O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

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O OUTRO LADO DA MOEDA

BCs e a dependência dos dados

Publicado em 20/09/2024 às 13:07

Depois da decisão mais agressiva do Federal Reserve Bank, de reduzir, dia 18, em 0,50% a taxa de juros nos Estados Unidos, que caiu para a faixa de 4,75%-5,00%, ao contrário do Comitê de Política Monetária (Copom) que elevou a Selic em 0,25% para 10,75%, tanto o Banco da Inglaterra, quando o Banco do Povo (China) e o Banco do Japão, preferiram ser cautelosos. Todos pediram “mesa”, mantendo as taxas de juros inalteradas, para esperar os efeitos da mudança do Fed nas moedas e nos mercados de ativos financeiros.

Ao analisar o corte mais agressivo do Fed, o banco Goldman Sachs, que apostava em corte de 0,25%, justifica a decisão pela mudança de foco do Fed, dos riscos de inflação para os riscos de emprego face o recente enfraquecimento dos dados do mercado de trabalho. Na visão do GS “a maior urgência sugerida pelo corte de 50 pontos base e a aceleração no ritmo de cortes que a maioria dos participantes projetou para 2025 torna uma série mais longa de cortes consecutivos o caminho mais provável”. O banco revisou sua previsão do Fed para acelerar o ritmo de cortes em 2025 e espera uma sequência mais longa de cortes consecutivos de 25 pontos base de novembro de 2024 a junho de 2025, quando a taxa dos “fed funds” atingiria 3,25-3,5%. Isso significa uma redução de 200 pontos-base ante o nível de 18 de setembro.

Divisão no FOMC

O órgão de decisão da política monetária dos Estados Unidos é o Federal Open Market Committee – FOMC. Formado por 19 membros da junta da Reserve Federal, o conjunto dos bancos centrais regionais dos EUA, dos quais 12 têm assento e voto (em sistema de rodízio de mandato). Diante da última decisão de quarta-feira, o GS prevê uma decisão acirrada para a escolha entre um corte de 0,25% ou novo corte de 0,50% na reunião de 6 de novembro.

Para o Goldman Sachs “o fator decisivo provavelmente serão os próximos dois relatórios de emprego, o segundo dos quais virá durante o período de blecaute, e em particular o caminho da taxa de desemprego, onde 12 dos 19 participantes disseram que veem os riscos até mesmo para suas novas previsões mais altas como inclinados para cima”.

Cautela nos BCs

Por isso mesmo, os bancos centrais mais poderosos do mundo (o Banco Central Europeu já tinha dado uma parada no início do mês) trataram de adotar uma postura cautelosa para avaliar os impactos na economia global até a próxima reunião. Em princípio, as expectativas no Brasil estão oscilando entre uma alta da Selic até 11,25% em dezembro (posição do Bradesco) e 11,75% (posição do Itaú e da mediana do mercado, que vê o fim do ciclo em 12%, em 29 de janeiro. Mas há vozes no mercado – de gestores de fundos de renda fixa, prevendo 13% (Opportunity) e até do ex-diretor de Política Monetária do BC (Bruno Serra Fernandes, substituído por Gabriel Galípolo, já indicado para suceder a Roberto Campos Neto na presidência em 2025) está prevendo alta de “2,0% a 2,50%” na Selic, que poderia ir a 13% (há até apostas maiores).

Trata-se de um aumento de 4% a 4,50% no diferencial entre os juros nos Estados Unidos e no Brasil. Se a escalada não resultar na desvalorização do dólar ante o real o ganho seria extraordinário, pois o diferencial, que estava em 5,00% em 18 de setembro (10,50%-5,50%), alargaria, como uma boca de jacaré, para 13,00%-3,50%, ou seja, quase dobraria para 9,50%. Um absurdo!

Sucessão no BC e passos do Fed

Por isso chega a ser até engraçada a “pompa” do comunicado do Copom de que irá “aguardar dados a dados” da economia doméstica (e internacional) “para decidir os próximos passos da sua estratégia de política monetária”. Sempre foi assim. Mais do que a inflação presente e suas projeções futuras, os dados do mercado de trabalho e as oscilações da taxa de câmbio, o que vai guiar os passos do Copom serão as próximas decisões do FOMC.

Se vier nova redução de 0,50% nos EUA, em 6 de novembro, e o dólar já tiver cedido, por enxurrada de ingressos de capitais especulativos no Brasil, não faz sentido o Copom elevar para 0,50% a alta da Selic como defendem alguns (o Bradesco sugere movimentos de 0,25%).

Particularmente, vejo uma situação pouco abordada até aqui, que levou a um comportamento unânime do Comitê de Política Monetária ecoando a alta que pedia o mercado: é a votação da indicação de Gabriel Galípolo para a vaga de Roberto Campos Neto, cujo mandato expira em 31 de dezembro. Em princípio a votação da indicação na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado e, depois, no Plenário (81 senadores) estaria marcada até 6 de novembro, data da próxima decisão do Copom.

Nesta reunião, a aprovação de Galípolo confirmaria a mudança na correlação de forças do Copom para 2025, pois, além dos dois diretores, cujos mandatos expiram em 31 de dezembro (Carolina Assis, de Cidadania, e Octávio Damaso, de Regulação), haverá necessidade de um substituto para a diretoria de Política Monetária. O que pode motivar uma dança de cadeiras na Diretoria. Os problemas previstos para o câmbio nos próximos dois anos pedem a indicação de um especialista para a área Internacional (hoje ocupada por Paulo Pichetti, economista mais talhado para a diretoria de Política Econômica, ocupada por Diogo Guillen). Campos Neto já trocou postos antes na diretoria do BC.

Dólar interrompe queda

Depois de sete pregões seguidos de queda, o pedido de “mesa” de grandes bancos centrais alterou o comportamento dos mercados de câmbio. O dólar subia depois de meio-dia (horário de Brasília) 1,00% frente ao iene e 0,31% frente ao franco suíço. Em relação ao real, que fechou ontem a R$ 5,4263, com baixa de 0,64%, a moeda americana sobe nesta sexta-feira mais de 1%, cotada a R$ 5,4856, depois de ter aberto a manhã a R$ 5,4271.

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