
O OUTRO LADO DA MOEDA
A inflação caiu para a eleição
Publicado em 11/10/2022 às 15:11

Setembro teve nova deflação no IPCA (-0,29%), divulgou hoje o IBGE. Foi a 3ª queda seguida desde julho, quando, visando ajudar a campanha de reeleição do presidente Jair Bolsonaro, o governo negociou com o Congresso reduções do ICMS cobrado sobre energia elétrica, comunicações e combustíveis, que ganharam empurrão próprio da Petrobras, quando houve redução dos preços internacionais do petróleo e dos combustíveis até setembro. No trimestre julho (-0,68%), agosto (-0,38%) e setembro (-0,29%) houve deflação acumulada de 1,32% no IPCA, que mede as despesas das famílias com renda até 40 salários mínimos (R$ 48.480) nas 16 regiões pesquisadas pelo IBGE. Isso fez a taxa acumulada até setembro ficar em 4,09% e a dos últimos 12 meses em 7,17%. O recorde estava em 12,13% em abril. Em setembro de 2021, o IPCA subiu 1,21%, o que ajudou a baixar a taxa acumulada em 12 meses.
Embora o índice do grupo Alimentação e Bebidas, que tem o maior peso no IPCA (21,85%), seguido pelos 20,79% dos Transportes, tenha tido a primeira queda no ano (--0,51%), contribuindo para a redução de 0,11 pontos percentual no IPCA de setembro, mais uma vez a deflação foi causada pela baixa de 8,50% nos combustíveis, que têm grande influência na inflação das camadas de maior renda. Outra grande contribuição (pelo 2º mês seguido) foi a da baixa de 2,08% nas tarifas de Comunicações, que reduziu em 0,09 p.p. o IPCA. Numa prova da demora da transferência da redução do ICMS pelas empresas, enquanto a telefonia só caiu em agosto, agora foi a vez da redução de 10,55% nos custos de acesso à internet e pelo combo de telefonia, internet e tv por assinatura (-2,70%).
Os efeitos da baixa da energia já se dissiparam na Habitação, o 3º grupo com maior peso no IPCA (15,21%). Em setembro, os gastos em Habitação subiram 0,60% (0,10% em agosto), com aumento de 0,78% na energia residencial, por efeito do calendário dos reajustes das tarifas nas regiões pesquisadas. O maior aumento (4,95% foi em Vitória (4,95%), onde as tarifas por kWh foram reajustadas em 10,37%, desde 7 de agosto. Na mesma data as tarifas subiram 14,74% em Belém (causando impacto de 3,54% no mês). E houve altas nas taxas de água e esgoto (0,27%) e do gás encanado (0,11%).
O maior impacto foi no grupo Despesas pessoais, que subiu 0,95%, contribuindo por 0,10 p.p. de alta no IPCA. E o vilão foi o aumento dos serviços bancários (1,56%). Além disso, serviços ligados ao turismo, como hospedagem (2,88%) e pacote turístico (2,30%) também subiram, mostrando que o setor, na ânsia de recuperar rapidamente as margens perdidas na pandemia, pode afastar a clientela.
Gasolina X alimentação
A redução do preço da gasolina, item que mais pesa entre os 377 pesquisados pelo IBGE no resultado final do IPCA, foi escolhido pelo ex-secretário de política econômica do Ministério da Economia, Adolfo Sachsida, que assumiu em maio a pasta das Minas e Energia que controla a Petrobras, como a principal estratégia para derrubar a inflação, ao lado da redução do ICMS sobre itens importantes na formação do IPCA. Sachsida era especialista em acompanhar a inflação no Ipea e foi chamado por Paulo Guedes para o Ministério da Economia.
Só em setembro, a baixa de 8,33% na gasolina (a menor desde o início das reduções em julho) sozinha teria causado deflação de 0,42 p.p. no IPCA do mês passado. O maior impacto foi em julho, quando a gasolina caiu 15,48% nos levantamentos do IBGE, e contribuiu sozinha para reduzir o IPCA em 1,04 p.p., anulando a alta de 1,30% no grupo Alimentação e Bebidas no IPCA (impacto de 0,28 p.p. no IPCA). Com ajuda da baixa de 1,05% no item Habitação (-0,16 p.p.), a taxa de julho registrou deflação de 0,68%. E agosto, foi a mesma estratégia: a baixa de 11,64% na gasolina, gerou redução de 0,67 ponto percentual no IPCA.
