Filipe Catto traz Gal em si
Eu já ouvira Filipe Catto cantar. Impressionou-me sua voz. Mas foram audições ocasionais. Eis que o amigo Ciro Barcelos me mandou o áudio da Catto cantando algumas músicas de Gal Costa. O choque foi instantâneo: pus-me a conhecer Belezas São Coisas Acesas Por Dentro (Editsy), álbum que reúne as duas grandes cantoras sob uma única emoção.
No release, lê-se que Catto ainda titubeou um pouco antes de mergulhar no projeto. Mas logo sacou ser uma missão que não se recusa, cumpre-se! Foi com tudo. Primeiro, apresentações em unidades do Sesc Paulista, quando ela e Gal se grudaram espiritualmente, tornando-se um só corpo, uma só voz. Coisas que bolem por dentro, faiscando em busca de luz, devem ser libertas.
E Filipe Catto deu-se ao roquenrrol (nada tão Gal Costa) com o fervor que só sua voz hipnótica pode dar, o que, até aqui, só Assucena atingiu de forma tão igualmente sedutora e bela.
Com o repertório gravado vibrando à sua frente, Catto intuiu o dia em que ele viria à luz: 26 de setembro de 2024, data em que ela e Gal aniversariam.
Belezas São Coisas Acesas Por Dentro é um álbum coletivo. Para germinar a sua estética musical, Catto trouxe com ela gente que comunga a intenção de fazer da música algo que mexa com o corpo tanto quanto com o sentimento: tentações e amores paridos da alma.
“Lágrimas Negras” (Jorge Mautner e Nelson Jacobina), arritmo, envolta em reverber, Catto vem toda; “Tigresa” (Caetano) arrepia com guitarra e voz; “Joia (Caetano) / Oração da Mãe Menininha” (Dorival Caymmi): guitarra dedilhada e a voz arritmo, afetuosa e dobrada, clamam à Mãe; “Esotérico” (Gilberto Gil): amparada pela harmonia, a voz de Catto vem afinada; “Negro Amor” (Bob Dylan, versão Caetano e Péricles Cavalcanti) soa emprenhada de pegada roqueira e arrasa; “Nada Mais” (Steve Wonder, versão Ronaldo Bastos) rola solta, com Catto se entregando à letra envolta novamente em reverber – o recurso, talvez, soa excessivo; “Sem Medo, Nem Esperança” (Arthur Nogueira e Antonio Cícero): o couro come na voz pródiga da moça; “Vaca Profana” é o rock invadindo a canção de Caetano; “Jabitacá” (Bactéria, Lirinha e Junio Barreto) dá a Catto o poder de realçar sua persona musical, bela! E, por fim, “Vapor Barato” (Jards Macalé e Waly Salomão) é pura luz.
Ah, baby, apaixonado, íntegro, teu cantar despreza soslaios, vai direto à essência do ouvinte. Ele se põe a teus pés, cativado pela sinceridade de um ser humano inequivocamente abençoado por deusas todas e por deuses todos... já nem sei mais onde encontrar palavras, tamanha a admiração por tua fortaleza.
Aquiles Rique Reis
Nossos protetores nunca desistem de nós.
Ficha técnica
Produção musical: Filipe Catto e Fabio Pinczowski; arranjos: Catto, Gabriel Mayall, Fabio Pinczowski e Michelle Abu; voz, guitarra e Sruti Box: Catto; baixo: Gabriel Mayall; bateria e percussão: Michelle Abu; guitarras e voz: Fabio Pinczowski.