Economia também é como nuvens

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Por Gilberto Menezes Côrtes

Há uma velha máxima na política, que teria sido cunhada por Magalhães Pinto: “Política é como nuvens, cada hora está de um jeito”. Como José de Magalhães Pinto foi de bancário a banqueiro (fundou o extinto Banco Nacional), a máxima também se aplica às oscilações da economia. Quem poderia imaginar a mudança radical nas perspectivas da economia brasileira em uma semana?

De uma semana para cá, os indicadores domésticos de inflação apontam para forte queda dos alimentos, pelos efeitos deflacionários da supersafra agrícola de grãos. Com os indicadores dos Estados Unidos apontando igual desaceleração dos preços, e o possível encerramento do ciclo de altas de juros pelo Fed na reunião do Federal Open Market Committee (Fomc) em 3 de maio, mesmo dia da reunião do Copom, houve mudança de perspectivas no mercado.

Segundo a Genial Investimentos, as apostas indicam 40% de chances para o BC dar início ao ciclo de cortes da Selic, hoje em 13,75%, na reunião de 21 de junho, quando a taxa baixaria 0,25 ponto percentual, a 13,50% ao ano. Os efeitos das mudanças das nuvens nos cenários econômicos (que terão na próxima semana as primeiras negociações do arcabouço fiscal no Congresso) foram notáveis.

O dólar que chegou a ser negociado nesta 5ª feira, 13 de abril, abaixo de R$ 4,90 (a R$ 4,8993), era negociado por volta do meio-dia a R$ 4,9183, uma queda de 2,70% em uma semana. Desde o pico recente de 27 de março, quando houve uma reversão das apostas de alta às vésperas do fechamento dos contratos futuros de março, e a moeda americana estava cotada a R$ 5,1983, houve queda de 5,84%.

Mais notável foi o impulso do Ibovespa. Depois de ameaçar cair abaixo de 100 mil pontos há uma semana, o índice chegou 10.890 pontos na 4ª feira, 12 de abril, com valorização de 5,76%. Hoje, houve pequeno movimento de realização de lucros e o Ibovespa cedeu 0,28% a 108.313 pontos às 12:30.

 

Vejam as mudanças de cenário

Bradesco – Há uma semana, precisamente em 6 de abril, na revisão do “Cenário Econômico”, o Departamento de Estudos Econômicos do Bradesco indicou estar sendo “surpreendido positivamente” pelas contas externas: “A balança comercial bateu recorde no 1º trimestre de 2023, registrando saldo de US$ 16 bilhões, o que nos levou a revisar o déficit em conta corrente de 3,0% para 2,8% do PIB, neste ano. Apesar de alguns fatores apontarem para um câmbio mais apreciado no curto prazo, preferimos manter a projeção para a taxa de câmbio em R$/US$ em 5,25 por conta da ainda baixa visibilidade de fatores externos e locais”. No curto prazo, o dólar já furou as previsões.

A projeção do Bradesco para o IPCA subiu de 5,9% para 6,2% em 2023, que explica: “Incorporamos a alteração na tributação dos estados sobre a gasolina e, assim, os preços administrados deverão ter alta de 10,5% em 2023. Apesar da desaceleração dos núcleos desde o pico no ano passado, mostrando eficácia da política monetária, há certa rigidez à baixa nesse curto prazo, especialmente em serviços, respondendo ao mercado de trabalho ainda resiliente e com aumento da renda ampliada. Com isso, a taxa Selic deve encerrar o ano em 12,25% e em 10% em 2024”.

Genial Investimentos – “O Ibovespa fechou a 4ª feira em alta de +0,64%, alcançando os 106,8k. O principal índice da bolsa brasileira teve seu 3º dia consecutivo de alta, e continua surfando o fechamento da curva futura de juros. Na última sessão, a divulgação da inflação para o consumidor (CPI) nos EUA demonstrou desaceleração do indicador acumulado nos últimos 12 meses. Com isso, a expectativa para o fim do ciclo de aperto monetário na maior economia do mundo aumentou”.

Mas a Genial alerta: “Se de um lado, a forte queda do dólar ajudou a curva de juros a fechar, somado ao IPCA de março vir melhor que o esperado, declarações do presidente do BCB foram na contramão do otimismo do mercado, que ajustou algumas posições”. O que explica a cautela de hoje.

Itaú – Na revisão do cenário de 2023, apresentado na 2ª feira, 10 de abril, o Departamento de Pesquisas Macroeconômicas do Itaú Unibanco” a instituição manteve “a projeção de inflação para 2023 em 6,1%, com o aumento da alíquota de ICMS sobre a gasolina sendo compensado por uma menor inflação de alimentos. Revisamos a projeção para o próximo ano para 4,5%, de 4,2%, com a maior desancoragem das expectativas de inflação. Não incorporamos eventual revisão da meta, que poderia levar a projeção de 2024 para acima de 5%”.

O banco manteve “a projeção de taxa de câmbio em R$ 5,30 por dólar em 2023 e R$ 5,40 por dólar em 2024. Vemos cenário externo mais volátil, tendo em vista os episódios recentes em bancos e a reprecificação da taxa terminal de juros nos EUA para um nível mais baixo. No contexto doméstico, houve alguma redução dos ruídos sobre política econômica e dos riscos”.

Para a Selic, o Itaú manteve a projeção de 12,50% em 2023 e 10,0% em 2024.

 

Camelôs eletrônicos

Todo empresário, sobretudo do comércio estabelecido, que paga altas luvas e aluguéis caríssimos para ter um ponto comercial em um shopping ou em ruas de grande movimento, reclama da montagem de uma barraquinha de camelô para revender bens contrabandeados ou roubados em sua porta.

Por que, então, a comoção nas redes sociais com a intenção do governo Lula, no intuito de fechar buracos na legislação que favorece a montagem de operações semelhantes às do contrabando “formiguinha” (“sacoleiros” que vão ao Paraguai comprar mercadorias importadas sem pagar impostos) por gigantescos sites internacionais de compras como os chineses, AliExpress, Shopee e Shein ou a americana Amazon?

A ideia do governo é cumprir à risca a regra que isenta de imposto os envios internacionais com valor menor do que US$ 50 (mas ela só se aplica a remessas de pessoas físicas no exterior para residente PF no Brasil e vice-versa). Mas os sites de comércio internacional estavam fracionando as operações de venda como se fossem de pessoas físicas para brasileiros.

O comércio estabelecido agradece. E o consumidor consciente deveria fazer o mesmo.

Às vésperas do início da discussão sobre a reforma fiscal, com a esperada redução da carga dos impostos sobre o consumo e aumento proporcional sobre a renda e o patrimônio (no Brasil mais de 70% da carga tributária se assenta sobre o consumidor, ao contrário da OCDE), está na hora de o consumidor brasileiros perceber que ele é antes de tudo um contribuinte.

Quando faz uma compra sem nota fiscal (em camelôs ou no comércio regular), está estimulando a evasão fiscal ou a elisão de divisas (caso do contrabando). E a perda de receitas para o governo fazer ações sociais e tentar amenizar a desigualdade social do país, só contribui para agravar a concentração da renda.

O consumidor precisa cumprir seu papel. Quem ganha mais na cadeia da sonegação é o grande e médio comerciante (sem NF, os preços teriam de ter alto desconto, pelo menos 30%). E ainda os atravessadores, que bancam as grandes operações de subfaturamento nas importações e ou o contrabando (um contêiner declarado como trazendo guarda-chuvas e/ou óculos de baixo valor, mas que esconde em seu interior chips ou computadores de alto valor).