Copom: Selic balança mas não cai
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Já dizia o Barão de Itararé, o genial Aparício Torelli, editor do jornal satírico “A Manha”: “de onde não se espera nada, é que não vem nada mesmo”. Quem esperava que a íntegra da Ata do Comitê de Política Monetária do Banco Central sobre a 355ª reunião de 21 de junho, que manteve a Selic em 13,75%, trouxesse algum indício de quando a Selic poderia cair (se em 2 de agosto ou 20 de setembro), o que não apareceu no Comunicado pós reunião, se frustrou.
Após 23 tópicos, embora o tópico 19 assinale que uma corrente predominante admitiu condições para baixa dos juros em agosto, mas prevaleceu a corrente de que ainda não há condições para abrandar a dose cavalar do remédio do Copom. A próxima chance do Banco Central se redimir está na divulgação do Relatório Trimestral de Inflação, na 5ª feira, 29 de junho. Nos três RTI anteriores o BC errou muito suas previsões de inflação (que veio menor que o esperado, indicando que os juros poderiam ter sido menores).
Itaú já prevê queda em agosto
Como até a próxima reunião (1 e 2 de agosto), os dois nomes indicados para o Comitê – Gabriel Galípolo, ex-secretário executivo da Fazenda, para a diretoria de Política Monetária (acumulada desde março por Diogo Guillen, diretor de Política Econômica, que elabora o RTI de Inflação, e Ailton Santos, funcionário do banco para a diretoria de Fiscalização - já estarão presentes, após aprovação no Senado, espera-se aprofundamento da debate, com equilíbrio de posições.
O Departamento de Estudos Econômicos do Itaú, após interpretar a Ata, considerando que "apesar das ressalvas mais duras, considerando que a maioria prevalece e a mensagem explícita no referido parágrafo", mudou o cenário sobre a taxa Selic "para o restante do ano, de três cortes a partir de setembro (levando a taxa básica para 12,5% a.a. no final do ano), para quatro cortes, começando com uma redução de 0,25 p.p. em agosto, levando a Selic para 12,25% a.a. no final do ano – especificamente, dois cortes de 0,25 p.p. seguidos por duas reduções de 0,50 p.p.
Até aqui, na Ata, o Banco Central não reconhece que as quedas da inflação em 2022 e 2023 não decorreram da eficiência da política monetária e sim de intervenções dos governos. Paulo Guedes (Bolsonaro), há exatamente um ano, cortou impostos de forma temporária e eleitoreira (até 31.12.2022) dos combustíveis, energia elétrica e comunicações; Lula não só não repôs 100% da carga de impostos, como adotou uma nova política de preços na Petrobras (em lugar da famigerada PPI) que derrubou os preços da gasolina, diesel e GLP. Já a supersafra, plantada em 2022, colhe preços baixos na alimentação este ano.
O IBGE divulgou hoje o IPCA-15 de junho, com alta de 0,04%. Embora acima da mediana das expectativas do mercado (0,01%), e da queda de 0,07% esperava pela LCA Consultores, o índice que serve de prévia do IPCA cheio de junho, que será divulgado em 11 de julho, com expectativa de queda de 0,09% a 0,12%, vai consolidar a queda da inflação para patamares menores.
Copom é desmentido pela Focus
Como, aliás, indicou a Pesquisa Focus do Banco Central, colhida até a última 6ª feira, 23 de junho, e divulgada 2ª feira, 26: com base em projeções bem mais suaves (9,03% a 9,02%, contra 9,44% há um mês) para os preços administrados em 2023 (além de combustíveis e energia elétrica, o reajuste dos planos de saúde ficou abaixo de dois dígitos (9,63%), o mercado reduziu mais uma vez as projeções para 2023 (o IPCA caiu de 5,12% para 5,06% e baixou a 4,98% nas previsões dos últimos cinco dias úteis - já próximo ao teto de 4,75%). Já as apostas para 2024 desceram de 4,00% para 3,98% - 3,94% nos últimos cinco dias úteis), dentro do teto da meta de inflação, de 4,75%.
Nos 23 tópicos da ata, o Copom trata diretamente a inflação no item 10, quando fiz que a “dinâmica da desinflação segue caracterizada por um processo com dois estágios distintos. No primeiro estágio, já encerrado, a velocidade de desinflação foi maior, com maior efeito sobre preços administrados e efeito indireto nos preços livres através de menor inércia [uma confissão velada de que o Copom apostava em reajustes maiores de preços decorrentes da reoneração, além de dimensionar para menos a queda dos alimentos, que foi de 0,51% no IPCA-15 de junho].
Adiante diz que o 2º estágio (o atual) “a velocidade de desinflação é menor e os núcleos de inflação, que respondem mais à demanda agregada e à política de juros, se reduzem em menor velocidade, respondendo ao hiato do produto e às expectativas de inflação futura”. Para o Copom, o atual estágio “demanda serenidade e paciência na condução da política monetária para garantir a convergência da inflação para suas metas”. [Só que as metas já convergiram: para 2025 está em 3,80% (a meta é de 3,00+ 1,50% de tolerância) e a de 2026, que o Conselho Monetário Nacional definirá amanhã, sem a presença de Roberto Campos Neto, que participará da reunião do BIS, o Banco Central dos Bancos Centrais, está sendo estimada pelo mercado na Focus em 3,72%].
O que foi pior, metas ou juros?
O Banco Central e os agentes do mercado que compraram a versão do BC alegam que o ruído em torno na revisão das metas de inflação para 2024 em diante teriam causado “desancoragem de expectativas” e que a manutenção dos juros (preventivamente elevados devolveram as projeções a leitos racionais – parece a discussão do que veio antes, se o ovo ou a galinha. Creio que seria racional (e honesto) o Banco Central – independente desde fevereiro de 2021 - admitir que errou nas projeções de inflação pelas intervenções dos governos Bolsonaro e Lula e que as taxas de juros foram superdimensionadas.
