Um trabalho devotado à música
Julieta no Convés (Kuarup), álbum de Anna Paes e Guinga com produção artística de Paulo Aragão, participações de Zé Miguel Wisnik, Nailor Proveta e Cristovão Bastos, traz 13 composições de Guinga com oito parceiros e conta com seu violão e seus arranjos.
Eis algumas músicas.
“Lundu da Saudade” (Guinga e Afonso Machado) tem a graça de um passarinho que busca amenizar a saudade de um amor distante. A voz delicada de Anna Paes se ajunta à voz sofrida de Guinga e, sob a benção do violão dele, homenageiam Nelson Cavaquinho num verso de Afonso: “(...) vem me contar nesta canção se mato ou morro, se é de flor ou é de espinho”.
“Noite sobre Noite” (Guinga e Zé Miguel Wisnik) é um tema já gravado, por Guinga e as cordas do Quarteto Carlos Gomes, no álbum Avenida Atlântica (comentado aqui na coluna sob o título “Gênio detalhista”, em 2017). Hoje, Zé Miguel toca piano e canta com Anna Paes os versos que revelam uma conversa ao telefone. A composição de Guinga, novamente nos remete a Villa-Lobos e Tom Jobim.
A toada “Suçuarana” (Guinga e Paulo César Pinheiro), gravada pela cantora Cristina Santos nos anos 1980, quando foi composta, traz de volta o canto de Guinga e seu violão absoluto em belo arranjo. A letra do poeta, valendo-se de rimas com nome de seres que povoam as matas brasileiras (onça suçuarana, abelha africana e taturana, a larva de um inseto), compara-os à figura sedutora de uma mulher.
“Egrégora” (Guinga e Anna Paes), outra toada, esta composta pela dupla durante a pandemia, vem novamente sob a responsabilidade da voz (por vezes dobrada), do violão e de um arranjo de Guinga. A letra de Paes, que ela mesma já gravou anteriormente com Guinga ao violão, evoca a espiritualidade e a religiosidade como caminhos de cura.
Com arranjo e piano de Cristovão Bastos, “Borboleta de Louça”, valsa de Paulinho da Viola e Mário Séve com letra de Guinga, é cantada por Anna Paes. Para homenagear Dona Nalda, sua mãe, Guinga buscou na memória afetiva as “borboletas de louça”, comumente vistas nas paredes das varandas das casas do subúrbio por onde costumava caminhar.
Guinga canta “Mar de Rosa” (Guinga e Aldir Blanc). Seu violão e seu arranjo reeditam esta inédita toada de sua parceria com Aldir, composta nos anos 1990. Aqui ela rola como uma simples vinheta, já que o restante da letra se perdeu no tempo... Vixe, maria!
O lindo choro-canção “Julieta no Convés” (Guinga e Anna Paes) é a mais recente parceria da dupla. Com voz de Guinga e Anna Paes, e violão e arranjo de Guinga, é também a faixa-título do álbum.
A letra de “Cambono” (Guinga e Thiago Amud), segundo Amud, fala de uma ialorixá apaixonada, e nesta gravação traz voz de Anna Paes e violão e arranjo de Guinga.
Foi assim, depois de ouvir e reouvir Anna Paes e Guinga, que abri meu peito e me entreguei, de mãos postas, à beleza do álbum Julieta no Convés, uma louvação à música.
Aquiles Rique Reis
Nossos protetores nunca desistem de nós