É a alimentação, estúpido

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Por Gilberto Menezes Côrtes

Gilberto Menezes Côrtes

Na eleição de Bill Clinton, em novembro de 1992, o presidente Republicano, George H. W. Bush, que tinha sido saudado um ano antes como herói, pela vitória esmagadora das forças aliadas, lideradas pelos Estados Unidos, na expulsão das tropas do ditador iraquiano Saddam Hussein do Kuwait, não entendeu as razões de sua derrota acachapante. O ex-governador Democrata do Arkansas recebeu 44,9 milhões de votos populares e levou 370 votos no Colégio Eleitoral, enquanto Bush pai teve 39,1 milhões de eleitores e 168 votos no Colégio Eleitoral. É certo que a candidatura independente do também texano Ross Perot (que levou 19,7 milhões de votos), enfraqueceu os Republicanos.

Mas a frase lapidar, cunhada pelo marqueteiro de Clinton, James Carville, passou para a história como a explicação mais plausível: “É a economia, estúpido”. No inglês, “stupid” tem mais o significado de idiota, ou burro, um pouco menos agressivo que o uso literal no português do Brasil. Pois o presidente Jair Bolsonaro e seu staff político devem estar surpreendidos pelo resultado da última pesquisa Quaest/Genial Investimentos, divulgada hoje e que ouviu 2 mil pessoas entre os dias 25 e 28 de agosto (não captou o resultado do debate presidencial na Band, mas já reflete as reduções dos preços da energia elétrica e dos combustíveis e a liberação de parte dos R$ 41,2 bilhões, tudo válido até dezembro).

Lula (PT) registrou 44% de intenções e Bolsonaro (PL) 32%, na pesquisa estimulada. Ambos caíram um ponto percentual em relação à pesquisa divulgada em 17 de agosto e voltaram ao mesmo nível de 3 de agosto. Na comparação das três pesquisas, quem subiu foi Ciro Gomes (PDT): tinha 5% em 3 de agosto, variou para 6% em 17 de agosto e alcançou 9% em 31 de agosto. Simone Tebet também evolui: de 2% em 3 de agosto, registrou 3% e na pesquisa divulgada dia 17 e na de hoje. No somatório dos votos válidos, Lula teria menos de 50% (44%) e Bolsonaro e os demais somariam (45%), indicando a realização do 2º turno, no qual Lula venceria por 51% a 37%.

Comida vale mais que gasolina

Entre os vários temas pesquisados pelo Instituto Quaest dois indicadores chamam a atenção: 1 - a rejeição de Bolsonaro que estacionara em 55% em 3 de agosto e 17 de agosto, subiu para 56%. Já a de Lula, que estava estável em 44%, baixou ligeiramente para 43%; a economia foi apontada por 37% como o principal problema do país hoje e a alta da Alimentação é a questão mais aguda. E, até o momento o eleitor não está sendo seduzido a mudar de voto pelas benesses temporárias distribuídas pelo governo Bolsonaro.

A pesquisa mostrou uma planilha para que o entrevistado dissesse se houve em sua cidade (180 municípios) queda ou aumento nos preços da gasolina, da energia elétrica e da alimentação. Na gasolina, 82% responderam que sim e 9% que não. Na energia elétrica, 41% disseram ter havido baixa, mas 47% registraram aumento (há reajustes anuais escalonados país afora). Mas na alimentação, problema que afeta sobretudo os eleitores de baixa renda, que são maioria (a gasolina é item de uso da minoria que ganha acima de dois e principalmente cinco salários mínimos), 79% disseram que os preços subiram e só 18% registraram baixa.

Na faixa de renda até 2 salários mínimos (R$ 2.424) 81% disseram que os alimentos subiram e 17% que caíram (contra 75% que viram baixa na gasolina e apenas 39% sentiram queda na energia elétrica, que subiu para 50%). Na faixa de 2 a 5 SM (R$ 6.060), 81% também acusaram alta da alimentação e apenas 16% sentiram queda. Mas 83% viram baixa na gasolina e 40% sentiram queda no custo da energia, que subiu para 50% dos pesquisados.

Só nas faixas com renda acima de 5 salários mínimos houve quase unanimidade (90%) de registros de baixa da gasolina (só 6% viram alta), mas ainda um percentual de 72% registraram aumento dos preços dos alimentos (23% viram queda) e 44% notaram baixa na energia, contra 38% que viram aumentos.




 


Estatísticas não enchem barriga

O governo tem bons indicadores econômicos para explorar nos próximos dias. Hoje, o IBGE divulgou que A taxa de desocupação (o próprio IBGE não usa mais desemprego) ficou em 9,1% no trimestre móvel de maio a julho de 2022, ficando estável em relação a abril-maio-junho, mas com recuo de 1,4 ponto percentual (p.p.) frente ao trimestre de fevereiro a abril de 2022 (10,5%) e 4,6 p.p. ante mesmo período de 2021 (13,7%).

Pela 1ª vez desde a pandemia, a população desocupada ficou abaixo de 10 milhões (9,9 milhões de pessoas), o menor nível desde o trimestre encerrado em janeiro de 2016, recuando 12,9% (menos 1,5 milhão de pessoas) no trimestre e 31,4% (menos 4,5 milhões) no ano. Mas se o rendimento salarial médio aumentou 2,9% na comparação com o trimestre móvel anterior, ele ainda está 2,9% abaixo do período maio-junho-julho de 2021.

Amanhã, o IBGE divulga o resultado do PIB do 2º trimestre (abril a junho). As estimativas apontam crescimento de 1% a 1,1% no Produto Interno Bruto. Ambos são radiografias do passado. É inegável que a economia está evoluindo, mas, como no milagre brasileiro, estatísticas não enchem barriga. Se a escalada dos alimentos continuar, será difícil o eleitor mudar o voto. Sobretudo as camadas mais pobres do Nordeste, do Sudeste e das periferias das grandes cidades brasileiras, onde os alimentos consomem a maior parte dos orçamentos familiares.