É uma falácia o BC buscar méritos na queda da inflação em 2022 (do campo de dois dígitos para 5,79%) ou alegar que foi a firmeza da política monetária que derrubou a inflação este ano. Foi a queda dos alimentos, que ajudada pela reoneração de impostos abaixo do nível de junho de 2022, além do empurrão da nova política de preços da Petrobras, que pegou carona na baixa do dólar para baixar sucessivamente a gasolina, o diesel e o GLP, que, em conjunto, estão reduzindo lentamente os preços do segmento de serviços.
Por ser um mercado de competição fluida, os preços do diesel têm peso importante nos custos do frete para distribuir mercadorias e os preços da gasolina e do GLP têm alto impacto psicológico na formação dos “honorários” dos prestadores de serviços (marceneiros, pedreiros, pintores, eletricistas, técnicos de TI, cabelereiros, manicures etc.).
O reajuste a menor nos planos de saúde já se refletiu no IPCA-15. Até maio, o reajuste de 15,50% autorizado para os Planos de saúde a partir de maio de 2022 implicava uma diluição mensal de 1,20%; agora o impacto no IPCA-15 foi de 0,38%. No IPCA cheio de junho será na casa de 0,80%. São pequenas variações que mexem na formação de preços do segmento de serviços.
Manter os juros elevados, no entanto, asfixiou as finanças das famílias e dos pequenos e médios empresários. Sem falar no esgarçamento das finanças públicas, com o custo mais elevado da rolagem da dívida pública.
Arcabouço fiscal
No Item 14, o Comitê “discutiu também os impactos do cenário fiscal sobre a inflação e avalia que a apresentação e a tramitação do arcabouço fiscal reduziram substancialmente a incerteza em torno do risco fiscal”. Mas insiste na desconfiança sobre a eficácia do governo no “cumprimento das metas estipuladas para o resultado primário, ainda que, na discussão do Comitê, tenha se enfatizado o comprometimento e a apresentação de medidas para a consecução de tais resultados”. [Galípolo no Copom pode reforçar a linha].
Mas o “Copom novamente enfatizou que não há relação mecânica entre a convergência de inflação e a aprovação do arcabouço fiscal, uma vez que a trajetória de inflação segue condicional à reação das expectativas de inflação e das condições financeiras”.
No Item 17, o Comitê avalia que a conjuntura, marcada por expectativas desancoradas para prazos mais longos e caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento, requer parcimônia e cautela na condução da política monetária. [a Focus mostrou o contrário].
No Item 18, o “Comitê unanimemente avalia que flexibilizações do grau de aperto monetário exigem confiança na trajetória do processo de desinflação, uma vez que flexibilizações prematuras podem ensejar reacelerações do processo inflacionário e, consequentemente, levar a uma reversão do próprio processo de relaxamento monetário. A materialização desse tipo de cenário pode impactar negativamente não só a credibilidade da política monetária, mas também as condições financeiras”. [Uma defesa que ainda não convenceu].
Divergência nos próximos passos
O item diz que o debate mostrou divergência no Comitê em torno do grau de sinalização em relação aos próximos passos. A avaliação predominante foi de que a continuação do processo desinflacionário em curso, com consequente impacto sobre as expectativas, pode permitir acumular a confiança necessária para iniciar um processo parcimonioso de inflexão na próxima reunião (agosto).
Outro grupo mostrou-se mais cauteloso, enfatizando que a dinâmica desinflacionária ainda reflete o recuo de componentes mais voláteis e que a incerteza sobre o hiato do produto gera dúvida sobre o impacto do aperto monetário até então implementado. Para esse grupo, é necessário observar maior reancoragem das expectativas longas e acumular mais evidências de desinflação nos componentes mais sensíveis ao ciclo.
Mas, os membros do Comitê foram unânimes em concordar que os passos futuros da política monetária dependerão da evolução da dinâmica inflacionária, em especial dos componentes mais sensíveis à política monetária e à atividade econômica, das expectativas de inflação, em particular as de maior prazo, de suas projeções de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos. [Mais acacianoa, impossível].
Para empresários, preços caem pelo 3º mês
Enquanto o Banco Central mostra extrema cautela em relação ao andamento da inflação, os empresários do Rio de Janeiro ouvidos em pesquisa da Fecomércio-TJ, têm a nítida percepção de que os preços seguem caindo pelo 3º mês seguido, sendo motivo para baixar os juros, que com a Selic estacionada em 13,75% ao ano, não param de aumentar em termos reais.
O índice de percepção de preços dos empresários acumula três meses de queda. Segundo a pesquisa, 73,8% dos entrevistados em pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisas e Análises (IFec RJ), sinalizaram aumento de preços abaixo do mês de maio (74,9%). A Sondagem foi realizada com 294 empresários do comércio de bens, serviços e turismo do estado, entre os dias 2 e 12 de junho.
Apesar das ressalvas mais duras, considerando que a maioria prevalece e a mensagem explícita no referido parágrafo, mudamos nosso cenário para o restante do ano, de três cortes a partir de setembro (levando a taxa básica para 12,5% a.a. no final do ano), para quatro cortes, começando com uma redução de 0,25 p.p. em agosto, levando a
Selic para 12,25% a.a. no final do ano – especificamente, dois cortes de 0,25 p.p. seguidos por duas reduções de 0,50 p.p. Saberemos mais acerca das perspectivas de curto e médio prazo para a política monetária brasileira.