Uma musicista da arte contemporânea
Eis que surge Julie Wein, compositora, pianista e cantora com um talento e tanto. Infinita é a soma de seus predicados: sutil, apurada; harmonia contextualizada; melodias afetuosas; letras sinceras e pessoais; verso e prosa com sustança corajosa. Ajuntando tudo, ela mostra vocação total para uma criação de refinada sedução.
Wein é intérprete com preciosos recursos e os irradia com a força do ardor de uma grande mulher. Melodias doces, quase frágeis, de elegância discreta, simplesmente encantadoras. Versos expõem seus amores e seu ofício, e nos deixam pensar que os desvendaremos.
Escreve versos que, ao se abrigarem na melodia, fazem com que os olhos do ouvinte se arregalem e de dentro de sua alma venha um gemido de satisfação e carinho pelo que se lê.
Julie Wein lançou o seu primeiro álbum Infinitos Encontros (Biscoito Fino). Como um boré, o disco convoca as “tribos” a pensarem em música como se fosse ela a primeira e máxima ação a chegar à profundeza da alma humana. Arte que vai ao íntimo, bem antes de o cérebro e o coração darem tento.
A música de Wein parece ser o primeiro dos sentimentos, o que vem com o nascimento, passa pela infância e a adolescência, para enfim desaguar no universo adulto. Imensas barreiras se erguem entre cada momento. São difíceis de serem vencidas, mas a música pode torná-las um pouco menos traiçoeiras.
Abre o som. Vem Julie Wein. Com ela está o canto de uma mulher madura que tem o amor como uma de suas marcas. Sua voz vai às notas como uma agulha cerze o pano sem lhe causar dano. Como se fossem búzios, bola de cristal, cartas, tarô, as músicas expõem (quase) tudo o que nos é dado a saber sobre a sua personalidade.
A tampa abre com “Trânsito de Marte” (Julie Wein). A letra diz: “(...) O nosso amor existe só/ No tempo em que a terra encobre a lua (...)”. Ao ouvi-la, tem-se uma certeza... se a abertura é assim, com a voz e o piano em sussurros amorosos, imagine o que está por vir?
JW está ao piano, Juliane Weingartner e Marcio Ferreira Rodrigues nos violinos, Carlos Tavares à viola e Romildo Weingartner ao cello. A cada nota a voz de Wein espoca como um flash de brilho intenso.
Fechando a tampa, piano (JW), violão (Victor Ribeiro, ele que também produziu e escreveu os arranjos), percussão (Marco Lobo), baixo acústico (Jorge Helder), sax soprano (Yuri Villar) e coro infantil conduzem “Mar Demais” (JW, melodia, Mariana Ferrão, letra).
Intensa, Wein exacerba as notas – é como se o amor assim pedisse. Infinita é a soma de seus atributos. Firmes, as sílabas se moldam ao seu cantar. E é logo no primeiro verso que a excitação assume o lugar do lirismo: “Água tatuada no coração/ Testemunha de tantas vidas/ Mar uma saudade de gente/ Presa à superfície da pele (...).
Julie Wein me instigou: que versos mais ousados, que intérprete mais aprimorada, que musicista mais detalhista: as minúcias de seu ofício atestam a sua arte, arte de uma mulher contemporânea que vive de amar.
Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4