Faixa Bônus
Eu Te Amo - Chico Buarque
A minha preferida do São Francisco Buarque de Hollanda. Para ouvir ajoelhado ou com uma caixa de lenço de papel do lado.