O OUTRO LADO DA MOEDA
Conflito de interesses no noticiário econômico
Publicado em 06/09/2024 às 16:00
Alterado em 06/09/2024 às 16:18
Em meus 52 anos de cobertura no mercado financeiro – junto com George Vidor, em O "Globo" - fui, no velho "JORNAL DO BRASIL", dos precursores no acompanhamento diário do “open market”. Com todas as suas implicações de influência na formação de preços e expectativas da economia, sempre evitei dar um lado da visão do mercado sobre tendência de juros e expectativa da inflação. Ao tentar ouvir dois lados da moeda, a conclusão tinha de ser do leitor.
Nem Vidor, nem eu, cobrimos regularmente o mercado de ações. O que nos dava mais credibilidade nas nossas matérias nos jornais. Infelizmente, em 52 anos de carreira, percebi, já no início, que havia colegas de ofício misturando nas matérias de coberturas do mercado de capitais suas posições próprias nesta ou naquela ação.
Tive algumas ações na minha vida. As primeiras, da Acesita, foram presente de meu tio e padrinho. Depois, aconselhado por meu ex-colega e amigo, desde o Colégio André Maurois, Álvaro Bandeira, comprei ações das Lojas Americanas, da Citropectina (acho que nem existe mais) e uma terceira da qual não lembro. Me desfiz da pequena carteira quando comprei o meu sítio (em fins de 1978) e precisei de capital para quitar a dívida, em agosto de 1979.
Assim, pude acompanhar, com isenção, o Caso Vale, que deu ao JB o Prêmio Esso de Economia de 1980-81 (já não tenho certeza se o prêmio foi no mesmo ano, 1980, do escândalo da venda de ações da Vale pelo Tesouro Nacional; para tirar a corretora do presidente da BVRJ de um “corner” – fizera venda a descoberto no mercado futuro e os preços subiam puxados pelos comprados).
CVM devia ver o conflito de interesses
Em tempos de internet e bombardeiro de notícias especulativas, a Comissão de Valores Mobiliários, “xerife” do mercado de capitais - criada em fins de 1976, juntamente com a nova Lei das Sociedades Anônimas, que reduziu bastante o nível mínimo para controle de uma S.A. (facilitando a pulverização das ações no mercado de capitais) - tem procurado “ensinar” ao grande público sobre a necessidade de transparência no mercado de capitais e o reconhecimento de instituições financeiras e agentes autônomos devidamente credenciados pela CVM ou pela Anbima (resultado da fusão de Andima e Anbid).
Ainda assim, investidores se deixam levar por “influencers” e falsos operadores de ações ou bitcoins, ativos financeiros que não estão sob controle de qualquer autoridade monetária ou registro escritural. Pode ser semelhante ao plano da casa própria no céu que o pastor Silas Malafaia andou vendendo no começo deste 3º milênio. E o séquito de seguidores nem por isso deixou de crescer.
Por isso, fico muito contrariado quando vejo sites de jornais regulares e com credibilidade colocando no ar matérias sobre apostas em altas de juros sem nenhum técnico do mercado falando o contrário, com uma visão mais moderada. Na cobertura de economia, tenho visto prevalecer a visão dos “traders”, dos negociadores do mercado que sempre vão puxar brasa para ativar e acelerar as cotações de suas próprias posições.
Há uma cobertura da “cultura do Copom” – com a análise das expectativas se sobrepondo aos fatos – que encaminha uma visão distorcida da economia, mais para os rentistas e a visão do mercado financeiro e menos para o setor real da economia. Essa é uma questão filosófica que explica os sucessivos erros de avaliação do Banco Central e do Copom em relação ao PIB e IPCA, o que leva a distorções na fixação da Taxa Selic.
A situação mais grave é o fato de que, à parte sites sérios e com credibilidade, como o Bloomberg, Reuters e o Broadcast, há uma série de sites que estão sob controle de instituições financeiras, como o InfoMoney (controlada pela XP) e ou o da Exame, sob controle do BTG-Pactual. Há alguns anos a CVM multou o pessoal da Empiricus por dar dicas sem serem analistas credenciados. Há sites da Rico e da Money Times que valorizam as posições altistas.
O caso dos juros (EUA e Brasil)
No atual caso da tendência dos juros – que devem ser reduzidos nos Estados Unidos pelo Fed em sua reunião de 18 de setembro –, com os últimos dados mais fracos do mercado de trabalho, cresceram as apostas de que o corte dos juros vai subir de 0,25% para 0,50% - ainda há valorização das visões domésticas que sugerem alta nos juros também por aqui.
O InfoMoney de hoje dá como manchete (antes de divulgar os dados do “payrool”) que o Bradesco BBI (o banco de investimento do Bradesco) vê dilema entre o mercado e o Copom na reunião do dia 18). Acontece que quem fala pelo Bradesco é o site do banco, cujo diretor de pesquisas é Fernando Honorato Barbosa. Vice-presidente do comitê macroeconômico da Anbima, Honorato está cotado para suceder a Gabriel Galípolo na diretoria de Política Monetária do Banco Central, quando Galípolo for aprovado como presidente pelo Senado, em outubro. E o Bradesco segue mantendo a Selic em 10,50%.
Os dados do dólar mostram recuperação do dólar frente ao Euro e a libra esterlina (espera-se que o Banco Central Europeu baixe os juros na semana que vem, diante do desaquecimento das economias da Alemanha e França. O iene reage forte ante o dólar que caía 0,66%. O dólar subia 0,62% ante o peso mexicano e apresentava valorização de 0,35%, cotado a R$ 5,5940.
Goldman Sachs vê mais oferta de óleo
No dia em que o Citi, previu que as cotações do barril de petróleo do tipo Brent vão cair para a faixa de US$ 60 no ano que vem, contrariando a visão da Julius Baer, de tendência de oscilação para US$ 70 –, a cotação do contrato para entrega futura em novembro caiu 2,5% para US$ 70,79.
Um dos fatores para a baixa foi apontado pela Goldman Sachs Research: este ano, o fornecimento de combustíveis fósseis líquidos — como líquidos de gás natural e petróleo bruto — fora da Rússia e das nações da OPEP deve crescer em 1,3 milhão de barris por dia, em comparação com uma previsão anterior de 1,1 milhão de barris por dia. Esse crescimento provavelmente virá de três países nas Américas. São os EUA, o Canadá e a Guiana.
Espera-se que a Guiana forneça um crescimento de produção de 220.000 barris por dia, somando-se aos 770.000 dos EUA e aos 220.000 do Canadá. A Goldman Sachs Research espera que o fornecimento de líquidos não-OPEP ex Rússia reacelere para 1,5 milhão de barris por dia em 2025.