Mas é preciso não esquecer que apesar da trégua em setembro, a Alimentação e Bebidas acumula alta de 9,49% de janeiro a setembro, mais do que o dobro da variação do IPCA (4,09%).
O mais absurdo, além dos reajustes de 1,56% nas tarifas bancárias (a maior parte dos serviços é feita pelo próprio cliente via aplicativos do celular, incluindo o PIX), e de 1,53% no seguro obrigatório dos veículos, foi a alta de 6,14% nas tarifas dos transportes por aplicativos. Se caíram os preços da gasolina, do etanol e do GNV, além das tarifas de telefonia, onde houve aumento para justificar o reajuste nos custos dos aplicativos de Uber&cia?
Os taxistas, que também foram beneficiados pelas reduções de combustíveis, ainda estão sendo contemplados (não se aplica a todos, é verdade) com mesadas mensais R$ 1 mil até dezembro. Mas não se dignaram a baixar as tarifas.
A mágica dos combustíveis

Quando começa o repique da inflação
A questão apontada pelos departamentos de estudos econômicos dos bancos e consultorias é que apesar da inegável redução da inflação no cômputo geral do IPCA, há resistência em Alimentos e Bebidas (neste mês de setembro houve boa contribuição baixista do leite longa vida -13,715, mas o produto ainda acumula alta de 36,93% de janeiro a setembro) e nos segmentos de serviços. O Bradesco, o menos crítico dos grandes bancos ao governo Bolsonaro, chama “atenção para as medidas de núcleo (de inflação), que apesar do arrefecimento nas últimas leituras, seguem em nível elevado – ao redor de 10,2% acumulado nos últimos 12 meses”.
Por isso, como o governo está numa queda da braços com a Petrobras, que aponta defasagem nos preços dos combustíveis, vis a vis o sistema de paridades de preços internacionais (preços externos atualizados pela taxa de câmbio), mas a ordem é não haver aumento até a eleição (o que impede novas baixas, também), o mercado financeiro projeta alta de 0,30% a 0,36% para a inflação de outubro. Entretanto, como o IPCA teve a maior alta mensal em outubro de 2021 (1,25%), a taxa em 12 meses continuará a cair. Mas o Santander observa que o núcleo IPCA EX3 (que representa o núcleo da inflação de serviços e bens industriais) está subindo acima de dois dígitos e do centro da meta do Banco Central (3,50% para 2022 e 3,25% para 2023). Lembra o Santander que isso ocorre há 24 meses seguidos
Para o departamento econômico comandado pela ex-secretária do Tesouro, Ana Vescovi há uma “dicotomia entre a expectativa de continuidade da desaceleração nos bens industriais e a projeção de que a inflação de serviços permaneça persistentemente elevada por um tempo”. Vale lembrar que a Alimentação e Bebidas tem mais peso entre as pessoas que ganham até 5 Salários mínimos (a maioria da população), base de cálculo do INPC, que teve queda de 0,32% em setembro (os produtos alimentícios caíram 0,51% e os não alimentícios baixaram 0,26%).
A inflação nos colégios eleitorais
Não se deve esquecer, porém, que o controle da inflação a canetadas se deu justamente sobre combustíveis (4 meses seguidos) e energia elétrica e nas regiões que concentram os maiores colégios eleitorais do país. Mas a menor deflação trimestral acumulada (-0,20%) foi justamente no maior colégio. São Paulo tem 21,8% dos eleitores do país e a capital de São Paulo pouco menos de 10% do total. Já na região metropolitana, que tem a maior concentração de pessoas que ganham até 40 SM (R$ 48.480), motivo pelo qual o peso da inflação em São Paulo é de 32% no IPCA, a baixa da inflação não está sendo sentida como um todo pela população.
No Rio de Janeiro, 3º colégio eleitoral (8,5%) houve a 2ª menor deflação trimestral (-0,39%). Salvador, capital da Bahia, 4º maior eleitorado do país, vem com a 3ª menor queda (-0,71). Em Belo Horizonte, sede do 2º contingente do país, a queda foi expressiva (-1,96%), o dobro da média nacional (-0,97%). O recorde foi em Goiânia (-2,83%), estado onde Bolsonaro venceu no 1º turno.
Onde a inflação do IPCA caiu mais no trimestre
